Corte de emissões de gases é a única maneira garantida de alcançar a meta climática; Geoengenharia e outras tecnologias não resolverão o problema
Os países
ainda precisam reduzir suas emissões de dióxido de carbono (CO2) para alcançar a meta climática do Acordo de Paris, especialmente se tal
meta for agora 1,5 ºC em vez de 2 ºC. Depender do plantio de árvores e de
soluções tecnológicas alternativas, tais como a geoengenharia, não solucionará
o problema.
“Não
podemos depender da geoengenharia para atingir as metas do Acordo de Paris,” diz Helene Muri, pesquisadora do Programa de
Ecologia Industrial da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU).
Ela foi uma das principais autoras de um artigo recente na revista Nature Communications
que analisou diferentes projetos climáticos de geoengenharia que visam limitar
o aquecimento global.
A
temperatura média da Terra está aumentando. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas (IPCC),
da ONU, recomendou limitar este aquecimento para menos de 2 graus Celsius, e
melhor ainda se para menos de 1,5 grau. Estas metas foram estabelecidas no
Acordo de Paris de 2015, que foi ratificado por quase todas as nações.
Várias
opções em geoengenharia estão entre as soluções sendo consideradas. Elas
envolvem a interferência direta no sistema climático da Terra para impedir que
a temperatura aumente tanto quanto previsto, devido à crescente quantidade de
gases de efeito estufa na atmosfera. A geoengenharia compreende a redução dos
níveis atmosféricos de CO2 ou a redução do efeito do Sol.
Não
testado, incerto e arriscado
É possível
remover os gases de efeito estufa da atmosfera com a ajuda da tecnologia ou
capturar mais CO2 por plantar milhões de árvores? É possível refletir mais
radiação do Sol por injetar partículas na atmosfera?
“Várias
técnicas poderiam ajudar a limitar a mudança climática. Mas elas são
tecnologias não testadas, incertas e arriscadas que apresentam muitos problemas
éticos e práticos de viabilidade,” diz Helene e seus colegas.
Resumindo,
os pesquisadores dizem que nós não sabemos o suficiente sobre essas tecnologias
e suas conseqüências de uso.
Obstáculos
Por
exemplo, o plantio de árvores provoca problemas políticos graves. Muitas terras
foram desflorestadas para cultivar comida, o que limita a área que poderia ser
reflorestada. Além disso, pesquisas recentes questionam se mais áreas
florestais poderiam realmente diminuir a temperatura. Dados de simulações da
NTNU e da Universidade de Giessen mostram que a temperatura poderia na verdade
aumentar, pelo menos localmente.
Outra
proposta de mitigação é o uso de biochar, carvão vegetal colocado no solo para
armazenar carbono que escaparia para a atmosfera como CO2. Neste caso, a dúvida
é se é realmente viável tomar essa medida em uma escala suficientemente grande
para fazer a diferença. Os pesquisadores chegaram a um consenso? Não.
Que dizer
de adicionar nutrientes ao mar para estimular o fitoplâncton a seqüestrar carbono?
Essa proposta envolve fertilizar áreas do oceano que são pobres em ferro.
Porém, os efeitos colaterais poderiam ser enormes, prejudicando ciclos de
nutrientes locais e talvez até aumentando a produção de N2O, outro gás de
efeito estufa.
Nós simplesmente
não temos conhecimento suficiente ainda. Algumas soluções em potencial poderiam
até prejudicar mais do que ajudar. Os autores do artigo incentivam mais debates
e aprendizado.
NETs e
planos aéreos
Que dizer
das “tecnologias de emissão negativa”, abreviadas em inglês como NETs? As NETs
envolvem a remoção dos gases de efeito estufa da atmosfera, especificamente o
CO2. Certas técnicas propostas poderiam funcionar bem em escala global. Mas
algumas delas são caras e ainda estão em sua fase inicial, tecnologicamente
falando.
Já existem
protótipos para a captura de carbono diretamente do ar. Esta tecnologia
demonstra grande potencial, mas exigiria grande quantidade de energia e ampla
infraestrutura para aplicação em larga escala. Estimativas de custo variam de
20 a 1000 dólares por tonelada capturada de CO2. Se você considerar que os
países emitiram mais de 40 bilhões de toneladas de CO2 apenas em 2017, torna-se
claro que financiar essa tecnologia seria inviável.
Adicionar
partículas ao ar exigiria reabastecimentos regulares e provavelmente aviões ou
drones exclusivos para a tarefa. O conceito pode ser viável, mas os efeitos
colaterais não estão claros.
E assim
vai, uma grande proposta após a outra. Em resumo, estas ideias não são o
bastante, chegaram muito tarde ou são caras demais.
“Nenhuma
das técnicas propostas pode ser realisticamente implementada em escala global
nas próximas décadas. Em outras palavras, não podemos depender destas
tecnologias para contribuir significativamente em manter o aumento da temperatura
média abaixo de 2 graus Celsius, muito menos abaixo de 1,5 grau, diz o autor
Mark Lawrence, Diretor do Instituto de Estudos Avançados em Sustentabilidade
(IASS), em Potsdam, Alemanha.
Não há
substitutos para o corte de emissões
As reduções
na emissão de gases ainda poderiam salvar a meta de 2 graus do Acordo de Paris.
Mas o desafio em atingir tal meta é que a crescente população da Terra, que
também teve um aumento estável no padrão de vida, terá de diminuir a emissão
atual de gases de efeito estufa na atmosfera.
A maioria
dos cenários do IPCC incluem alguma forma de geoengenharia, em geral
reflorestamento e bioenergia, aliada à captura e armazenamento de carbono,
especialmente se o alvo for limitar o aumento de temperatura a 1,5 grau até o
fim deste século.
Os
pesquisadores deste estudo alertam contra depender de soluções ao invés de
reduzir as emissões. Caso contrário, há o perigo de ver as soluções
tecnológicas como substitutas do corte de emissões, o que elas não são.
Fonte: Universidade
Norueguesa de Ciência e Tecnologia*
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Referência:
Evaluating climate geoengineering proposals in the
context of the Paris Agreement temperature goals. Mark G. Lawrence, Stefan
Schäfer, Helene Muri, Vivian Scott, Andreas Oschlies, Naomi E. Vaughan, Olivier
Boucher, Hauke Schmidt, Jim Haywood & Jürgen Scheffran. Nature
Communications volume 9, Article number: 3734 (2018) https://www.nature.com/articles/s41467-018-05938-3
* Tradução de Ivy do Carmo, Magma Translation (magmatranslation.com)
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 18/10/2018
"Corte de emissões de gases é a única maneira
garantida de alcançar a meta climática; Geoengenharia e outras
tecnologias não resolverão o problema," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 18/10/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/10/18/corte-de-emissoes-de-gases-e-a-unica-maneira-garantida-de-alcancar-a-meta-climatica-geoengenharia-e-outras-tecnologias-nao-resolverao-o-problema/.
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