Diversidade de árvores favorece restauração de florestas
Jornal da USPA conservação e restauração de florestas é favorecida quando há uma diversidade de espécies arbóreas cerca de quatro vezes maior que a habitualmente utilizada em trabalhos de BEF (Biodiversidade e Funcionamento de Ecossistemas) em florestas. A conclusão é apresentada em pesquisa da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba. De acordo com o estudo, a maior variedade de árvores influencia de forma mais significativa processos ecológicos e funções ecossistêmicas, tanto acima quanto abaixo do solo. Uma dessas funções é a interceptação de luz, fundamental para a estocagem de carbono, medida adotada para reduzir os efeitos das mudanças climáticas.
O trabalho foi realizado no Programa de Pós-graduação em Recursos Florestais da Esalq pela pesquisadora Marina Melo Duarte, com orientação do professor Pedro Henrique Santin Brancalion, do Departamento de Ciências Florestais, e colaboração das professoras Catherine Potvin, da McGill University, e Simone Vieira, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“A pesquisa usa florestas tropicais em processo de restauração para verificar como o número de espécies influencia algumas funções ecossistêmicas e processos ecológicos”, conta a autora. Os experimentos foram realizados no Panamá e no Brasil, na Estação Experimental de Ciências Florestais de Anhembi da Esalq. A instalação dos experimentos brasileiros foi feita pelo professor José Luiz Stape e pelo funcionário João Carlos Teixeira Mendes.
“No Brasil, usamos uma floresta em restauração com 10 anos para verificar se elevados números de espécies arbóreas (20, 58 e 114 espécies) influenciavam funções ecossistêmicas e processos ecológicos tanto acima quanto abaixo do solo. Isso é uma situação inédita pois, até onde sabemos, estudos de BEF em florestas consideram níveis de riqueza de no máximo cerca de 25 espécies.
No Panamá, usamos experimentos com florestas em restauração de 15 anos de idade, as quais continham menor número de espécies que no experimento do Brasil (no máximo 18), mas maior variedade de combinações delas, permitindo-nos destrinchar, de forma mais fina, os efeitos de diferentes combinações de espécies sobre funções do ecossistema”, explica.
Ao contrário do que a própria comunidade científica esperava sobre essa metodologia aplicada às florestas, os resultados foram surpreendentes. “Quando fiz o intercâmbio no Canadá, vários pesquisadores disseram que possivelmente não detectaríamos diferenças nas funções ecossistêmicas de florestas com 20, 58 e 114 espécies, pois eles acreditavam que essas funções já estariam saturadas com poucas dezenas de espécies”, afirma Marina.
Luz
“O que observamos foi que, em relação às funções ecossistêmicas acima do solo, florestas de 114 espécies, pelo menos durante parte do ano, foram capazes de significativamente interceptar mais luz que aquelas que continham 20 ou 58 espécies”. De acordo com a pesquisadora, a interceptação de luz é um processo ecológico intimamente ligado ao estoque de carbono, que é uma função ecossistêmica muito visada nos dias atuais.Em relação a funções ecossistêmicas e processos ecológicos abaixo do solo, analisados apenas na área experimental do Brasil, verificou-se que também foram influenciados pela riqueza de espécies, apesar de menos significativamente que os processos acima do solo. “A riqueza de espécies aumentou produção e estoque de raízes finas no solo. E também teve efeito sobre taxas de decomposição e de estoque de serapilheira, porém esse efeito não foi linear em relação ao número de espécies de árvores”, complementa.
Em síntese, os resultados mostraram que a diversidade de espécies arbóreas foi capaz de atuar em processos tanto acima quanto abaixo do solo. “É muito importante entender esses mecanismos a fim de melhorar o processo de restauração ecológica, potencializando a conservação da biodiversidade e a provisão de funções ecossistêmicas, em um contexto internacional de necessidade de mitigação de mudanças climáticas”, finaliza.
A pesquisadora explica o olhar diferenciado com o qual aplicou a teoria BEF em florestas tropicais experimentais. “Até recentemente (há cerca de 15 anos), quase todos os trabalhos dentro dessa teoria se baseavam em campos de gramíneas, que são sistemas menos complexos, pois não têm uma estrutura tridimensional tão complexa como a de uma floresta, as parcelas experimentais não requerem tamanho tão grande quanto as de florestas, gramíneas demoram menos tempo para chegar à fase adulta que árvores”.
Segundo Marina, há uma tendência atual de expandir os estudos de BEF para florestas, que são sistemas mais complexos e têm fundamental importância, entre os ecossistemas terrestres, no estoque de carbono, assunto tão comentado atualmente no contexto de necessidade de mitigação de mudanças climáticas. “Daí uma das importâncias deste trabalho, já que restaurar ou conservar florestas mantendo alta diversidade pode favorecer seu estoque de carbono e outros serviços ecossistêmicos”, complementa.
Do Jornal da USP, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 06/07/2018
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