100 dias de retrocessos socioambientais
André Villas-Bôas, secretário executivo do ISA
Em
artigo, o secretário-executivo do ISA, André Villas-Bôas, avalia e
critica as medidas tomadas pelo governo Bolsonaro até aqui na pauta
socioambiental. Texto publicado originalmente na versão digital da Folha de S.Paulo, de 10/4/2019
Nunca foram vistos tantos equívocos, desgaste e confusão em apenas 100 dias de governo. O presidente da República, seus filhos e alguns ministros encarregam-se de promover conflitos simultâneos, inclusive fomentando de forma gratuita acusações entre facções que, supostamente, apoiam-no. Com viés ideológico bizarro, ministérios e políticas inteiros não apenas são desmontados, mas reduzidos ao ridículo.
O processo começou logo no primeiro dia da nova administração, com a edição da Medida Provisória (MP) 870 e decretos que reordenaram (ou desordenaram) estruturas, competências e órgãos ministeriais, com impactos demolidores, entre outros, na agenda socioambiental. A MP ainda não foi convertida em lei e poderá sofrer modificações no Congresso. Esperamos que pelo menos parte dos prejuízos seja revertida.
O ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, até agora, só mostrou vontade para criminalizar servidores e ambientalistas - ele próprio condenado por improbidade administrativa por fraudar o plano de manejo de uma Unidade de Conservação. Já bastante desmoralizado nos foros ambientais mundiais, Salles pretende chantagear a comunidade internacional, defendendo que o Brasil só tomará medidas para reduzir emissões de gases de efeito estufa e o desmatamento se for pago para isso, trocando o protagonismo do país pelo oportunismo na agenda de mudanças climáticas (leia mais).
De forma patética, o ministro tentou aproveitar-se do maior desastre humanitário ambiental de nossa história, em Brumadinho (MG), para propor a flexibilização da legislação do licenciamento ambiental (saiba mais). Nunca é demais lembrar que a catástrofe teve entre uma de suas causas o enfraquecimento dos controles previstos no licenciamento de uma barragem de rejeitos de mineração.
Nos primeiros 100 dias de governo não se realizou nenhuma operação significativa contra o desmatamento e o número de multas aplicadas pelo Ibama foi o menor desde 1995. Enquanto isso, multiplicam-se os dados sobre aumento do ritmo da destruição da floresta e as denúncias de invasões de áreas protegidas e violência contra ambientalistas, quilombolas, índios e assentados.
Na mesma frente, ao promover o ceticismo climático, o desmantelamento das políticas ambientais e o sectarismo diplomático, Bolsonaro dá um tiro no pé de seu próprio projeto de poder, assentado na exportação de commodities agrícolas e no fortalecimento da bancada ruralista. Neste ano, prevê-se uma queda significativa da safra agrícola justamente por causa de extremos climáticos, além de outros impactos negativos ao setor a longo prazo, previstos pela comunidade científica e a Embrapa.
Por outro lado, o mercado internacional cobra cada vez mais rigor ambiental dos produtores rurais.
Enquanto a economia segue patinando e a bandeira eleitoral do combate à corrupção é relegada ao segundo plano, o percentual de brasileiros que considera o governo ótimo ou bom caiu 15%, de 49% para 34%, entre janeiro e março, segundo o IBOPE. Mas a erosão precoce da sua popularidade não deve ser festejada: porque pode ensejar mais medidas alopradas, com potencial de danos perenes à sociedade, ao meio ambiente e à imagem do país.
Vale registrar que posições defendidas por Bolsonaro, como a de vender e arrendar Terras Indígenas e de renegar os esforços para proteção da biodiversidade e o enfrentamento da crise ambiental e climática, são regressivas mesmo em relação àquelas defendidas pelo regime militar que ele não cansa de elogiar. Foi ainda durante a ditadura que se reconheceu como constitucional que as Terras Indígenas são bens da União e que o nosso patrimônio natural deve ser preservado. Se as posições de Bolsonaro traduzirem-se em medidas concretas, representarão retrocesso secular para as políticas socioambientais.
Nunca foram vistos tantos equívocos, desgaste e confusão em apenas 100 dias de governo. O presidente da República, seus filhos e alguns ministros encarregam-se de promover conflitos simultâneos, inclusive fomentando de forma gratuita acusações entre facções que, supostamente, apoiam-no. Com viés ideológico bizarro, ministérios e políticas inteiros não apenas são desmontados, mas reduzidos ao ridículo.
O processo começou logo no primeiro dia da nova administração, com a edição da Medida Provisória (MP) 870 e decretos que reordenaram (ou desordenaram) estruturas, competências e órgãos ministeriais, com impactos demolidores, entre outros, na agenda socioambiental. A MP ainda não foi convertida em lei e poderá sofrer modificações no Congresso. Esperamos que pelo menos parte dos prejuízos seja revertida.
O ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, até agora, só mostrou vontade para criminalizar servidores e ambientalistas - ele próprio condenado por improbidade administrativa por fraudar o plano de manejo de uma Unidade de Conservação. Já bastante desmoralizado nos foros ambientais mundiais, Salles pretende chantagear a comunidade internacional, defendendo que o Brasil só tomará medidas para reduzir emissões de gases de efeito estufa e o desmatamento se for pago para isso, trocando o protagonismo do país pelo oportunismo na agenda de mudanças climáticas (leia mais).
De forma patética, o ministro tentou aproveitar-se do maior desastre humanitário ambiental de nossa história, em Brumadinho (MG), para propor a flexibilização da legislação do licenciamento ambiental (saiba mais). Nunca é demais lembrar que a catástrofe teve entre uma de suas causas o enfraquecimento dos controles previstos no licenciamento de uma barragem de rejeitos de mineração.
Nos primeiros 100 dias de governo não se realizou nenhuma operação significativa contra o desmatamento e o número de multas aplicadas pelo Ibama foi o menor desde 1995. Enquanto isso, multiplicam-se os dados sobre aumento do ritmo da destruição da floresta e as denúncias de invasões de áreas protegidas e violência contra ambientalistas, quilombolas, índios e assentados.
Na mesma frente, ao promover o ceticismo climático, o desmantelamento das políticas ambientais e o sectarismo diplomático, Bolsonaro dá um tiro no pé de seu próprio projeto de poder, assentado na exportação de commodities agrícolas e no fortalecimento da bancada ruralista. Neste ano, prevê-se uma queda significativa da safra agrícola justamente por causa de extremos climáticos, além de outros impactos negativos ao setor a longo prazo, previstos pela comunidade científica e a Embrapa.
Por outro lado, o mercado internacional cobra cada vez mais rigor ambiental dos produtores rurais.
Enquanto a economia segue patinando e a bandeira eleitoral do combate à corrupção é relegada ao segundo plano, o percentual de brasileiros que considera o governo ótimo ou bom caiu 15%, de 49% para 34%, entre janeiro e março, segundo o IBOPE. Mas a erosão precoce da sua popularidade não deve ser festejada: porque pode ensejar mais medidas alopradas, com potencial de danos perenes à sociedade, ao meio ambiente e à imagem do país.
Vale registrar que posições defendidas por Bolsonaro, como a de vender e arrendar Terras Indígenas e de renegar os esforços para proteção da biodiversidade e o enfrentamento da crise ambiental e climática, são regressivas mesmo em relação àquelas defendidas pelo regime militar que ele não cansa de elogiar. Foi ainda durante a ditadura que se reconheceu como constitucional que as Terras Indígenas são bens da União e que o nosso patrimônio natural deve ser preservado. Se as posições de Bolsonaro traduzirem-se em medidas concretas, representarão retrocesso secular para as políticas socioambientais.
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