, artigo de Roberto Naime
[EcoDebate] Se distinguem situações de risco decorrentes de fenômenos com forte intensidade com efeitos vorazes e catastróficos, mas com duração passageira, como terremotos, tsunamis, erupções vulcânicas, furacões, dos danos cotidianos resultantes de fenômenos naturais, enquanto ações crônicas, com incidência mais perversa em habitats e populações vulneráveis, com tormentas sucedidas de inundações urbanas ou deslizamentos.
Estes são fatos mais comuns no Brasil. Em qualquer dos casos, a verdade é que as populações mais afetadas são as mais pobres.
A noção básica que orienta a análise é de que os “desastres” não são naturais, mas decorrentes da ação humana, considerando as relações entre a produção do espaço, a forma como as sociedades ocupam e usam o território e a sujeição a riscos de fenômenos naturais.
Eventos naturais somente se convertem em desastres quando seres humanos vivem nas áreas onde ocorrem. A presença de fatores ambientais faz parte da vida urbana, porém os danos ambientais resultam da ação humana.
Os impactos dos fenômenos naturais na sociedade tornam-se problemáticos pelo modo de ocupação do solo, pela qualidade construtiva e pela presença ou ausência de infraestrutura adequada.
Outra noção é a de “vulnerabilidade urbana”, envolvendo riscos com implicações sociais, econômicas, tecnológicas, culturais, ambientais e políticas, diretamente vinculados a estruturas sociais.
Fatores de ordem social e institucional se combinam e levam a que determinados riscos produzam efeitos nocivos sobre as populações.
A expansão urbana mundial ocorre em cidades localizadas em áreas potencialmente perigosas em relação a fenômenos naturais, e cada cidade adota medidas preventivas próprias que podem resguardar de riscos a população.
A pobreza e a combinação de pobreza com urbanização e meio ambiente afeta a qualidade da vida urbana, expondo a população a situações de risco decorrentes de processos naturais ou humanos.
Mais graves que as catástrofes repentinas são as consequências cotidianas da combinação urbanização e pobreza, sob esse modelo inadequado e insustentável de apropriação e uso do espaço e dos recursos naturais.
Males que resultam da falta de saneamento e abastecimento de água potável, da poluição do ar e da água, da alta densidade da ocupação urbana sem controle, e da baixa qualidade das moradias e do habitat matam mais que muitas catástrofes.
Assim, a condição mais perversa de degradação ambiental advém do modelo de desenvolvimento econômico e da opção energética, do consumo desenfreado das classes abastadas e do crescimento geométrico do transporte individual, influenciando aceleradamente no efeito estufa e aquecimento global, cujas consequências climáticas, mesmo que afetem toda a humanidade, incidem mais tragicamente sobre as populações vulneráveis.
Se conclui que forças naturais raramente resultam em efemérides humanas significativos, salvo se as sociedades oferecem condições que tornem possíveis os desastres e suas consequências.
Ocorrências imprevistas se intensificam em cidades construídas em locais geologicamente ou ambientalmente instáveis, sem provisão de infraestrutura adequada e com construções estruturalmente frágeis, atingindo diretamente populações vulnerabilizadas.
Para enfrentar tais problemas, devem ser intensificadas análises que articulem os aspectos físicos e humanos na avaliação de riscos de fenômenos naturais, na identificação de populações vulneráveis e no desenvolvimento de procedimentos que eliminem os efeitos dos desastres.
Devem compreender e considerar os elementos da vida cotidiana e as lógicas que interagem na dinâmica de apropriação do solo e provisão pública de serviços e infraestrutura.
Mais importante, devem assegurar a participação da comunidade, pois ocorrem existir as informações fundamentais à tomada de decisões e à adoção de medidas de socorro, e contar como o fortalecimento do papel do Estado na condução do processo.
Porém, mais que pesquisas acadêmicas ou práticas gerenciais, há que ser repensado o modelo de desenvolvimento, colocando como prioridade o enfrentamento e a busca definitiva de solução para a miséria urbana. Acidentes não são meramente ocorrências naturais ou ambientais. São antes de tudo antropológicos.
Referência:
http://www.observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_content&view=article&id=81:moura1&catid=34:artigos&Itemid=124&lang=pt
Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
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