quinta-feira, 24 de novembro de 2016
, artigo de Rafael Loyola
O Brasil e o mundo se preocupam com o desmatamento da Amazônia e o país
se comprometeu no Acordo de Paris sobre o clima em zerar o desmatamento
ilegal até 2030. Mas, o Cerrado tem taxa de desmatamento 2,5 vezes maior
que a Amazônia e pouco se fala sobre isso. Agora, o Governo começa a
dar sinais de preocupação com a morte do Cerrado.
O Cerrado alimenta grandes rios como o São Francisco, o Amazonas, o
Parnaíba e o Araguaia e é conhecido como a caixa d’água do Brasil. A
vegetação nativa que se forma ao longo dos rios cumpre papel fundamental
na manutenção da qualidade da água, por evitar a erosão e a entrada de
terra e outros detritos no leito do corpo d’água. Estudos mostram que o
uso da água depurada pela vegetação custa cerca de 100 vezes menos que o
do tratamento da água obtida em áreas desmatadas. Com tanta água
disponível e superfícies planas, o Cerrado tem grande vocação agrícola e
sua produção alçou o Brasil à posição de segundo maior produtor de
alimento do mundo.
Entretanto, toda essa vocação agropecuária que confere ao bioma o título
de “celeiro nacional” tem um preço. Metade da área originalmente
coberta pelo Cerrado já foi transformada em algo diferente e apenas 8%
do bioma é protegido por unidades de conservação. Um complicador é a
regulamentação da Lei de proteção da vegetação nativa de 2012, o novo
Código Florestal. Na nova legislação, a necessidade de proteção da
vegetação ao longo dos rios e topos de morro diminuiu. Como resultado,
40% do que restou do Cerrado poderá ser legalmente convertido nos
próximos anos. Sob amparo legal, será possível desmatar o bioma até que
apenas cerca de 10% a 15% de sua cobertura original fosse mantida.
As soluções para a conservação do bioma interessam a todos os
brasileiros e passam pela manutenção e adoção de políticas públicas com
foco no Cerrado. Uma delas é a moratória da soja, por meio da qual a
indústria se compromete a não comercializar nem financiar o cultivo de
soja produzido em áreas que foram desmatadas. Essa política teve grande
sucesso na contenção do desmatamento da Amazônia e é muito bem-vinda
para o Cerrado, podendo tornar-se um grande pacto de desmatamento zero
no bioma. Assim como essa, outras políticas em andamento precisam de um
grande impulso para que sejam mais eficazes ou sejam mais rapidamente
implementadas. Contudo, a sinalização da possível expansão da moratória
para o Cerrado é uma notícia a ser comemorada.
*Rafael Loyola é doutor em Ecologia, diretor do Laboratório de
Biogeografia da Conservação da Universidade Federal de Goiás
(CB-Lab/UFG) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da
Natureza.
Fonte: EcoDebate
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