terça-feira, 14 de novembro de 2017

Valor Econômico – Na era Trump, EUA promovem o carvão na conferência do clima

Valor Econômico – Na era Trump, EUA promovem o carvão na conferência do clima


Por Daniela Chiaretti | De Bonn

Pela primeira vez na história das conferências climáticas, os EUA não têm um pavilhão oficial no evento. O que existe, um grande iglu branco logo fora da entrada principal da CoP–23, em Bonn, na Alemanha, foi bancado pelo bilionário Michael Bloomberg, ex–prefeito de Nova York, e estruturado por organizações como o WWF e o WRI. É a materialização de um país dividido na questão climática.

A participação dos EUA na conferência (presidida por Fiji e sediada pela Alemanha) exibe dois polos opostos. A que vem sendo chamada de "delegação alternativa" tem empresários, religiosos, cientistas, senadores e governadores democratas como o californiano Jerry Brown, à frente de um Estado voltado para a economia limpa.

Na outra ponta, o único evento patrocinado por aliados do presidente Donald Trump ocorreu ontem e não podia ser mais provocador. Promovia o carvão – num evento que estimula energias renováveis – e energia nuclear, numa Alemanha que se esforça para banir este tipo de energia de sua matriz. "É um evento produzido para o público interno de Trump", disse ao Valor Alden Meyer, diretor da ONG americana UCS.

O painel "O papel de combustíveis fósseis mais eficientes e da energia nuclear na mitigação climática" ocorreu numa sala com 200 lugares. Duas horas antes, já havia mais de 300 pessoas na fila. Minutos antes dos painelistas falarem, Jay Inslee, governador do Estado de Washington, entrou na sala e dirigiu–se aos jornalistas: "Donald Trump não pode nos parar. Ele não tem autoridade constitucional para impedir que eu baixe um decreto colocando um teto para a poluição por carbono", disse.

Inslee lembrou que a US Climate Alliance, fundada no dia seguinte ao anúncio de Trump que os EUA sairiam do Acordo de Paris, tem governadores de 14 Estados e Porto Rico, mais de 400 prefeitos e mais de 2.500 cidades, Estados, empresas, instituições acadêmicas e grupos religiosos no movimento chamado "We Are Still In" (Ainda Estamos Dentro). "Se fôssemos um país, seríamos a terceira economia do mundo", disse. A governadora de Oregon, Kate Brown, também democrata, emendou: "Trump rejeita a economia do futuro. Somos o primeiro Estado que baniu a eletricidade gerada por carvão. Se você quer ampliar sua economia, foque nos empregos do futuro".

Francis Brooke, conselheiro do vice–presidente Mike Pence e moderador do painel, disse que "estamos felizes em discutir clima com qualquer um. Alguns dizem que nosso evento é provocativo. Prefiro dizer que é controverso. Queremos uma discussão honesta que proporcione segurança energética."

George David Banks, assessor especial de Trump para ambiente e energia, citou dados da Agência Internacional de Energia de que há 1.600 novas usinas de carvão em 62 países do mundo. "Quando os combustíveis fósseis serão usados, serão da forma mais limpa e eficiente possível. As renováveis têm futuro brilhante, mas dizer que é possível ter segurança energética com eólica e solar é ingênuo".

Barry K. Worthington, diretor executivo da United States Energy Association, disse que "o mundo continuará por muitos anos a usar combustíveis fósseis", que terão uma fatia não menor a 40% do mix energético global em 2050. Para ele, esse é o caminho inevitável para dar acesso a energia a mais de um bilhão de pessoas em países pobres. Nesse momento, quase toda a plateia o interrompeu e começou a cantar uma música de protesto contra o carvão.

Os jovens se retiraram, e o evento seguiu com a fala de representantes da empresa de carvão Peabody, da nuclear NuScale Power e da exportadora de gás Tellurian.

Nas discussões das regras de implementação do Acordo de Paris, os negociadores americanos, liderados até agora pelo veterano Trigg Talley, continuam seguindo os pontos que sempre foram caros aos EUA. Querem um sistema único de regras de transparência e contabilidade de emissões, que tenha flexibilidade, mas seja o mesmo para todos. Recusam a ideia de dois sistemas separados, para países desenvolvidos e em desenvolvimento. "Eles dizem que não têm nenhuma ordem de Washington e que seguem como vinham fazendo antes", diz um observador.

Em financiamento, contudo, os americanos seguem a ordem de Trump de que não haverá mais dinheiro americano para o clima. Nos próximos dias espera–se a chegada do diplomata americano Thomas Shannon para liderar os negociadores. Ele já foi embaixador dos EUA no Brasil e é subsecretário de Estado para Assuntos Políticos. "Isso pode ser bom para o Brasil", avalia um diplomata.

A jornalista viajou à CoP–23 a convite do Instituto Clima e Sociedade (ICS)

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