Paloma Costa discursou na abertura da plenária principal. Socioambientalista e ativista climática defendeu os povos originários e tradicionais
- Carolina Pires
A edição 2019 da Cúpula do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em Nova Iorque entre 21 e 23 de setembro, teve reforço especial com a participação de jovens ativistas ambientais. Embora o Brasil tenha sido um dos países vetados pela ONU para discursar durante o evento, uma universitária brasileira de 27 anos deixou seu recado para o mundo.
Paloma Costa Oliveira, que estuda Direito na Universidade de Brasília, participou da mesa de abertura da plenária principal, no dia 23 de setembro, da Cúpula sobre a Ação Climática, evento mais aguardado do encontro, que contou com a presença de chefes de estado e autoridades governamentais.
“As pessoas ainda me perguntam se tenho medo de defender nossas florestas, porque defensores ambientais estão em perigo. Eu quero dizer que não tenho medo; tenho medo de morrer por causa da crise climática”, testemunhou em um dos trechos de sua fala. Ela foi escolhida entre mais de 130 representantes de diferentes países para falar ao lado do secretário-geral da ONU, António Guterres, e de outros dois jovens – a sueca Greta Thunberg e o indiano Anurag Saha Roy.
A ativista recebeu o convite com surpresa e ficou sabendo de sua participação a menos de uma semana do evento. “Eu sabia o que queria falar e tive um feedback positivo de líderes indígenas, jovens e representantes da causa. Foi muito significativo representá-los nesse espaço”, ressaltou.
Com discurso agregador, a estudante reforçou a necessidade de mobilização por parte de todos: “Uma grande líder indígena no Brasil disse recentemente que os povos indígenas têm resistido desde o início. E quanto a nós? Seremos capazes de resistir?” Em sua opinião, a juventude está engajada, mas ainda é preciso muito mais empenho de governantes, empresários e tomadores de decisão.
TRAJETÓRIA – Ainda na infância, Paloma Oliveira fez parte do grupo de escoteiros e relata que sempre sonhou em defender a natureza e as florestas. Hoje, a estudante de Direito, que já fez alguns semestres de Ciências Sociais também na UnB, tem um currículo expressivo na área ambiental.
Assessora do Instituto Socioambiental, ela também é coordenadora de clima da ONG Engajamundo, voltada à capacitação da juventude brasileira para participar de negociações internacionais de forma mais efetiva e inclusiva. Além disso, é cofundadora do projeto Ciclimáticos, que visita comunidades vulneráveis que já sofrem as consequências da mudança climática.
Na Universidade, ela participou de projeto de iniciação científica sobre a história das áreas protegidas, comparando o Brasil e os Estados Unidos, país pioneiro na criação de parques nacionais. Também fez intercâmbio no Chile, onde trabalhou na Corte Suprema e participou de pesquisa sobre aplicação de grandes empreendimentos em territórios indígenas.
Prestes a concluir o curso de Direito, a universitária está analisando, no trabalho de conclusão de curso, a legislação vigente sobre o clima, relacionando à economia dos povos tradicionais. Sobre os planos e projetos, Paloma espera continuar estudando e produzindo ciência.
“Não existem iniciativas de mitigação e adaptação ao clima sem floresta e não existe floresta sem os povos tradicionais. Mas também não existe floresta sem ciência. A universidade é o espaço onde a gente pode discutir com diferentes especialistas e ter uma visão integrada”, pontua a socioambientalista.
Em sua concepção, é fundamental trazer para a academia o saber originário tradicional, pois só assim será possível transformar o conhecimento em ações e políticas públicas. “Eu aprendi muito com os professores, especialmente com o projeto O Direito Achado na Rua. É preciso ser disruptivo com certos sistemas, não acredito mais na forma como estão sendo tomadas as decisões, não vejo futuro sem universidade, sem educação.”
DESAFIOS – Embora considere a dificuldade de ser defensor socioambiental no Brasil atualmente, em função de constante risco e ameaças, ela entende que advogar pela causa não é uma opção se vivemos numa crise climática. “O que me deixa muito triste é que acabou toda a governança voltada para clima, não há controle do desmatamento, nem aplicação das normas climáticas”, lamenta.
Para Paloma, no contexto global, “ninguém está se comprometendo com metas ambiciosas de fato". "Fico desapontada com os tomadores de decisão, pois parece que eles não veem a gravidade do problema e não são capazes de escutar os povos da floresta, que desde o início têm uma relação sustentável com a natureza.”
Apesar da descrença nos governos atuais, Paloma Costa acredita que as novas gerações são mais conscientes. “É muito difícil encontrar pessoas da minha idade que sejam céticas como vemos em indivíduos mais velhos. Grande parte dos jovens tem se mobilizado de várias formas, com mudanças de hábitos e propondo alternativas ecologicamente viáveis.”
O caminho seria a educação climática no ensino básico e também no superior. “Um problema sistemático no Brasil hoje é que o conhecimento sobre a situação climática não é levado a sério e não está inserido na nossa base educacional”, sinaliza. Ela aproveita para deixar um recado àqueles que ainda não sabem o que fazer: “Basta se conscientizar individualmente e não desistir, pois é possível se mobilizar em todas as esferas sociais, seja no núcleo familiar, escolar ou social”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário