segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Folha de S. Paulo – O valor da Amazônia / Coluna / Joaquim Francisco de Carvalho


Que o governo honre compromissos de preservação

Convencionou–se chamar de serviço ambiental a regulação do clima, a oferta natural de água, a manutenção da fertilidade dos solos, a polinização das culturas etc.

Segundo o economista Bernardo Strassburg, diretor do Instituto Internacional para a Sustentabilidade e professor da PUC–Rio, graças aos serviços ambientais, a floresta amazônica vale mais se ficar em pé do que se for derrubada para dar espaço à agricultura ou à pecuária.

Alheios a isso, os empresários do agronegócio fazem tudo para que o governo flexibilize o licenciamento e afrouxe a fiscalização do Ibama, o que seria ruinoso tanto do ponto de vista ambiental como do econômico.

Pelos cálculos de Strassburg, cada hectare desmatado para a pecuária, na Amazônia, renderia no máximo R$ 100 por ano. Para o plantio de soja, a renda seria de R$ 500 a R$ 1.000 por ano. Em comparação, um hectare de floresta em pé presta serviços ambientais avaliados em R$ 3.500 por ano. No cerrado, isso chega a R$ 2.300 por ano.

Assinale–se que nesses cálculos não foi incluída a rentabilidade do turismo ecológico, tampouco a do extrativismo, isto é, do aproveitamento de matérias–primas extraídas da floresta, para uso no artesanato e na indústria farmacêutica.

Em latitudes equatoriais, os ventos empurram para o continente as nuvens formadas pela evaporação de águas do oceano Atlântico ––e as chuvas provocadas pela condensação dessas nuvens caem sobre a floresta amazônica.

Calcula–se que há mais de 600 milhões de árvores na Amazônia e, de acordo com o Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), cada árvore pode absorver do solo, em média, 3 hectolitros de água por dia. Parte dessa água volta à atmosfera por evapotranspiração.

Forma–se então sobre a floresta um volumoso caudal, que, encontrando anteparo na cordilheira dos Andes, desvia–se para as regiões centro–oeste, centro–sul e sul. É o chamado "rio voador", que alimenta o ciclo hidrológico responsável pelas chuvas e pela regulação do clima na maior parte do país.

Por conseguinte, se o governo não for capaz de conter o desmatamento da Amazônia, sobrevirão longas estações secas, com funestas consequências para a agricultura.

Segundo o climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o processo de recomposição natural da floresta é desequilibrado sob a sinergia negativa entre a agricultura e a pecuária, de um lado, e o ecossistema, do outro. Caso seja desmatada uma área superior a 25%, a floresta original se transformará em savana.

A parte brasileira da floresta amazônica tem pouco mais de 3 milhões de km2. Entre 1991 e 2000, a área desmatada para a agricultura, a pecuária e a extração de madeiras cresceu de 415 mil para 587 mil km2.

De 2000 até 2017 desmataram–se, por ano, em média, 3.000 km2. Nesse ritmo, falta pouco para que o ecossistema amazônico passe de floresta tropical a savana e, depois, a deserto.

Os sucessivos governos mostram–se incapazes de conter esse descalabro, por motivos que vão da incompetência e corrupção de agentes públicos até a cupidez e ––por que não dizer? –– e a ação corruptora de alguns conhecidos empresários da agricultura, da pecuária e da indústria madeireira.

Pelo Acordo de Paris, de 2015, o Brasil comprometeu–se a recuperar 120 mil km2 da floresta amazônica até 2030. Espera–se que o novo governo honre esse compromisso, acabe com a corrupção e seja capaz de evitar que a Amazônia se transforme numa savana.

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