“Se não controlarmos o aumento da temperatura, a floresta amazônica pode desaparecer”, alerta Carlos Nobre
20 de agosto de 2021 Amazônia Latitude
Em conversa com o climatologista Carlos Nobre –
um dos maiores especialistas no país na área de mudanças ambientais
globais – o ambientalista e documentarista Marcos Cólon,
da Amazônia
Latitude, levantou questões simples cujas respostas podem ajudar para
uma maior compreensão do novo relatório do IPCC – Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (lançado em 9 de
agosto) pelo público. E também para nos alertar sobre as previsões dos
cientistas para a Amazônia.
Cólon resume: “Tratando da base física do que está ocorrendo
com o clima, o relatório é claro sobre a urgência da redução das emissões de
gases de efeito estufa. Nos países tropicais como o Brasil, boa parte dessas
emissões vem do desmatamento, e é urgente zerá-lo nos próximos
anos”.
E destaca este trecho das declarações de Nobre: “Se não
conseguirmos controlar o aumento da temperatura no máximo a 1,5ºC e excedermos
esse limite, há um risco para o desaparecimento da Floresta Amazônica”.
Vale lembrar que Carlos Nobre é pesquisador titular do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e foi
coordenador-geral do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos
(CPTEC/Inpe).
A entrevista que reproduzimos a seguir foi publicada
originalmente no site da Amazônia Latitude em 18/8/2021. Vamos a ela!
O que é o IPCC?
É o Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em
1998. Seu objetivo é reunir centenas de cientistas para produzir
avaliações da ciência sobre os mais diversos temas relacionados às mudanças
climáticas.
As avaliações se concentram no que são mudanças climáticas e
como elas envolvem o planeta, alertando para seus riscos e o que deve ser feito
para mitigá-las.
Como a avaliação da ciência sobre as mudanças climáticas
é feita?
Por meio de relatórios elaborados por mais de duzentos
cientistas a cada seis ou sete anos. Na semana passada, houve o lançamento do
sexto relatório de avaliação.
Além desse tipo de relatório, o IPCC produz documentos
específicos, como mudanças climáticas e os usos da terra, mudanças climáticas e
o oceano e geleiras.
Sobre o que trata o novo relatório do IPCC?
O relatório trata da base física do que está ocorrendo com o
clima e quem é o responsável por essas mudanças. A resposta: são as atividades
humanas, como emissões de gás de efeito de estufa.
Nesta sexta avaliação, foram revisados 14 mil artigos
científicos publicados desde 2013 até hoje. Em 2022, serão lançados mais
relatórios avaliando como mitigar os riscos das mudanças climáticas.
Quais são as principais observações deste novo relatório?
O relatório deixou muito claro a urgência da redução
das emissões de gases de efeito estufa, que são responsáveis (em grande
parte) pelo aquecimento de 1,1ºC no planeta desde o final do
século 19.
Não fossem poluentes como sulfatos, o aquecimento seria de 1,5 ou 1,6ºC. É inequívoco o risco que o planeta enfrenta se não conseguirmos zerar as emissões até a primeira metade do século 21 e se não pararmos com as emissões na segunda metade.
E que observações ele faz sobre a Amazônia?
O relatório diz que há risco para a permanência da
Amazônia. Diferente dos trópicos na Ásia e na África onde as mudanças
climáticas indicam aumento das chuvas, na Amazônia, mesmo mantendo o
aquecimento do planeta a 1,5ºC, há diminuição da média das chuvas e aumento da
intensidade de secas extremas e de ondas de calor.
Se continuarmos com o ritmo de desmatamentos e
incêndios, há um risco acentuado de uma degradação da floresta.
Por que devemos nos importar com o aumento da temperatura
na Amazônia?
A Floresta Amazônica evoluiu em milhões e milhões de anos em
condições de temperaturas máximas em torno de 30ºC. Com o aquecimento do
mundo, as temperaturas máximas da Amazônia podem ficar acima de 35ºC. Já vimos
esse aumento em regiões desmatadas.
Se não conseguirmos controlar o aumento da temperatura no
máximo a 1,5ºC e excedermos esse limite, há um risco para o desaparecimento da
Floresta Amazônica.
O que precisa ser feito para impedir essas mudanças?
O desafio é não permitir que a temperatura global aumente
mais do que 1,5 ºC. Não dá para ser menos porque, com os gases que já lançamos
na atmosfera, a temperatura continuará a aumentar até os próximos 20 ou 30
anos.
O novo relatório do IPCC mostra que, para diminuir o risco
de um descontrole que colocará o futuro da vida do planeta em risco até mesmo
para humanos, é preciso reduzir as emissões líquidas a zero até meados deste
século.
Será muito difícil fazer essa redução de forma rápida?
É, talvez, o maior desafio que a humanidade já
enfrentou. Para seguirmos uma trajetória de redução das emissões líquidas a
zero até meados deste século, temos que, imediatamente, reduzir as emissões de
óxido nitroso, metano e outros gases até 2030.
Infelizmente vimos que as emissões aumentaram em 2021,
estando mais altas do que em 2019. A pandemia da covid-19 fez
as emissões reduzirem 5%, mas, no início dos primeiros meses de 2021, já
tínhamos voltado aos níveis de emissão anteriores.
O que impede essa redução imediata?
O planejamento e a construção de termelétricas,
que queimam combustíveis fósseis, o aumento da frota de veículos
que queimam gasolina e diesel.
Nos países tropicais como o Brasil, parte das emissões vem
dos desmatamentos. Então, teremos que zerá-los nos próximos anos.
As emissões vão aumentar até, pelo menos, 2024; por isso, mudar rapidamente
o padrão global de uso de energia é um enorme desafio.
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Foto (destaque): Volvo Environmental Prize 2016/Divulgação
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