RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
Após 25 anos comandada por civis, a Funai (Fundação Nacional do Índio) voltará a ser presidida por um militar. O ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) nomeou nesta terça-feira (9) para o cargo, de forma interina, o general do Exército Franklimberg Ribeiro de Freitas, 61, que até janeiro era assessor de relações institucionais do CMA (Comando Militar da Amazônia), em Manaus (AM).
O último militar a presidir a Funai foi o sargento da Aeronáutica Cantídio Guerreiro, durante parte do governo Fernando Collor, de agosto de 1990 a julho de 1991. Cantídio era amigo do atual senador Romero Jucá (PMDB-RR).
Desde o início do governo Michel Temer, em maio passado, após o afastamento de Dilma Rousseff da Presidência, o general é a quarta pessoa a presidir a Funai. Não que o mandato da petista tenha sido tranquilo para o órgão, pelo contrário: num espaço de quatro anos, também houve quatro presidentes. Durante dois anos de governo Dilma, de 2013 a 2015, o órgão foi comandado por presidentes interinos.
Nos últimos cinco anos, desde abril de 2012, o general é o oitavo chefe da Funai, o que representa uma média de um presidente a cada 7 meses e meio.
Franklimberg é uma indicação do partido conservador PSC (Partido Social Cristão), presidido por um evangélico, Pastor Everaldo (RJ). Em agosto do ano passado, o PSC tentou emplacá-lo na presidência da Funai, mas não obteve sucesso e o militar acabou destinado a uma das diretorias da fundação, de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável.
Na época o PSC espalhava que o general era um indígena mura, mas o fato foi negado pelo próprio general, em entrevista à Folha, em agosto: "Não sou índio, sou de origem indígena. Minha mãe, avo e bisavó eram indígenas". Ele disse que foi consultado pelo PSC e "aceitou ter seu nome avaliado".
O general substitui outro indicado pelo PSC, Antonio Costa, que na semana passada foi exonerado. Em entrevista, ele disse que saiu por pressões e "ingerências políticas" e que o ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR), é "ministro de uma causa", em referência ao agronegócio.
Em nota, Serraglio afirmou que havia uma exigência do governo, a partir de manifestações do governo de Roraima, para que Costa agilizasse procedimentos internos na Funai a fim de permitir a construção de uma linha de energia elétrica de alta tensão que cortaria a terra indígena vaimiri atroari. A obra já foi repelida pelos indígenas, mas a Eletronorte, em consórcio com uma empreiteira, diz que vai realizar a obra, ao preço estimado em R$ 2 bilhões.
Em nota nesta terça-feira (9), a APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), maior organização indígena do país, repudiou a nomeação do general. Segundo a APIB, a nomeação do general "constitui mais uma afronta aos povos e organizações indígenas de todo o país, que durante intensas jornadas de mobilização em 2016 se posicionaram contra a indicação do militar ao cargo de presidente da instituição, não só por sua vinculação militar, mas também pelo fato de ser um indicado do PSC, agrupação reconhecidamente contrária aos direitos indígenas dentro e fora do Congresso Nacional".
Segundo a APIB, com a nomeação de Franklimberg, "o governo Temer promove a militarizaçao da Funai, como nos tempos da ditadura militar, a fragilização total do órgão e a perspectiva de mudança nos procedimentos de demarcação das terras indígenas, em favor da implementação de uma agenda neoliberal desenvolvimentista e em detrimento da autonomia e protagonismo dos nossos povos".
Para a APIB, o governo "aparelha o órgão indigenista em consonância com os propósitos do ministro da Justiça, o ruralista Osmar Serraglio, operador da agenda da expansão das fronteiras agrícolas e dos grandes empreendimentos sobre os territórios indígenas".
Em nota à imprensa, a Funai afirmou que o novo presidente "busca celeridade nos processos de demarcação de terras indígenas junto ao Ministério da Justiça". Segundo o órgão, o general participou de operações para retirada de garimpeiros da terra indígena Yanomami e da "operação logística que permitiu a demarcação da terra indígena Kayabi", entre Mato Grosso e Pará.
De acordo com a Funai, ele também chefiou o centro de operações do CMA nos anos de 2012 e 2013, "onde teve a oportunidade de coordenar diversas atividades operacionais e logísticas de coibição aos ilícitos transfronteiriços nas inúmeras terras indígenas na região amazônica, como ações de madeireiros, garimpeiros e traficantes de drogas".
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