segunda-feira, 16 de abril de 2018

Brasília: o que mudou do projeto para o que foi implantado


Brasília: o que mudou do projeto para o que foi implantado


Por Tânia Battella


É interessante conhecer alguns detalhes da construção de Brasília, começando pelo Edital do concurso público nacional, que estabeleceu algumas condições para o projeto da  nova capital do país, que teve como  vencedor o arquiteto Lúcio Costa, com a proposta de seu plano piloto para Brasília.
O Edital para o “Concurso Nacional do Plano Piloto da Nova Capital do Brasil” foi de setembro de 1956, assinado pelo Presidente da República. Estabeleceram-se regras quanto aos possíveis participantes, a apresentação do projeto, a necessidade de ser acompanhado por informações sobre abastecimento de água, de energia elétrica, transportes  e outros ( alíneas do item 4. Do Edital). Esclareceu, também, no item 8. do Edital, que o Júri seria “presidido pelo Presidente da Cia. Urbanizadora da Nova Capital do Brasil” e seria composto por “dois representantes da CIA. Urbanizadora da Nova Capital do Brasil, um do Instituto de Arquitetura do Brasil, um do Clube de Engenharia e dois urbanistas estrangeiros.“ Estabeleceu, ainda, os prêmios para os cinco primeiros vencedores e que “desde que haja perfeito acordo entre os autores classificados em primeiro lugar e a Cia. Urbanizadora da Nova Capital do Brasil, terão aqueles a preferência para o desenvolvimento do projeto.”
Ainda na vigência do prazo para apresentação dos projetos houve informações complementares aos participantes, por parte de Israel Pinheiro e de Oscar Niemeyer, então Diretor do Departamento de Urbanismo e Arquitetura da Cia. NOVACAP. Destas, merecem destaque a que transmitiu a pré-existência de uma represa – Lago Paranoá, com cota prevista para 997, a existência do palácio presidencial e de uma hotel, com localizações desde então definidas. Outra informação predeterminada e transmitida aos concorrentes foi a do aeroporto , à  época já em construção.
Concluído o Concurso Nacional, publicado o plano piloto de Lúcio Costa como vencedor, teve início a maior proeza conhecida dos últimos séculos: a construção de uma cidade que, a partir de seu Plano Piloto, elaborado em 1956, seria transformado em realidade, em cidade com data marcada para inauguração: 21 de abril de 1960.
Muitos relatos conhecemos de pessoas que participaram dessa empreitada, mas havia a necessidade de se registrar as adequações que foram necessárias na passagem do papel para o terreno – do plano piloto para o Plano Piloto. Foi quando tivemos eu, pelo Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Secretaria de Viação e Obras SVO/GDF e  Luiz Alberto Cordeiro, pela Diretoria Técnica da TERRACAP, a iniciativa de promover esse levantamento e deixar registrado como memória para entendimentos futuros do que foi necessário alterar nessa passagem de projeto à realidade. Assim, foi elaborado o primeiro documento que , nas palavras de Lúcio Costa, promoveu-se um “check-up urbanístico”.
Assim, em 1985, através do documento denominado “Brasília – 57-85 ( do plano piloto ao Plano Piloto), elaborado por Maria Elisa Costa e  Adeildo Viegas de Lima, sob a coordenação de Lúcio Costa, autor do plano piloto de Brasília, foram registradas as primeiras e mais significativas modificações da proposta original do Conjunto Urbanístico de Brasília – CUB, no processo de desenvolvimento do projeto e implantação da cidade, que ocorreu paralelamente.
O acompanhamento de Lúcio Costa ocorreu, de fato, no período inicial, até 1966, e de 1980 a 1985, este último período mediante consultoria formalizada com contrato junto a TERRACAP para essa finalidade. Fora esses períodos, sua participação ocorreu sempre que  consultado.
Excepcionalmente, Lúcio Costa participou de um Seminário, em 1974, promovido pelo Senado Federal, por iniciativa do Senador Catete Pinheiro, então Presidente da Comissão do Distrito Federal, que legislava sobre questões do Distrito Federal, precedentemente a instalação da Câmara Legislativa do DF. Decorreram, desse Seminário os projetos das Praças de Pedestres na Plataforma Central , a fonte próxima à Torre de TV e os trevos de interligação das pistas central e locais do Eixo Rodoviário. Houve, também propostas de projetos para o Setor Comercial Norte e para um Parque Público na beira do lago, nas proximidades da Concha Acústica.
Vamos, agora, às adequações do projeto original à implantação da cidade, conforme registro no documento “ Brasília – 57 – 85 ( do plano piloto ao Plano Piloto).
A primeira delas ocorreu por sugestão de um dos membros da Comissão Julgadora, Sir. William Holford: “o conjunto da cidade deslocou-se para leste, e os lotes residenciais passaram para o outro lado do lago.”  “Assim, foi reduzido o espaço entre a cidade e a água, que poderia receber  pressões no sentido de uma ocupação indevida”.  “Suas consequências foram tornar o Eixo Rodoviário  mais arqueado e mais curto – comprimindo as faixas 01 – e dobrar a extensão do trecho oeste do Eixo Monumental, de vez que a Estação Ferroviária foi deslocada no outro sentido.” Desse movimento, os Setores Comercial e Bancário Norte ficaram em cota mais elevada. O mapa abaixo demonstra o resultado dessa modificação.


Em seguida, foi criada mais uma sequência de superquadras do lado leste, com gabarito de três pavimentos, destinados à construção de blocos residenciais econômicos. Essa faixa de superquadras, originalmente, acomodaria as Embaixadas e não tinha destinação de uso residencial.
Já a faixa proposta para “floricultura , horta e pomar” ( item 16 do relatório do plano piloto), a oeste da W3, transformou-se em casas geminadas para atendimento de urgência as famílias transferidas para Brasília, desde 1958, para a construção da cidade.
Outra demanda emergencial da época foi a de espaços para instalação de templos religiosas de diferentes seitas e de equipamentos comunitários de educação particulares. Para não comprometer os espaços destinados à rede pública, foram criados espaços nos chamados Setores de Grandes Áreas, a leste da L2 e a oeste das casas geminadas, o que deu origem as vias W4 e W5. Além do atendimento a essa demanda, esses espaços foram criados para “assegurar que a implantação residencial ao longo do Eixo Rodoviário fosse feita exatamente como previsto na proposta original, de vez que se tratava de um dos aspectos fundamentais do piloto-piloto.”
Foi, também, ampliada a zona central da cidade (que constitui a Escala Gregária), com o acréscimo dos Setores Hospitalares, de Autarquias, Tribunais e Rádio e TV, e acréscimo de área nos Setores Comerciais e Bancários.


Conforme demonstrado nas figuras acima, retiradas do documento “Brasília  57-85 ( do plano piloto ao piloto ao Plano Piloto), do papel à realidade, o projeto de Brasília recebeu adequações que, segundo o próprio autor, foram necessárias, mas receberam críticas profundas em relação ao tratamento viário que não acompanhou as alterações de uso do solo. Assunto que merece um documento a parte.
Outra crítica específica a respeito do uso do solo e em decorrência da criação dos Setores de Grandes Áreas para atendimento a demanda de ensino particular recaiu na utilização desse espaço para os estabelecimentos públicos de ensino médio do plano piloto reativa às Unidades de Vizinhança (itens 16 e 17 do relatório do plano). E a análise continua:
“visto hoje, parece inexplicável que não se tenha podido chegar na época a uma posição realista quanto às áreas necessárias para implantação das escolas classe, parque e médias de forma a localizá-las dentro das quadras e nas entrequadras como previsto no plano.”
Estas foram as adequações do plano piloto de Brasília quando do desenvolvimento do projeto que ocorreu paralelamente à implantação da cidade. Todas com as devidas justificativas e que mais tarde o próprio autor do projeto – Lúcio Costa fez registrar no documento acima citado.

Apesar disso, Lúcio Costa finaliza sua apresentação nesse trabalho concluindo que :

Valeu a pena:
 

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