quarta-feira, 17 de Agosto de 2016
Esta notícia está associada ao Programa:
Dos
96 domicílios pesquisados, 100% apresentavam algum grau de insegurança
alimentar. O índice nacional é de 23%. Para pesquisadores, resultados
não deixam dúvidas sobre relação com dificuldade de acesso aos
territórios e a violação dos direitos culturais
O
resumo executivo de um estudo lançado, ontem (16/8), em Brasília, traz
dados alarmantes sobre a situação nutricional e de soberania alimentar
do povo Guarani Kaiowá (MS).
A grave situação de violações de direitos enfrentada pelos índios é o tema do resumo do relatório O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do Povo Guarani e Kaiowá: um enfoque holístico. Lançado ontem na Universidade de Brasília (UnB), o trabalho foi produzido pela Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar (Fian Brasil), em parceria com a Fian Internacional e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O relatório completo ainda está sendo finalizado e será lançado até o fim do ano.
“A gente identifica duas causas estruturantes que acabam impactando no direito humano à alimentação adequada. Uma é de fato o direito ao território e tudo que decorre da falta de acesso ao território. Outra é a questão da identidade cultural dos povos indígenas”, explica Valéria Burity, secretária geral da Fian Brasil, durante o lançamento do resumo.
“Em sua maioria, [os índios] estão ilhados em pequenos espaços de terra, acuados por monoculturas que demandam uso intensivo de agrotóxicos, sem condições de plantar, caçar, pescar ou realizar outros atos de sua cultura”, afirma o estudo, que enfocou a situação de acampamentos e áreas de retomada no sul de Mato Grosso do Sul.
“Sem terra, você não tem saúde, não tem alimentação adequada, não tem educação, não tem nada”, afirma Thaís Franceschini, pesquisadora e membro da Fian Brasil.
Nos 75 domicílios com jovens e crianças pesquisados, quase 59% apresentavam insegurança alimentar moderada, caracterizada pela restrição quantitativa e piora na qualidade dos alimentos, com os adultos convivendo com a fome para que as crianças tivessem o que comer. Em 28% dos domicílios, foi registrada insegurança alimentar grave, com adultos e crianças passando fome. Pouco mais de 13% apresentaram insegurança alimentar leve, em que há comprometimento da qualidade dos alimentos e preocupação com a falta deles em um futuro próximo.
A coleta de dados foi feita em 96 domicílios de três comunidades Guarani Kaiowá, no sudoeste do Mato Grosso do Sul: Guaiviry, Ypo’i e Kurusu Ambá. Todas elas são formadas a partir de retomadas dos indígenas de partes de seus territórios tradicionais e marcadas por um histórico de violência e assassinatos de lideranças, cometidas por fazendeiros.
Os autores do relatório apontam que os dados são “prova inequívoca da gravidade da discriminação, do abandono e do descaso do Estado brasileiro na realização do DHANA [direito humano à alimentação e nutrição adequadas] dos Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul”. E o problema não é novo: há cerca de dez anos, essas comunidades já enfrentaram uma grave crise de segurança alimentar.
“Quando a gente vive na retomada, no acampamento, falta para nós comida, falta de tudo para nós, falta semente”, conta o líder Genito Gomes. O pai de Genito, cacique Nizio Gomes, foi assassinado por fazendeiros em 18 de novembro de 2011, na comunidade Guaiviry. Genito destaca também que a maior demanda dos indígenas hoje é a demarcação de seus territórios.
No lançamento do estudo, líderes indígenas e pesquisadores destacaram a inação do Estado brasileiro, em suas diferentes esferas, para proteger os índios, além de casos em que as instituições promovem ameaças aos sues direitos. Um exemplo mencionado foi a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000, em tramitação no Congresso, que pretende repassar do governo federal aos parlamentares a atribuição de dar a última palavra sobre as demarcações de Terras Indígenas. O projeto ameaça tanto às terras já demarcadas quanto àquelas ainda em processo de demarcação.
“O Brasil hoje está comemorando os Jogos Olímpicos. Está todo mundo comemorando, vibrando e, ao mesmo tempo, nós indígenas estamos chorando, derramando nosso sangue em nossas bases, porque estamos sendo perseguidos, presos, despejados de nossas terras. O Brasil não está mostrando isso para o mundo”, denunciou o líder indígena Eliseu Lopes Guarani Kaiowá, representante do Conselho Aty Guasu. “Por mais de 500 anos, tentaram acabar com nosso povo, mas nossa resistência até hoje está lá, está viva e vamos continuar”, garantiu.
A grave situação de violações de direitos enfrentada pelos índios é o tema do resumo do relatório O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do Povo Guarani e Kaiowá: um enfoque holístico. Lançado ontem na Universidade de Brasília (UnB), o trabalho foi produzido pela Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar (Fian Brasil), em parceria com a Fian Internacional e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O relatório completo ainda está sendo finalizado e será lançado até o fim do ano.
“A gente identifica duas causas estruturantes que acabam impactando no direito humano à alimentação adequada. Uma é de fato o direito ao território e tudo que decorre da falta de acesso ao território. Outra é a questão da identidade cultural dos povos indígenas”, explica Valéria Burity, secretária geral da Fian Brasil, durante o lançamento do resumo.
“Em sua maioria, [os índios] estão ilhados em pequenos espaços de terra, acuados por monoculturas que demandam uso intensivo de agrotóxicos, sem condições de plantar, caçar, pescar ou realizar outros atos de sua cultura”, afirma o estudo, que enfocou a situação de acampamentos e áreas de retomada no sul de Mato Grosso do Sul.
“Sem terra, você não tem saúde, não tem alimentação adequada, não tem educação, não tem nada”, afirma Thaís Franceschini, pesquisadora e membro da Fian Brasil.
Números impressionam
Os números do estudo impressionam: 100% dos domicílios pesquisados apresentavam algum grau de insegurança alimentar. No Brasil, esse índice não passava de 23% em 2013, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNAD/IBGE).Nos 75 domicílios com jovens e crianças pesquisados, quase 59% apresentavam insegurança alimentar moderada, caracterizada pela restrição quantitativa e piora na qualidade dos alimentos, com os adultos convivendo com a fome para que as crianças tivessem o que comer. Em 28% dos domicílios, foi registrada insegurança alimentar grave, com adultos e crianças passando fome. Pouco mais de 13% apresentaram insegurança alimentar leve, em que há comprometimento da qualidade dos alimentos e preocupação com a falta deles em um futuro próximo.
A coleta de dados foi feita em 96 domicílios de três comunidades Guarani Kaiowá, no sudoeste do Mato Grosso do Sul: Guaiviry, Ypo’i e Kurusu Ambá. Todas elas são formadas a partir de retomadas dos indígenas de partes de seus territórios tradicionais e marcadas por um histórico de violência e assassinatos de lideranças, cometidas por fazendeiros.
Os autores do relatório apontam que os dados são “prova inequívoca da gravidade da discriminação, do abandono e do descaso do Estado brasileiro na realização do DHANA [direito humano à alimentação e nutrição adequadas] dos Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul”. E o problema não é novo: há cerca de dez anos, essas comunidades já enfrentaram uma grave crise de segurança alimentar.
“Quando a gente vive na retomada, no acampamento, falta para nós comida, falta de tudo para nós, falta semente”, conta o líder Genito Gomes. O pai de Genito, cacique Nizio Gomes, foi assassinado por fazendeiros em 18 de novembro de 2011, na comunidade Guaiviry. Genito destaca também que a maior demanda dos indígenas hoje é a demarcação de seus territórios.
No lançamento do estudo, líderes indígenas e pesquisadores destacaram a inação do Estado brasileiro, em suas diferentes esferas, para proteger os índios, além de casos em que as instituições promovem ameaças aos sues direitos. Um exemplo mencionado foi a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000, em tramitação no Congresso, que pretende repassar do governo federal aos parlamentares a atribuição de dar a última palavra sobre as demarcações de Terras Indígenas. O projeto ameaça tanto às terras já demarcadas quanto àquelas ainda em processo de demarcação.
“O Brasil hoje está comemorando os Jogos Olímpicos. Está todo mundo comemorando, vibrando e, ao mesmo tempo, nós indígenas estamos chorando, derramando nosso sangue em nossas bases, porque estamos sendo perseguidos, presos, despejados de nossas terras. O Brasil não está mostrando isso para o mundo”, denunciou o líder indígena Eliseu Lopes Guarani Kaiowá, representante do Conselho Aty Guasu. “Por mais de 500 anos, tentaram acabar com nosso povo, mas nossa resistência até hoje está lá, está viva e vamos continuar”, garantiu.
Victor Pires
ISA
Imagens:
Nenhum comentário:
Postar um comentário