terça-feira, 13 de junho de 2017

Partidos da terra, crise da água





por Aldem Bourscheit, Jornalista

As crises política e econômica anteciparam o jogo eleitoral e partidos já ocupam espaços na mídia para vender plataformas e promessas. Ao menos no Distrito Federal (DF), certas siglas abusam da demagogia e defendem abertamente a ocupação ilegal ou desregrada do território, uma das causas da pindaíba regional quanto ao abastecimento de água.

Um parlamentar do DF envolvido no lobby da tomada de terras defendeu arduamente a aprovação pelo Congresso Nacional do chamado
Pacote de Aceleração da Grilagem (Medida Provisória 759/2016), que pode dar fim à Reforma Agrária, anistiar desmatadores e consolidar tomadas ilegais de terras, no campo e nas cidades.

Não estranhem tal movimento. Afinal, o deputado mira o governo do DF, onde a posse da terra parece tão disputada quanto na Amazônia. No Distrito Federal, já foram eliminados sete em cada dez hectares de Cerrado nativo, quase tudo para dar espaço a lavouras, invasões e a mais de 600 condomínios horizontais.

Legalizar a qualquer custo essas ocupações é promessa recorrente de campanhas políticas. Removê-las é sempre uma
tarefa bíblica, mesmo com amparo judicial.

Carente de informações mais confiáveis e de políticas que conduzam a uma ocupação do território mais racional e com preços que caibam em seu bolso, parte da população distrital aplaude o
tiro no pé ambiental com a possível regularização sumária de condomínios irregulares.

Números do Governo Federal revelam que cem milhões de hectares foram grilados em todo o Brasil. Isso é quase 12% da área do país. No imperdível livro
Partido da Terra, o jornalista Alceu Castilho traz um mapeamento inédito dos políticos donos de terra e descobriu que, em todos os cantos do Brasil, há poderosos latifundiários, de diversas cores partidárias. Todos de mãos dadas para defender políticas em benefício próprio.

Enquanto isso, dados da
Justiça Eleitoral e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária revelam que 350 deputados e senadores possuem por volta de um milhão de hectares em terras no país, oficialmente.

O chamado
Novo Código Florestal foi publicado há cinco anos, mas sua regulamentação segue a passos de tartaruga. O cadastro dos imóveis rurais já cobre quase todo o país, enquanto quesitos como transparência das informações e compensações econômicas para quem proteger mais vegetação nativa do que pede a legislação não avançam nos escaninhos do Congresso e do Governo.

Mapeamentos e incentivos como esses ajudariam na inadiável restauração e na manutenção do Cerrado no Distrito Federal. Áreas como a
Serrinha do Paranoá, a APA do Descoberto e o entorno de Áreas de Proteção de Mananciais, todas importantes para manter água nas torneiras de mais de 3 milhões de pessoas, estão cada vez menos verdes.

Relatório das Nações Unidas
publicado este ano defende que aproveitar águas já usadas pela população, agricultura e indústria pode ser uma fonte segura e inesgotável para estes mesmos setores, tanto da própria água quanto de energia (biogás) e de nutrientes para lavouras. Todavia, pouco se investe nesta agenda.

Por enquanto, diante da crise de abastecimento, as soluções regionais têm insistido em obras de alto custo financeiro para ampliar a captação de água, seja do Lago Paranoá ou da Barragem de Corumbá. Todavia, à questão da água estão amarradas outras agendas.

Retomar a gestão do território, recompor a vegetação nativa e ampliar a rede de áreas protegidas não só revitalizará nascentes e cursos d´água, mas também aumentará a qualidade de vida da população e nos dará mais força para enfrentar as inevitáveis mudanças do clima.

Ao mesmo tempo em que esses temas batem à porta de todos os brasileiros, parte de nossa
casta política segue guiando o país por vias tortuosas e sem garantia de futuro, com os olhos nas urnas e as mãos sempre prontas para abocanhar mais um naco de terra, mesmo que pública.

Sem políticas mais efetivas para a fiscalização e a punição de quem insiste nessas práticas e também para uma urgente regularização fundiária nacional, não será possível ter um desenvolvimento social e econômico baseado em um aproveitamento mais sério e sustentável do território.


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