Por surpreendente que pareça a afirmação no século 21, cientistas do planeta se declaram acuados.
Da perspectiva global, o mal-estar gira em torno de Donald Trump e seu desprezo pelos fatos, tendo como símbolo o ceticismo do presidente norte-americano quanto ao aquecimento global.
Tal visão se materializa em cortes de verbas para órgãos científicos e ambientais, além da decisão de abandonar o Acordo de Paris —assinado em 2015 para conter a emissão de gases do efeito estufa.
Não restrita a círculos governamentais, a visão anticientífica encontra eco na sociedade. Mesmo não revelando maiorias, impressionam certos percentuais registrados pelo Centro de Pesquisas Pew entre adultos dos Estados Unidos.
São 22% os que confiam pouco ou nada em cientistas quando se trata de informações a respeito das causas das mudanças climáticas.
Com grupos antivacina propagando disparates na internet, 10% dos americanos julgam que os riscos da imunização são maiores que seus benefícios. Fora isso, adversários da teoria da evolução natural cobram o ensino de criacionismo nas escolas.
O contrassenso de tais manifestações de descaso pelos fatos em uma era de informações abundantes tem mobilizado os cientistas, em particular nos EUA.
Assim o demonstraram, em abril, marchas em defesa da ciência ocorridas em 600 cidades de 60 países, entre eles o Brasil.
Em entrevista a esta Folha, Fraser Stoddart, um dos vencedores do Prêmio Nobel de Química em 2016, externou sua inquietação com o que chamou de "volta no tempo" e cobrou maior engajamento científico de seus colegas.
No Brasil, representantes do setor discutem a criação de um partido político para ampliar sua voz. Um dos temas mais salientes é a perda de recursos orçamentários, ainda mais depois da fusão, no governo Michel Temer (PMDB), dos ministérios da Ciência e Tecnologia e das Comunicações.
Nesse ponto, causa preocupação que a pesquisa e a inovação no país continuem a depender substancialmente de organizações estatais.
Merecem estímulo as iniciativas que amplifiquem a influência do saber científico no debate público —de preferência, não por meio da criação de uma enésima legenda partidária. Sem prejuízo da ampla liberdade de opinião e expressão, reforços nas fileiras contrárias ao obscurantismo são bem-vindos.
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