, artigo de Sucena Shkrada Resk
[EcoDebate] Quando dizemos que um indivíduo ou uma nação têm “palavra”, o sentido implícito nesta frase implica retidão, ética e relação de confiança. Mas nos deparamos hoje na contemporaneidade com uma fragilidade que reflete um mundo em que leis, direitos instituídos e promessas se encaminham cada vez mais à flexibilização.
Por artifícios que seguem a bula dos procedimentos legais ou por meios ilegais, as artimanhas se consolidam de forma orquestrada ao sabor dos interesses dos atores envolvidos, tendo como mote a relação com o estabelecimento do poder em detrimento do bem comum. É, estamos falando de um mundo “flex” que gera temor pela inconstância. Essa característica cada vez mais acentuada se deflagra na nossa política interna e internacional. Tempos difíceis que nos deixa uma carga considerável de ônus para as atuais e próximas gerações.
Hoje algumas das áreas que estão mais vulneráveis a essas estratégias são as do direito indígena e de povos tradicionais, e da conservação ambiental, destituindo já os fracos órgãos que atuam nos papeis de avaliação e fiscalização, reduzindo o espaço de escuta dessas populações e da sociedade e abrindo espaço para que os setores que provocam passivos tenham maior poder. Projetos de lei em tramitação no Congresso revelam esse rumo de retrocesso aos direitos estabelecidos constitucionalmente.
Na agenda, estão propostas que tratam da flexibilização do licenciamento ambiental, das outorgas de mineração, de demarcação de terras indígenas, de caça de animal silvestre, de introdução de pastagem em reserva legal, de autorização de vaquejadas e rodeios. Como também de ações menos restritivas, como não aprovar penas mais altas a quem promove queimadas. Por outro lado, também enfrentamos outra questão importante: as políticas que “não pegam”. Vide a situação da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Na esfera internacional, as declarações e medidas tomadas pelo atual presidente dos EUA, Donald Trump, enfatizam a anulação de iniciativas na área socioambiental tomadas por Barack Obama, no contexto das conferências do clima, entre outros espaços de negociação. Ao mesmo tempo já nomeou para a pasta, um cético quanto às mudanças climáticas e aliado da indústria petroleira, que gera Gases de Efeito Estufa (GEEs).
Com tudo isso, observamos que o que hoje é uma norma ou linha política, amanhã pode deixar de ser, de acordo com a visão de mundo dos detentores do poder e também do mercado global. A chamada moeda de “valoração” dos bens intangíveis desaparece nesta escala, em que valores monetários se sobressaem. Aí volta à tona a reflexão entre ser e ter. Uma boa pauta para estar no centro dos debates nesses tempos “flex”.
Sucena Shkrada Resk é jornalista, formada há 25 anos, pela PUC-SP, com especializações lato sensu em Meio Ambiente e Sociedade e em Política Internacional, pela FESPSP, autora do Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk (http://www.cidadaosdomundo.webnode.com), desde 2007, voltado às áreas de cidadania, socioambientalismo e sustentabilidade e assessora de comunicação no terceiro setor socioambiental.
in EcoDebate, 24/01/2017
"O ônus socioambiental da contemporaneidade ‘Flex’, artigo de Sucena Shkrada Resk," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 24/01/2017, https://www.ecodebate.com.br/2017/01/24/o-onus-socioambiental-da-contemporaneidade-flex-artigo-de-sucena-shkrada-resk/.
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