quarta-feira, 21 de setembro de 2016
O que parecia ficção científica se tornou realidade. O projeto de
Cooperação Internacional para a Pesquisa Animal Utilizando o Espaço
(Icarus), cuja fase de testes começará em 2017, desenvolve sensores
alimentados por energia solar, pesando entre um e cinco gramas, que são
acoplados a pássaros cantores, libélulas e escaravelhos.
Nova Délhi, Índia, 20/9/2016 – Todos os anos, em novembro, a praia
indiana de Gahirmatha, no Oceano Índico, se tinge de uma cor
café-acinzentado durante 60 a 80 dias, porque cerca de meio milhão de
tartarugas verdes chegam para desovar e deixam aproximadamente cem ovos
cada uma. Porém, pouco se sabe da rota migratória dessa espécie em
perigo. O desconhecimento dificulta a possibilidade de tomar medidas
para proteger a minguante população da destruição de seu habitat, do
aquecimento global e da pesca de arrasto.
A crescente pressão exercida pela mudança climática, pela perda de
ecossistemas e pelos crimes contra a fauna e a flora silvestres, que
colocam em risco a biodiversidade em todo o mundo, levou numerosos
cientistas a recorrerem à tecnologia espacial para tentar remediar a
situação.
As libélulas, os escaravelhos e os pássaros cantores migratórios logo
poderão estar conectados a satélites espaciais e ajudar a prever
desastres naturais e a propagação de zoonoses, doenças que os animais
passam aos seres humanos, como as gripes suína e aviária. Os radares
ajudarão a localizar os caçadores ilegais mediante sensores
infravermelhos, que detectarão os movimentos agitados dos elefantes, por
exemplo. As câmeras que orbitam no espaço podem detectar inclusive
enfermidades dos cultivos e espécies invasoras em locais de difícil
acesso.
O que parecia ficção científica se tornou realidade. O projeto de
Cooperação Internacional para a Pesquisa Animal Utilizando o Espaço
(Icarus), cuja fase de testes começará em 2017, desenvolve sensores
alimentados por energia solar, pesando entre um e cinco gramas, que são
acoplados a pássaros cantores, libélulas e escaravelhos. Os dados
transmitidos não informarão apenas sobre seus movimentos e sua posição
geográfica, mas darão pistas importantes sobre as funções corporais ou
sobre os sentidos do animal, além de indicadores significativos a
respeito de desastres naturais iminentes.
Até 2020, os sensores do Icarus poderão ser suficientemente pequenos
para serem acoplados a um gafanhoto, e talvez seja possível utilizar
microssensores para controlar o voo do inseto e desviar um enxame de
cultivos valiosos, explicaram pesquisadores do Instituto de Ornitologia
Max Planck, da Alemanha. Os especialistas do Icarus afirmaram que a vida
das baterias é um grande limitador para rastrear animais pequenos,
porque as miniaturas que podem carregar não duram muito.
No entanto, a estação internacional da agência espacial russa Roscosmos,
onde será instalado o equipamento do Icarus, está mais perto da terra
do que os satélites, o que permitirá diminuir a energia necessária para
carregar os dados. E, para economizar mais bateria, somente quando
houver contato visual com a ave em voo é quea estação ativará o
minitransmissor do pássaro, que estará no modo economia de energia, e
demorará poucos segundos para transmitir os dados à estação.
A urgência de recorrer a outros métodos de patrulhamento para controlar a
caça ilegal e o comércio ilegal de fauna e flora silvestres, se
depreende do Informe Mundial de Crimes Contra a Vida Silvestre deste
ano. O documento foi elaborado a partir da plataforma World Wise (World
Wildlife Seizures, ou apreensões de fauna silvestre do mundo), que
contém dados de mais de 164 mil apreensões relacionadas com o crime
contra cerca de sete mil espécies em 120 países, entre 2004 e 2015.
O tráfico de fauna e flora silvestres agora é reconhecido como uma área
especializada dentro do crime organizado, além de ser uma grande ameaça
contra espécies vegetais e animais. O comércio ilegal será o eixo da 17ª
Conferência das Partes da Convenção sobre Comércio Internacional de
Espécies Ameaçadas de Fauna e Flora Silvestres (Cites), que acontecerá
entre os dias 24 deste mês e 5 de outubro, em Johannesburgo, na África
do Sul.
Segundo o informe do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(Pnuma) de 2016, estima-se que essa atividade movimente entre US$ 7
bilhões e US$ 23 bilhões por ano. Como os caçadores ilegais utilizam
tecnologia cada vez mais sofisticada, os guardas florestais devem estar à
altura e se equipar. Quando avançam para matar, os elefantes e os
rinocerontes costumam se comportar de forma incomum. Os sensores nos
animais ajudam a detectar esse comportamento e enviam alertas aos
responsáveis pela segurança, dando a eles tempo para reagir.
Outras constelações (dez ou mais) de alta resolução de satélites-radar,
ao contrário dos satélites óticos para observar a Terra, são
suficientemente poderosas para penetrar na densa cobertura florestal,
nas nuvens e na escuridão da noite, que ajudam a camuflar os caçadores
ilegais, afirmam os especialistas. E os sensores infravermelhos
instalados nos drones, controlados pelo sistema de posicionamento global
(GPS), também ajudam a detectar fogueiras ou corpos quentes escondidos
na selva africana, acrescentam.
Já há satélites avançados controlando o desmatamento ilegal, o avanço do
desmatamento e até a umidade do solo. O lançamento de imagens via
satélite hiperespectrais, isto é, imagens detalhadas em centenas de
longitudes de ondas eletromagnéticas, permitem avaliar a dimensão do
desastre, o crescimento de cultivos e das enfermidades, a
disponibilidade de água em áreas de difícil acesso e o derretimento de
geleiras, além da biodiversidade em geral.
Especialistas em desenvolvimento concordam que as ferramentas espaciais
podem ter um papel importante e diverso no cumprimento dos 17 Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável (ODS), especialmente o de número 15,
sobre “promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, lutar
contra a desertificação, deter e inverter a degradação das terras e
frear a perda da diversidade biológica”.
Os países em desenvolvimento, com grande diversidade biológica, requerem
forjar associações e contar com assistência técnica gratuita, além de
transferência de conhecimentos, recursos adequados e construção de
capacidades em tecnologias vinculadas ao espaço, para poderem cumprir a
Agenda de Desenvolvimento para 2030. Mas o alto custo das soluções
tecnológicas e o acesso aos últimos conhecimentos e avanços científicos
são um grande obstáculo para o Sul Global.
“A comunidade internacional deve criar dispositivos espaciais de baixo
custo para compartilhar com os países em desenvolvimento, como o
transmissor solar (Icarus) que a Alemanha desenvolve”, afirmou Saroj
Koirala, especialista em tecnologia geoespacial do Fundo Mundial para a
Natureza (WWF) do Nepal. “Seria muito valioso podermos dispor deles por
US$ 50 ou US$ 100”, ressaltou à IPS.
O coordenador das análises espaciais do WWF Índia, Shashank Srinivasan,
enfatizou à IPS que a não ser pelo wildlabs.net, que permite
compartilhar tecnologia relevante para a conservação, não conhece outro
tipo de iniciativa que permita fazer o mesmo em escala nacional, nem
regional ou internacional, nem fundos que o facilitem.
Os especialistas destacam a necessidade de conscientização entre
dirigentes políticos e autoridades sobre a importância das tecnologias
espaciais para gerar políticas e destinar fundos ao setor. Como a
conservação da natureza está muito ligada aos modos de subsistência, as
pessoas devem pressionar seus governos para que destinem recursos às
tecnologias avançadas, destacouKoirala.
Fonte: Envolverde
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