sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Governo reduz Jamanxim em 43% para resolver caos fundiário

Por Daniele Bragança
Gados dentro da Flona de Jamanxim, em setembro de 2009. Foto: Nelson Feitosa/Ascom Ibama.
Gados dentro da Flona de Jamanxim, em setembro de 2009. 

Foto: Nelson Feitosa/Ascom Ibama.



O governo escolheu reduzir o tamanho da Floresta Nacional do Jamanxim (Flona), localizada em Novo Progresso, no Pará, para resolver o caos fundiário da região. Criada em 2006 dentro de um pacote para conter o desmatamento ao longo da BR-163, que estava sendo asfaltada, a unidade é uma criança de 10 anos com problemas de 500: convive com ilegalidades que vão de grilagem de terra à garimpo ilegal.


O ICMBio discute internamente há anos como resolver o impasse em torno da floresta nacional mais desmatada do país. Desde agosto, o Ministério Público Federal lançou alertas contra a redução da Flona, que agora se confirma. Ontem, o presidente Michel Temer publicou a medida provisória 756, diminuindo em 743.540 mil hectares a área protegida. Antes, a floresta ocupava 1.301.120 mil hectares. Era a maior do país sob o domínio do Instituto Chico Mendes. A redução da área foi de 43%.



Em parte do local reduzido foi criado uma Área de Proteção Ambiental, a de Jamanxim, categoria menos restritiva dentro do Sistema Nacional de Unidades de Conservação que permitirá que os posseiros continuem no local. Mas isso não significa que o passivo fundiário tenha sido resolvido: cerca de 20% dos ocupantes ainda estão dentro dos novos limites da Floresta.


O perfil fundiário da região é dominado por posseiros e grileiros sem títulos de posse, alguns com extensas fazendas de gado. A grande dificuldade das autoridades ambientais era separar o proprietário legítimo, que já estava lá antes da Unidade ser criada, do grileiro de terras públicas. Não havia a possibilidade de regularizar a situação dos posseiros, mesmo aqueles que já ocupavam a terra antes de 2006, porque a área havia virado Floresta Nacional. Segundo estimativas do próprio ICMBio, existiam mais de 250 propriedades rurais dentro de Jamanxim e 110 mil cabeças de gado. Uma floresta que virou (várias) fazendas.
Gado apreendido durante Operação Boi Pirata II dentro da Flona de Jamanxim, em janeiro de 2010. Foto: Ascom Ibama.
Gado apreendido durante Operação Boi Pirata II dentro da Flona de Jamanxim, em janeiro de 2010. Foto: Ascom Ibama.


“Se tem esse número enorme de gado lá dentro, eles estão conseguindo comercializar e se a moratória tivesse tido o mesmo efeito eficaz que em outras regiões, por exemplo, na Terra do Meio, que não conseguiram comercializar, não teríamos gado nessa unidade.


As medidas que deram certo em outros lugares, tipo a restrição de crédito agrícola, tem um efeito pequeno porque o financiamento não é um financiamento oficial, ele é financiado pelo garimpo. A mesma história acontece com a madeira e outras questões que movimentam ali a ocupação da área. Alguns anos a gente desbaratou uma grande quadrilha de grilagem, esperávamos que o movimento diminuísse, mas a gente continua sob pressão de grilagem de terra lá dentro”, explicou Paulo Henrique Carneiro, diretor de Criação e Manejo de Unidades de Conservação do ICMBio, numa entrevista sobre a redução de Jamanxim feita em outubro, mas ainda não publicada.


Na ocasião, ((o))eco queria entender em que patamar estava a discussão sobre a redução da Flona e como a cadeia ilegal de gado afetava a Unidade.


Pressões para a redução
Pressões externas pedem a redução da Floresta para regularizar as áreas produtivas que estão dentro da unidade desde que a mesma foi criada. De 2009, foi realizado o primeiro estudo técnico do ICMBio para rever os limites da unidade e, até agora, foram pelo menos 8 pedidos de revisão dos limites de Jamanxim.


No Senado, tramita atualmente um Projeto de Lei que anula a criação da Floresta Nacional do Jamanxim. Na Câmara, pelo menos duas propostas de decreto legislativo foram apresentados para sustar a unidade. As duas foram arquivadas.


Em agosto, o Ministério Público Federal (MPF) enviou uma recomendação ao órgão pedindo pela manutenção dos limites de Jamanxim. Os procuradores argumentavam que a redução promoverá ainda mais o avanço do desmatamento na região e não resolverá o problema de cunho fundiário, a chaga que mantém a violência na região.


“(...) 51% do desmatamento total identificado [na Amazônia] ocorreu em áreas privadas ou sob diversos estágios de posse, revelando que a ausência de proteção ambiental pelo Estado em áreas especialmente protegidas favorece às práticas de desmatamento”, afirma, no documento enviado ao órgão ambiental, a procuradora Janaina Andrade de Sousa. A recomendação do MPF lista 27 motivos para não reduzir a unidade.


Após resistir por 10 anos e tentar todo tipo de medida de comando e controle, o ICMBio preferiu ficar com uma área menor, porém administrável. A violência na região chegou ao auge com o assassinato do policial João Luiz de Maria Pereira, morto durante operação do Ibama de combate ao desmatamento e garimpo na Floresta Nacional do Jamanxim (PA), no dia 17 de junho.



Recompensas
A maior parte do território reduzido de Jamanxim (438 mil ha), foi incorporada ao Parque Nacional do Rio Novo (acima). Foto: ICMBio.
A maior parte do território reduzido de Jamanxim (438 mil ha), foi incorporada ao Parque Nacional do Rio Novo (acima). Foto: ICMBio.


Além da alteração de Jamanxim, o Governo Temer modificou os limites de mais três unidades de conservação (UCs) na Amazônia: o Parque Nacional do Rio Novo, que passou de 537.757 hectares (ha) para 976.525 ha; o Parque Nacional do Jamanxim, de 859.700 ha para 909.970 ha; e a Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós, que foi reduzida de 2.039.580 ha para 1.988.445 ha. Todas essas unidades são vizinhas de Jamanxim e estão localizadas na região da BR 163.

O acréscimo foi de mais 500 mil ha em áreas de proteção integral.

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