RAFAEL CISCATI
Quando ratificou o Acordo de Paris — um esforço empreendido por 195 países para evitar a escalada do aquecimento global —, em 2016, o Brasil traçou uma série de metas que poderiam ajudar a reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa. Um dos objetivos era ampliar o uso de fontes alternativas de energia e restaurar, ou reflorestar, 12 milhões de hectares de florestas até 2030. Mas pouco se fez para atingir esse compromisso.
Um estudo inédito do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), ONG que pesquisa emissões de poluentes, sugere que é possível traçar um plano para avançar no cumprimento de duas metas simultaneamente: plantar florestas e aumentar a participação das fontes renováveis de energia. Segundo o relatório, batizado de Florestas Energéticas, o Brasil tem potencial para gerar 11,6 GW por ano — o equivalente a mais de duas usinas hidrelétricas como a de Belo Monte —a partir da biomassa de florestas plantadas, uma fonte de energia renovável. A ideia, grosso modo, é plantar árvores para produzir eletricidade.
—Nossa intenção foi demonstrar que temos alternativas às termelétricas alimentadas por combustíveis fósseis, muito poluentes — diz o pesquisador Munir Soares, um dos responsáveis pelo estudo. —Avaliamos se isso é factível. A conclusão é de que o Brasil tem uma opção de acelerar seu processo de descarbonização.
Descarbonizar, no caso, significa gerar eletricidade sem emitir gás carbônico, um dos gases responsáveis pelo aquecimento global. Nesse esquema, queima-se a madeira cultivada em florestas de eucalipto, menos poluente que o carvão ou o gás natural usados nas usinas termelétricas. Há outra vantagem ambiental: ao crescer, as árvores de eucalipto absorvem dióxido de carbono em quantidade suficiente para neutralizar os gases emitidos pela queima.
Segundo o instituto, o Brasil tem potencial para ocupar 6,3 milhões de hectares com florestas de eucalipto até 2030. As novas florestas poderiam ocupar áreas hoje destruídas, como regiões de pastagem degradadas. Dos 6,3 milhões, 1,6 milhão comporiam a chamada reserva legal, uma porção dos imóveis rurais destinada a recomposição e preservação da mata nativa.
Essa área de floresta, diz o estudo, poderia absorver 17 vezes a quantidade de gás carbônico produzida pela geração de toda a energia que hoje abastece o Sistema Integrado Nacional (SIN), a infraestrutura responsável por levar eletricidade à maior parte do país.
André Ferreira, professor da USP e presidente do Iema, afirma que o objetivo do estudo não é estimular o Brasil a plantar florestas de eucalipto maciçamente. Mas demonstrar que existem caminhos para a produção de energia mais sustentáveis:
—Se quiser expandir a geração de energia hidrelétrica, o país precisará explorar o potencial da região amazônica, a um custo socioambiental muito alto — diz Ferreira.
A discussão é urgente, segundo o pesquisador, porque, nos últimos anos, o Brasil aumentou a produção de energia a partir de termelétricas fósseis, em reação aos problemas de abastecimento dos reservatórios de hidrelétricas. A biomassa de florestas plantadas é uma alternativa interessante por ser mais controlável, em oposição a alternativas como a energia solar ou eólica, que são intermitentes e variam em função do clima.
Se quiser crescer economicamente nos próximos anos, o Brasil terá de gerar mais energia. Segundo projeções da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), até 2032, o consumo energético brasileiro deverá saltar, dos 465 TWh empregados em 2017, para 787,5 TWh.
ENERGIA PRODUZIDA É CARA
Por ora, a energia produzida a partir de biomassa de florestas plantadas é cara. Há somente 12 projetos do gênero em funcionamento, cuja energia é vendida por cerca de R$ 500 por MWh. Muito mais que os R$ 200 por MWh que se paga pela eletricidade proveniente de termelétricas a gás natural. Políticas públicas adequadas, que valorizem atributos ambientais, poderiam torná-la mais competitiva. Ainda que neutralizem emissões, florestas de eucalipto também causam impacto.
—Produzir energia a partir de eucalipto é algo positivo. Mas é preciso cuidado para que essas árvores não desabasteçam lençóis freáticos e agravem os efeitos das mudanças climáticas nas regiões em que forem plantadas — diz Pedro Brancalion, do Laboratório de Silvicultura Tropical da Esalq/USP.
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