São Paulo tem sede e a região de Juquitiba tem bastante água para
fornecer. Mas o volume que a Sabesp diz que pretende captar no
reservatório de Cachoeira do França é superior ao registrado na outorga.
Por Magali Cabral, da Página 22 –
A pouco mais de 100 km de São Paulo, no Vale do Ribeira, em direção ao Paraná, há uma floresta nativa de Mata Atlântica de 31 mil hectares – área dez vezes maior que a da Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, e cinco vezes o tamanho do Parque Estadual da Cantareira, em São Paulo. O grupo empresarial Votorantim, proprietário dessa reserva, chamada de Legado das Águas, decidiu substituir o sistema de vigilância particular que durante décadas afugentou grileiros e caçadores e controlou incêndios por um plano estratégico de gestão desenvolvido pela Conservação Internacional: será lançada em 2017 uma série de programas de geração de valor para o território, beneficiando no mínimo os três municípios por onde se estende a reserva ¬– Tapiraí, Miracatu e Juquiá.
Entretanto, uma ameaça ainda ronda não apenas o Legado da Águas e esses três municípios, mas toda a área à jusante de Juquitiba: o risco de redução drástica da vazão das águas que banham a região. Para desafogar o debilitado Sistema Cantareira, a Sabesp começará a abastecer uma parte da região Metropolitana de São Paulo com água do reservatório Cachoeira do França, em Juquitiba. Após realizar um estudo de impacto ambiental, a empresa obteve do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) outorga para captar 4,7 metros cúbicos por segundo (m3/s).
Em tese, não haverá problemas nos fluxos de água que irrigam a região, pois a empresa de saneamento realizou o estudo de impacto ambiental e, segundo a assessoria de imprensa (a Sabesp não quis agendar entrevista, preferindo enviar a resposta por e-mail) “a água que segue é mais do que suficiente para manter o equilíbrio hidrológico rio abaixo.” Entretanto, há uma divergência de informação quanto ao volume de água a ser retirado. A Sabesp informou que a outorga para o empreendimento é de até 6,4m3/s. O DAEE, no entanto, confirmou por e-mail, em 5 de maio, que a outorga naquela bacia continua sendo de 4,7m3/s, tão somente.
Para o professor titular do Departamento de Ciências Biológicas da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), Ricardo Ribeiro Rodrigues, dificilmente haveria uma repercussão grave na vegetação ciliar e na fauna dos rios se a captação se restringir aos volumes considerados no estudo de impacto ambiental. Mas ultrapassar a captação permitida em 36%, como a Sabesp vem anunciando, é uma medida arriscada. A alteração da dinâmica dos rios com exposição da margem dos rios seguramente mexerá com a movimentação da fauna que ocorre em meio a vegetação ciliar. “Além disso, tem também uma questão social, que é o abastecimento das pessoas rio abaixo”, afirma.
A represa do França é alimentada pelo Rio Juquiá, que corta o Legado das Águas e margeia o Parque Estadual Jurupará. O Juquiá também “alimenta” o Rio São Lourencinho (que cruza o Parque Estadual da Serra do Mar) e o Rio Itariri (em Miracatu).
Para o gerente de Sustentabilidade da Votorantim, David Canassa, todos
os estudos indicam que a retirada de 4,7 m3/ s causará impacto no limite da sustentabilidade da bacia do Juquiá, assim como reduzirá a geração de energia para a empresa. “Mas isso faz parte”, explica. “O múltiplo uso da água é previsto em lei”.
Quanto à possibilidade de a Sabesp vir a retirar mais água da bacia, Canassa crê que seria prudente a verificação do impacto sistêmico dessa retirada extra, não só no entorno do reservatório do França, mas ao longo de toda a cascata, até onde o Juquiá encontra-se com o Ribeira de Iguape, já próximo ao Litoral Sul do estado.
O legado
Com 782 espécies de plantas já catalogadas e uma fauna sortida, com direito a animais de topo de cadeia como onças-pardas, cachorro-vinagre e antas, no ano que vem, o Legado das Águas será aberto ao público. Abrigará atividades científicas, educacionais e de sustentabilidade.
Muita coisa já está acontecendo. Há um polo voltado para a educação ambiental em plena atividade e um viveiro em fase de desenvolvimento, que fornecerá mudas para recomposição de florestas de Mata Atlântica feitas a partir de material genético retirado de plantas nativas.
A Votorantim pretende promover pesquisas científicas e estudos em biotecnologia em parceria com universidades, além de desenvolver as cadeias produtivas locais, incluindo o ecoturismo. “Por meio de um projeto de apoio à gestão pública, vamos ajudar os municípios a se estruturarem para que cresçam junto com os empreendimentos do Legado das Águas”, informa Canassa.
Também está nos planos da empresa fornecer áreas de vegetação nativa a agricultores com déficit em suas Cotas de Reserva Ambiental (CRAs) e alugar ou arrendar até mil hectares de Reserva Legal.
A questão primordial, no entanto, é garantir que haverá água suficiente para matar a sede de São Paulo e não matar de sede esse pouco de floresta nativa restante em São Paulo.
Fonte: Envolverde
Por Magali Cabral, da Página 22 –
A pouco mais de 100 km de São Paulo, no Vale do Ribeira, em direção ao Paraná, há uma floresta nativa de Mata Atlântica de 31 mil hectares – área dez vezes maior que a da Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, e cinco vezes o tamanho do Parque Estadual da Cantareira, em São Paulo. O grupo empresarial Votorantim, proprietário dessa reserva, chamada de Legado das Águas, decidiu substituir o sistema de vigilância particular que durante décadas afugentou grileiros e caçadores e controlou incêndios por um plano estratégico de gestão desenvolvido pela Conservação Internacional: será lançada em 2017 uma série de programas de geração de valor para o território, beneficiando no mínimo os três municípios por onde se estende a reserva ¬– Tapiraí, Miracatu e Juquiá.
Entretanto, uma ameaça ainda ronda não apenas o Legado da Águas e esses três municípios, mas toda a área à jusante de Juquitiba: o risco de redução drástica da vazão das águas que banham a região. Para desafogar o debilitado Sistema Cantareira, a Sabesp começará a abastecer uma parte da região Metropolitana de São Paulo com água do reservatório Cachoeira do França, em Juquitiba. Após realizar um estudo de impacto ambiental, a empresa obteve do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) outorga para captar 4,7 metros cúbicos por segundo (m3/s).
Em tese, não haverá problemas nos fluxos de água que irrigam a região, pois a empresa de saneamento realizou o estudo de impacto ambiental e, segundo a assessoria de imprensa (a Sabesp não quis agendar entrevista, preferindo enviar a resposta por e-mail) “a água que segue é mais do que suficiente para manter o equilíbrio hidrológico rio abaixo.” Entretanto, há uma divergência de informação quanto ao volume de água a ser retirado. A Sabesp informou que a outorga para o empreendimento é de até 6,4m3/s. O DAEE, no entanto, confirmou por e-mail, em 5 de maio, que a outorga naquela bacia continua sendo de 4,7m3/s, tão somente.
Para o professor titular do Departamento de Ciências Biológicas da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), Ricardo Ribeiro Rodrigues, dificilmente haveria uma repercussão grave na vegetação ciliar e na fauna dos rios se a captação se restringir aos volumes considerados no estudo de impacto ambiental. Mas ultrapassar a captação permitida em 36%, como a Sabesp vem anunciando, é uma medida arriscada. A alteração da dinâmica dos rios com exposição da margem dos rios seguramente mexerá com a movimentação da fauna que ocorre em meio a vegetação ciliar. “Além disso, tem também uma questão social, que é o abastecimento das pessoas rio abaixo”, afirma.
A represa do França é alimentada pelo Rio Juquiá, que corta o Legado das Águas e margeia o Parque Estadual Jurupará. O Juquiá também “alimenta” o Rio São Lourencinho (que cruza o Parque Estadual da Serra do Mar) e o Rio Itariri (em Miracatu).
Para o gerente de Sustentabilidade da Votorantim, David Canassa, todos
os estudos indicam que a retirada de 4,7 m3/ s causará impacto no limite da sustentabilidade da bacia do Juquiá, assim como reduzirá a geração de energia para a empresa. “Mas isso faz parte”, explica. “O múltiplo uso da água é previsto em lei”.
Quanto à possibilidade de a Sabesp vir a retirar mais água da bacia, Canassa crê que seria prudente a verificação do impacto sistêmico dessa retirada extra, não só no entorno do reservatório do França, mas ao longo de toda a cascata, até onde o Juquiá encontra-se com o Ribeira de Iguape, já próximo ao Litoral Sul do estado.
O legado
Com 782 espécies de plantas já catalogadas e uma fauna sortida, com direito a animais de topo de cadeia como onças-pardas, cachorro-vinagre e antas, no ano que vem, o Legado das Águas será aberto ao público. Abrigará atividades científicas, educacionais e de sustentabilidade.
Muita coisa já está acontecendo. Há um polo voltado para a educação ambiental em plena atividade e um viveiro em fase de desenvolvimento, que fornecerá mudas para recomposição de florestas de Mata Atlântica feitas a partir de material genético retirado de plantas nativas.
A Votorantim pretende promover pesquisas científicas e estudos em biotecnologia em parceria com universidades, além de desenvolver as cadeias produtivas locais, incluindo o ecoturismo. “Por meio de um projeto de apoio à gestão pública, vamos ajudar os municípios a se estruturarem para que cresçam junto com os empreendimentos do Legado das Águas”, informa Canassa.
Também está nos planos da empresa fornecer áreas de vegetação nativa a agricultores com déficit em suas Cotas de Reserva Ambiental (CRAs) e alugar ou arrendar até mil hectares de Reserva Legal.
A questão primordial, no entanto, é garantir que haverá água suficiente para matar a sede de São Paulo e não matar de sede esse pouco de floresta nativa restante em São Paulo.
Fonte: Envolverde
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