sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

O aumento de casos de malária e sua associação à pressão socioambiental sobre a Amazônia


O aumento de casos de malária e sua associação à pressão socioambiental sobre a Amazônia

07/05/2018 14:08 Por Sucena Shkrada Resk
Foto: Anopheles - Divulgação/FiocruzDesmatamento, mudanças climáticas e consequentemente a facilitação para um aumento de vetores de doenças infectocontagiosas são o cenário perfeito, que está sendo construído, nos últimos anos, na Amazônia brasileira, onde um dos indícios desta pressão é a ascendência de casos de malária (paludismo) no ano de 2017, totalizando cerca de 194 mil notificações de ocorrências na região, de acordo com o Sistema de Vigilância Epidemiológica, do Ministério da Sáude (Sivep/MS) contra 128,7 mil, em 2016 e 142,6 mil, em 2015.


No Brasil, as populações rural e ribeirinha se veem à mercê da ação dos mosquitos fêmea do gênero Anopheles, que são hospedeiros principalmente, do Plasmodium vivax (que causa forma mais branda da doença, mas que pode ser reincidente), principais transmissores da doença no país, além do falciparum (forma mais grave e altamente letal), que se proliferam em água limpa, quente, sombreada e de baixo fluxo. Na geolocalização do alerta epidemiológico, os estados do Pará, Amazonas, Acre e Roraima, além do Amapá, Maranhão, de Rondônia e do Tocantins se destacam em números totais de registros e a época mais propícia para a transmissão é durante e após o período das chuvas.


A instabilidade geopolítica também é um fator a ser destacado, tendo em vista, por exemplo, a situação na Venezuela e o processo migratório diretamente para Roraima, além da circulação histórica na região do Oiapoque com a Guiana Francesa, entre outras situações presentes em regiões transfronteiriças. A Organização Pan-americana de Saúde (OPAS) alerta para o aumento da doença na América Latina, nos últimos anos, incluindo também Colômbia, El Salvador, Equador, Haiti, Honduras, México, Nicarágua e Panamá. Só na Venezuela, ocorreram mais de 406 mil casos em 2017, 69% mais que no ano anterior. A organização expõe que algumas atividades, como a mineração, a extração de produtos naturais e a agricultura, aumentam o risco de exposição das populações aos vetores nas áreas com transmissão da doença.


A região amazônica sofreu algumas epidemias de malária, a partir do final do século XIX, em um contexto da extração de borracha nos seringais e da miscigenação e da construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré. Principalmente após a Segunda Guerra Mundial, se concentra na região, depois de sua incidência também significativa na costa litorânea.

Estima-se que 128 milhões de pessoas vivem em áreas de risco nas Américas. No mundo, 90% dos casos são registrados na África Subsaariana. Existe uma estratégia mundial de combate à malária 2016-2030 definida pela Assembleia Mundial em Saúde, de 2015, que propõe a redução da incidência da doença e da mortalidade em pelo menos 90% até 2030. Em 2015, ocorreram 429 mil mortes, sendo a maior parte de crianças do continente africano.


O desafio da prevenção e tratamento
Como não existe ainda vacina, a prevenção fica mais difícil e depende de cuidados, como uso de repelentes, inseticidas (principalmente piretroides) específicos e mosquiteiros, como uso de roupas com mangas compridas. Existem também alguns tratamentos profiláticos com medicamentos (sob orientação médica), de acordo com a OPAS. O problema, no entanto, é o aumento de resistência dos parasitas, o que causa apreensão aos especialistas mundialmente. A doença pode ainda ser transmitida por transfusão de sangue contaminado, por meio da placenta ao feto e por meio de seringas infectadas. O período de incubação pode variar de 7 a 30 dias, com sintomas intermitentes.


Segundo pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), para evitar quadros mais graves que levem a óbito, os tratamentos exigem que os diagnósticos sejam feitos nas primeiras 48 horas, após o início dos sintomas, que envolvem principalmente febre na casa dos 40 graus, calafrios, cefaleia, náuseas e dores articulares. A principal medida é a confirmação laboratorial da doença, pela microscopia da gota espessa de sangue ou por testes rápidos imunocromatográficos. Mas como está esta retaguarda justamente distante dos grandes centros urbanos? Essas ações podem significar a diferença entre a manutenção da vida e a morte.

Iniciativas de pesquisas

No campo da Ciência, algumas pesquisas estão em andamento, como da vacina contra a malária, que entra em fase-piloto em Gana, Quênia e Malau, segundo a OMS. De acordo com artigo na Scientific American Brasil, na Universidade do Arizona, foi desenvolvido um mosquito transgênico por equipe liderada pelo entomólogo Michael Riehle, que seria imune ao Plasmodium falciparum. 

Outra iniciativa ocorre com a participação do Departamento de Biologia Estrutural e Funcional do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), coordenado pela professora Elizabeth Bilsland, em colaboração com as Universidades de Cambridge, Manchester e Gotemburgo, além da Universidade de São Paulo (USP) e Federal de Goiás (UFG). Trata-se da descoberta de que o “triclosan”, um composto utilizado em sabonetes e cremes dentais, tem a capacidade para inibir genes-alvo do Plasmodium vivax, tanto na fase quando se desenvolve no fígado, como nas células do sangue.

Encontra-se em fase de desenvolvimento no Instituto de Química da Unicamp, também um biossensor – com custo popular - para diagnosticar a malária transmitida pelo Plasmodium 
falciparum.

Todas estas medidas são importantes mas não descartam algo maior que é a intervenção humana que acelera as mudanças socioambientais, que desregulam ciclos de precipitações e períodos de estiagem, entre outros ângulos, como já é confirmado por especialistas do mundo todo. Facilitar o aumento do número de vetores abre uma janela para retrocedermos em conquistas de saúde ambiental ao longo de décadas.

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