quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Segunda corrida espacial quer conquistar a Lua

Segunda corrida espacial quer conquistar a Lua
Hoje a Rússia é líder na exploração espacial, mas a China está acelerando rápido. [Imagem: Roscomos]
Exploração Espacial
Há décadas existe a promessa de uma base na Lua. Colocamos um pé lá, e parou por aí - nossa presença no satélite natural da Terra se resume a pegadas.

No entanto, estão surgindo cada vez mais iniciativas públicas e privadas que não só anunciam um retorno à Lua, mas planos ambiciosos de colonização lunar.

A China já revelou que pretende pousar no lado oculto da Lua (que não pode ser visto da Terra) em 2018, enquanto a Rússia prepara o pouso de sua primeira nave tripulada para 2031.

Os Estados Unidos não se manifestaram como governo, mas em julho deste ano deram permissão para a empresa privada Moon Express ir à Lua. E a NASA convocou recentemente companhias do setor privado a enviarem sugestões de experimentos que possam ser feitos por lá.

A que se deve tanto interesse na Lua?

Segunda corrida espacial
Para Leon Vanstone, da Universidade do Texas, o principal motivo é o mesmo da Guerra Fria: poder. "Devemos lembrar que foram os russos (então União Soviética) os primeiros a enviar um homem ao espaço - eles queriam militarizar o espaço - e os Estados Unidos se apressaram então em colocar um homem na Lua", disse ele.

Essa demonstração de poder custou bilhões de dólares e, segundo Vanstone, as potências perceberam que o melhor para todos era realizar iniciativas conjuntas em que os gastos e responsabilidades são compartilhados.

Mas o tabuleiro do xadrez geopolítico mudou.

A China está crescendo como uma potência espacial, e os Estados Unidos já não têm o mesmo status, dependendo dos russos até mesmo para mandar astronautas para a Estação Espacial Internacional. E, conforme lembra a especialista em Direito Espacial Jill Stuart, da Escola de Economia de Londres, "há muita tensão entre os Estados Unidos e a Rússia. Então, há sempre uma política complicada por trás."

Além disso, diferentemente da maioria das agências espaciais do mundo - como a NASA (EUA), ESA (Europa) ou Roscosmos (Rússia) -, o programa espacial chinês é dirigido por militares. "Os Estados Unidos não querem dizer que o seu programa é estatal. Na sua política capitalista, preferem dizer 'vamos deixar nossas empresas privadas à frente do programa espacial'," afirma Stuart. Ocorre que essas empresas não são de todo privadas, uma vez que são financiadas com dinheiro do estado e devem operar sob a tutela da NASA.

Segunda corrida espacial quer conquistar a Lua
Depois de meio século longe da Lua, agora há pelo menos seis projetos que prometem animar a exploração espacial. [Imagem: NASA]
Mineração espacial
Para Naveen Jain, um dos fundadores da Moon Express, as possibilidades de negócios na Lua são ilimitadas. Uma licença de uso e exploração permitiria a ele dar início a atividades de mineração, oferecer pacotes turísticos ou vender pedaços de rochas lunares como pedras preciosas.

"Parafraseando JFK (ex-presidente norte-americano John Fitzgerald Kennedy) 'escolhemos ir à Lua não porque era fácil, mas porque era um bom negócio', e é disso que se trata, de fazer um bom negócio", disse o fundador da Moon Express, que vê a comercialização da Lua como um negócio "grandiosamente genial".

E a tecnologia agora barateou em relação à corrida espacial dos anos 1960. "A primeira vez que o homem foi à Lua precisou de foguetes gigantes que custaram centenas de milhões de dólares," disse Jain. "Estamos usando um foguete menor, impresso em 3D, que custa menos de US$ 5 milhões."
E a sonda não-tripulada que ele planeja enviar à Lua no ano que vem custará outros meros US$ 5 milhões, algo que a NASA costuma gastar apenas nos estudos iniciais - sempre pagos a empresas privadas.

"A Lua é extremamente rica em recursos. Tudo pelo que brigamos na Terra está em abundância no espaço", afirma o empresário. "Cada vez mais pessoas estão interessadas em metais raros, e esse é o interesse de fazer a mineração na Lua."

A questão é que seria muito mais caro trazer esses minerais para a Terra do que continuar a explorar o que temos aqui, ou mesmo encontrar novas minas. Assim, parece haver outros elementos na equação do negócio que não estão totalmente claros.
Segunda corrida espacial quer conquistar a Lua
Minerais extraídos na Lua ficariam muito mais caros do que os explorados na Terra. [Imagem: BBC/Divulgação]
Bases lunares
Com o avanço da tecnologia e com a capacidade de chegar cada vez mais longe, a Lua se torna apenas um pequeno passo para a exploração do espaço.

Assim que a meta não for mais o nosso satélite, será Marte. E, se um dia chegarmos lá, então o desafio vai além.

Mas, para que isso aconteça, é preciso resolver um problema antes: combustível para viajar. Afinal, a maior parte do peso das naves lançadas ao espaço é de combustível.

Por isso, a Lua poderia ser uma parada estratégica para abastecimento. E não apenas os Estados Unidos acreditam nisso. A China também está de olho em Marte e anunciou recentemente que, em 2020, pretende visitar o Planeta Vermelho.


Direito espacial
Segundo o tratado sobre a exploração e utilização do espaço, assinado por 103 países em 1967, "o espaço, incluindo a Lua e outros corpos celestes, não deve ser objeto de apropriação nacional por reivindicação de soberania, uso, ocupação ou de qualquer outra forma".


Como os governos poderiam então planejar operações na Lua e conceder concessões a empresas privadas se, a princípio, ninguém tem o poder de fazê-lo?


Embora o acordo internacional afirme que o espaço é um território neutro e ninguém pode se apropriar dos corpos celestes, há diversas interpretações, e as empresas estão de olho em brechas na legislação de quase 50 anos para abocanhar uma fatia do negócio no espaço: "Primeiramente, o tratado especifica que nenhuma nação deve se apropriar de qualquer corpo celeste," diz a especialista Jill Stuart. "Mas há dúvidas se as entidades não-estatais poderiam fazer essas reivindicações."


Em segundo lugar, o fato de que você não pode reclamar a propriedade, não significa que não possa ocupar o espaço. "É como a Antártida", diz a especialista. "Você pode ter uma base lá, contanto que diga que o que está sob seus pés não é seu."
Segunda corrida espacial quer conquistar a Lua
As bases na Lua são um sonho antigo. Mas a pergunta que permanece é: Para quê? [Imagem: BBC]
Privatização do espaço
Mas os Estados Unidos parecem estar indo além, a começar pela autorização dada à Moon Express, um direito que o país não teria e, portanto, não poderia conceder. E, em novembro de 2015, aquele país aprovou uma lei que permite aos cidadãos norte-americanos explorar comercialmente e reivindicar a posse de recursos obtidos no espaço.


"Isso me perturba um pouco", admite Stuart. "Essa lei tem o potencial de minar o acordo internacional que já está em vigor para o espaço."


Said Mosteshar, do Instituto de Direito e Política Espacial de Londres, concorda que essa lei norte-americana atropela os tratados internacionais. "Parece que os Estados Unidos estão concedendo a seus cidadãos um direito que o próprio país não tem. Você não pode dar um direito nacional que não pode exercer".


Em 1979, antecipando uma futura exploração lunar, a ONU redigiu o Tratado da Lua, estipulando as condições para essa atividade. A questão é que apenas 13 países assinaram o acordo - e nenhum deles tem recursos para participar de uma corrida espacial.


Talvez a exploração da Lua seja inevitável. E a possibilidade de haver bases de diferentes países, como ocorre na Antártida, não está tão distante de acontecer. Mas, para Jill Stuart, a pergunta que devemos fazer é: quem nós queremos que nos represente no espaço?



"Em breve teremos diferentes entidades pousando em corpos celestes, e acho que devemos nos perguntar quem a gente quer que vá para o espaço e nos represente. Eu não quero acordar daqui a 100 anos e descobrir que a Lua é da Coca-Cola," finalizou.

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