por Samyra Crespo –
Nos anos 90 o primeiro dinheiro significativo para investir na
‘ambientalização’ da sociedade brasileira – criando um curso para
ativistas chamado Teoria e Práxis do Meio Ambiente – foi da União
Européia.
Não havia o euro e consegui na época, à frente do ISER, ONG
carioca, 400 mil ECUS – uma unidade de dinheiro que equivaleria hoje a
700 mil dólares. Com este dinheiro fizemos 3 turmas em três anos. E
conseguimos, pelo pioneirismo, fazer história na formação de uma geração
de ativistas. Depois, quando o dinheiro, a fundo perdido acabou, fomos
ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, o primeiro mecanismo financeiro
criado no Brasil para apoiar pequenos projetos.
Para evitar que as organizações mais poderosas se aproveitassem do
Fundo, havia um conselho paritário – governo e ambientalistas ali.
O Fundo durou 20 anos como um matchfund (dinheiro casado brasileiro e
internacional). Um milhão de dólares por ano. Depois problemas de
accountability e gestão o foram deixando como um mecanismo sem grande
importância.
Os dinheiros para o meio ambiente não eram nacionais, portanto. Eram
poucos e estavam naquela zona cinza da cooperação. Acesso limitado. Os
círculos eram de confiança, era preciso falar inglês e viajar.
Os dinheiros vinham das agências multilaterais como BID e BIRD e das
doações internacionais com a Alemanha à frente, durante muitos anos.
Antes do Fundo Amazônia e outros que se seguiram. Antes do FUNBIO
vingar. Antes do GEF e do Petrobrás Ambiental.
O Brasil esteve até o ano 2000 na rota da “cooperação internacional ”
e veio muito dinheiro para financiar o nosso “desenvolvimento”. Bem
como a ‘redemocratização ‘. Da Alemanha, da Holanda e dos Estados Unidos
– o país das fundações poderosas tipo Rockfeller, Ford Foundation e
Adubon Society para o meio ambiente matriz verde.
Os Estados Unidos, Ricardo Falcão que anda aqui pelo FB que o confirme,
investia em ‘capacitação ‘. Vou contar depois porque esse fluxo de
conhecimento e profissionalização fez muita diferença.
O Ministério do Meio Ambiente, recém criado – não tinha grana. Quem
tinha algum era o Ibama, que cá para nós era o verdadeiro Ministério.
Ser presidente do Ibama era mais importante que ser ministro. Foi assim
por anos, o Eduardo Martins que o conte.
Éramos pobrinhos. Nós e o povo da Cultura. Os menores orçamentos.
Talvez não seja coincidência que ocupamos o mesmo prédio na Esplanada.
Bastava ver os barbudos e fumantes inveterados na portaria e sabíamos ser o povo da Cultura.
Relações cordiais de primos pobres.
A relação das ONGS com o dinheiro público sempre foi crivada por contradições e conflitos ideológicos.
Se você se tornava parceiro do governo em algum projeto eles, os
técnicos – achavam que se tornavam seu patrão. E a cooptação era um
terreno pantanoso.
Eu participei da formatação do Programa Nacional da Agenda 21 e
obtive muitas vezes o apoio financeiro do MMA e do IBAMA para minhas
pesquisas.
Acho engraçado, beirando ao ridículo este atual MINISTRO???? – o
Salles falar ‘querem discutir mudança climática? O façam na academia e
não venham pedir dinheiro ao Ministério’.
Como se o Governo tivesse algum dinheiro e nós os pedintes precisássemos disputa-lo.
O dinheiro é da sociedade. É dos nossos impostos diretos e indiretos.
Só uma distorção Federal, desculpe o trocadilho, concentrou o
dinheiro na União transformando Estados e municípios em mendigos e
“clientes”.
Nosso pacto federativo está em frangalhos. Desde 1988, com a nova
constituição – que está em curso um processo brutal de descentralização
das responsabilidades sem as devidas contrapartidas financeiras. É um
desastre.
Na área ambiental essa situação é crítica. A maioria das secretarias de Meio Ambiente vive à míngua.
Os dnheiros da área ambiental, em qualquer lugar do mundo – são
recursos da sociedade, para serem aplicados em políticas públicas do
interesse dela. Mas quem fala em nome da sociedade?
As ruas?
O Parlamento?
As ONGs?
A burocracia governamental?
Follow the money… dizem os que entendem de poder e de outras coisas como corrupção, desvios etc.
Este tema – o do financiamento da conservação no Brasil é tão importante, e tão apaixonante, que voltarei a ele.
Aguardem!!!
Dizem que se não se vive a história impunemente.
No próximo post vou contar como o Greenpeace chegou ao Brasil e começou a tentar o caminho das doações individuais.
Vou contar um episódio muito divertido, do qual participei pessoalmente.
Este
texto faz parte da série sobre o ambientalismo brasileiro que venho
publicando, desde abril, no site Envolverde/Carta Capital
Samyra Crespo é cientista social, ambientalista e
pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins e coordenou
durante 20 anos o estudo “O que os Brasileiros pensam do Meio Ambiente”.
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