Pesquisas
avaliam que a população dessas localidades sofre com os efeitos a médio
e longo prazos da devastação causada por este setor econômico
Os reflexos do setor minerário de carvão em municípios brasileiros
têm apontado que os efeitos no desenvolvimento destas cidades na
realidade do dia a dia estão longe da ‘imagem próspera’ destacada quando
os empreendimentos são instalados, ficam em operação e deixam um
passivo socioambiental após sua vida útil.
O Índice de Desenvolvimento Humano municipal (IDH-M), que compara indicadores sobre a oportunidade de viver uma vida longa e saudável, de ter acesso ao conhecimento e um padrão de vida que garanta as necessidades básicas, representadas pela saúde, educação e renda, revela quadros desoladores quanto ao bem-estar destas populações. Pesquisas apontam que as desigualdades desde a distribuição de ganho a acesso à infraestrutura afloram e se acentuam ao longo e médio prazos.
O estado do Rio Grande do Sul, onde ficam concentradas 90% das minas de carvão mineral no país, traz exemplos destes desequilíbrios socioeconômicos. A exploração vem de longa data, desde 1792, como esclarece Caio dos Santos, pesquisador do Observatório dos Conflitos do Extremo Sul do Brasil, ligado à Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Segundo ele, entre os municípios carboníferos que refletem os efeitos deste processo minerário estão Butiá, cujo IDH é de 0689, que deixa o município em 357º no ranking do IDH-M no RS, e Arroio dos Ratos e Candiota, ambos, com 0698, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010. O IDH brasileiro, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), é de 0,761 (2018). Quanto mais próximo de zero, o IDH é mais baixo.
De acordo com Santos, Butiá recebeu a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) em 2018, na ordem de R$ 1,478 milhão; Arroio dos Ratos, R$ 1,242 milhão, e Candiota, de R$ 1,335 milhão. O pesquisador explica que esta arrecadação, no entanto, não os torna municípios mais desenvolvidos, no estrito senso da palavra.
Uma combinação de fatores compromete a qualidade de vida destas populações. Parte delas tem de conviver com os efeitos de detonações que abalam estruturas dos imóveis muitas vezes rudimentares, alagamentos, mau cheiro em localidades ainda sem infraestrutura de água e esgoto, viária e de moradia, como é o caso da Vila São José, região periférica de Butiá, na qual vivem 5 mil famílias. Mais um ponto é a questão da flutuação de moradores, tendo em vista, os desempregos, após a finalização das plantas, que impactam na economia dos municípios.
Na área rural, o solo, ar e água contaminados por enxofre e outras dezenas de substâncias completam um quadro devastador, como descrito na reportagem “O Rastro da Miséria da Mineração no RS, de Gilson Camargo, do jornal Extra Classe, em julho deste ano. Nesta região, atua a empresa Copelmi que anunciou que deverá encerrar as atividades da mina em janeiro de 2020. Entretanto, é importante frisar que o passivo socioambiental deverá ser acompanhado e monitorado por décadas.
Efeitos socioambientais
Historicamente no Brasil, por onde a mineração de diferentes matérias-primas passa, deixa cavas enormes e desestruturação do solo, devido à compactação de rejeitos e liquefação, e agride de tal forma a vegetação e recursos hídricos, que é difícil ter noção de como era aquela paisagem anteriormente.
Os biomas sofrem impactos sucessivos e a regeneração, por muitas vezes, é difícil. Isto, sem falar em desastres, como os que ocorreram com as usinas de rejeito de mineração da Samarco (controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton), em Bento Rodrigues, Mariana (2015) e Brumadinho (2019), da Vale, em MG, resultando em cerca de 300 pessoas mortas, além de animais, e centenas de famílias desalojadas e que aguardam indenizações. Estes fatos trouxeram, com mais rigor, este tema para a pauta da imprensa, com um agravante: os impactos psicológicos e emocionais que afetam a maioria dos atingidos é algo imensurável.
Consulta prévia a povos indígenas e tradicionais
Um outro aspecto importante se refere às comunidades do entorno, em especial indígenas e tradicionais, que também podem ser afetadas e precisam ser consultadas previamente, neste processo de prospecção de grandes empreendimentos. Por muitas vezes, isto não ocorre. Este é o caso atual do projeto da Mina Guaíba, também da empresa Copelmi, entre os municípios de Eldorado e Charqueadas, que se encontra em fase de análise do licenciamento prévio ambiental, na Fundação Estadual de Proteção Ambiental Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (FEPAM), no RS.
No mês de outubro, foi dada entrada a duas Ações Civis Públicas pelo Instituto Internacional Arayara, pela Associação Indígena Poty Guarani e pela Colônia de Pescadores Z5 nas Justiças Federal e Federal, na Comarca de Porto Alegre, que pedem a suspensão imediata deste processo de licenciamento. A iniciativa tem o apoio da 350.org e do Observatório do Carvão Mineral.
Recentemente Pedro Nicolau Moura Sacco, procurador do Ministério Público Federal, deu um parecer favorável à suspensão imediata. Como principal argumento expõe o desrespeito à obrigatoriedade da consulta livre, prévia e informada a comunidades indígenas e tradicionais, de acordo com a Convenção Internacional do Trabalho (OIT) 169 ratificada no Brasil. Desde o início deste ano, este projeto da mina é objeto de um inquérito civil aberto, no Núcleo das Comunidades Indígenas, Minorias Étnicas e Educação da Procuradoria da República no estado do RS.
“O parecer do MPF reforça o que temos denunciado sobre a Mina Guaíba: A legislação não foi respeitada. Isso por si só já seria uma condicionante para anulação total do processo de licenciamento ambiental. Mas para além disso, o próprio EIA/RIMA que a empresa apresentou, contém inúmeras falhas e omissões graves, com isso, esperamos que a FEPAM que tem em seu quadro de analistas profissionais gabaritados, não conceda nenhuma licença à empresa. Até porque estas falhas e omissões estão sendo questionadas em outras Ações Civis Públicas, que em breve traremos a público”, afirma Renan Andrade Pereira, organizador do Programa Fé, Paz e Clima da 350.org, no Brasil.
Ele ainda destaca que já se deparou com inúmeros casos similares ao do RS, em sua carreira. “Nasci em Minas Gerais e tive a oportunidade de percorrer o Brasil acompanhando crimes ambientais e conhecendo comunidades atingidas por este setor. Infelizmente estou acostumado a ver como funcionam as mineradoras. A história é sempre a mesma, eles prometem emprego, qualidade de vida, mas eles trabalham é com um tripé nada sustentável: violação dos direitos humanos; dos direitos ambientais e dos direitos trabalhistas. É desse jeito em Minas Gerais, em Santa Catarina, no Maranhão, no Espírito Santo ou no Piauí. No Rio Grande do Sul não poderia ser diferente, haja vista como a empresa quer licenciar o empreendimento, violando direitos antes mesmo de começar a operar”, diz Pereira.
Rejeição à mineração em plano diretor
Mas apesar da forte pressão da mineração de carvão no RS, alguns municípios têm rejeitado este setor econômico, por meio da legislação, como é o caso de São José do Norte, que em maio deste ano, em lei complementar municipal em seu plano diretor, definiu:
(…Ficam, também, proibidas atividades de mineração de porte médio, porte grande e porte excepcional para todos os tipos de mineração, em todas as zonas do Município. Ficam proibidos todos os portes para lavra de minério metálico (cobertura/ouro/chumbo/etc.) a céu aberto e com recuperação de área degradada (CODRAM 530,03). Conforme os portes estabelecidos pela Resolução 372/2018, do Conselho Estadual do Meio Ambiente -CONSEMA do Rio Grande do Sul…)
A pressão da sociedade foi importante neste caso, por meio do movimento popular “Não queremos mineração em São José do Norte”.
Desafios impostos pela pressão do setor mineral
Mas o problema desta agenda se torna cada vez mais complexo, já que no RS, há cerca de 170 projetos de novas plantas de mineração. A esperança do aquecimento com novos empregos novamente reacende no Sindicato de trabalhadores da categoria, mas o histórico demonstra que os processos têm desfechos inversos. O atual Plano Estadual de Mineração (PEM) do RS gera um alerta à sociedade: qual é o custo-benefício de se investir neste tipo de combustível fóssil? Como aponta Rualdo Menegat, professor do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Por onde passam estes empreendimentos minerários, promessas de mais geração de empregos e desenvolvimento econômico local são expostos, gerando expectativas. Mas o que se observa é que ao longo dos anos, o desemprego, problemas de saúde, desarranjos sociais começam a desenhar um quadro reverso. Estima-se que até os anos 90, havia na casa de 8 mil trabalhadores na mineração de Butiá e Arroio dos Ratos, entre outras localidades da região. Hoje seriam cerca de 400 na ativa, sendo que 280 da planta de Butiá deverão ser dispensados no ano que vem.
Pesquisas pelo Brasil
A preocupação com este tema tem atraído pesquisas pelo Brasil. No artigo “A Questão Mineral e os Índices do IDH-M e desigualdade (GINI) nos estados do Pará e Minas Gerais: uma abordagem comparativa, a engenheira civil Loyslene de Freitas Mota e Tiago Soares Barcelos, Doutor em Geografia Humana, reforçam a constatação da desigualdade.
Segundo os pesquisadores, ao analisar dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Datasus, evidenciaram que mesmo o Estado do Pará arrecadando mais recursos da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), possui em termos absolutos piores índices que os municípios de Minas Gerais.
E relatam – ‘Percebe-se ao longo do trabalho que aos municípios que os IDHM mais elevados nem sempre são acompanhados por melhoras nos índices de desigualdade (GINI). Por fim, observou-se que a atividade minerária não vem apresentando melhoras significativas para as populações do seu entorno, apresentando alta externalidade negativa e criando uma economia de enclave que este setor apresenta nos municípios estudados. Torna-se assim, de fundamental importância um debate amplo sobre qual modelo mineral atende os anseios da sociedade brasileira´. A publicação foi veiculada na Gestão e Desenvolvimento em Revista, de julho-dezembro de 2018.
Heloísa Pinna Bernardo, doutora em Contabilidade e mestra em Controladoria e Contabilidade, também destaca em artigo, no ano de 2018, a contraposição quanto ao argumento que atesta que mineração facilita desenvolvimento local, em cidades de Minas Gerais.
Como base de dados, a pesquisadora utilizou além dos dados do IBGE, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, porte do município e o Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal (IFDM), que analisa municípios brasileiros, e do Departamento Nacional de Produção Mineral (CNPM) para a CFEM. Entre as principais constatações, avaliou que a geração de subempregos, a má distribuição de renda e taxas de crescimento das regiões de base mineral são inferiores às das regiões nas quais a mineração é inexpressiva.
Uma das campanhas que desenvolve com os parceiros Arayara e COESUS atualmente é contra a exploração minerária e utilização do carvão para geração de energia, no Rio Grande do Sul. Essa iniciativa é ampliada como ONG integrante do Observatório do Carvão Mineral , junto com Arayara, COESUS, ICS e Rede Guarani, além de representantes da sociedade civil.
As ações são multidisciplinares, já que ao mesmo tempo, a 350.org age em defesa de comunidades indígenas e de outras comunidades tradicionais, que são afetadas por estes empreendimentos carboníferos, por meio do Programa 350 Indígenas e vem reforçando seu posicionamento em defesa destas famílias por meio da campanha Defensores do Clima. E do Programa Fé, Paz e Clima.
Sucena Shkrada Resk – jornalista ambiental, especialista em política internacional, e meio ambiente e sociedade, é digital organizer da 350.org, no Brasil
O Índice de Desenvolvimento Humano municipal (IDH-M), que compara indicadores sobre a oportunidade de viver uma vida longa e saudável, de ter acesso ao conhecimento e um padrão de vida que garanta as necessidades básicas, representadas pela saúde, educação e renda, revela quadros desoladores quanto ao bem-estar destas populações. Pesquisas apontam que as desigualdades desde a distribuição de ganho a acesso à infraestrutura afloram e se acentuam ao longo e médio prazos.
O estado do Rio Grande do Sul, onde ficam concentradas 90% das minas de carvão mineral no país, traz exemplos destes desequilíbrios socioeconômicos. A exploração vem de longa data, desde 1792, como esclarece Caio dos Santos, pesquisador do Observatório dos Conflitos do Extremo Sul do Brasil, ligado à Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Segundo ele, entre os municípios carboníferos que refletem os efeitos deste processo minerário estão Butiá, cujo IDH é de 0689, que deixa o município em 357º no ranking do IDH-M no RS, e Arroio dos Ratos e Candiota, ambos, com 0698, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010. O IDH brasileiro, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), é de 0,761 (2018). Quanto mais próximo de zero, o IDH é mais baixo.
De acordo com Santos, Butiá recebeu a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) em 2018, na ordem de R$ 1,478 milhão; Arroio dos Ratos, R$ 1,242 milhão, e Candiota, de R$ 1,335 milhão. O pesquisador explica que esta arrecadação, no entanto, não os torna municípios mais desenvolvidos, no estrito senso da palavra.
Uma combinação de fatores compromete a qualidade de vida destas populações. Parte delas tem de conviver com os efeitos de detonações que abalam estruturas dos imóveis muitas vezes rudimentares, alagamentos, mau cheiro em localidades ainda sem infraestrutura de água e esgoto, viária e de moradia, como é o caso da Vila São José, região periférica de Butiá, na qual vivem 5 mil famílias. Mais um ponto é a questão da flutuação de moradores, tendo em vista, os desempregos, após a finalização das plantas, que impactam na economia dos municípios.
Na área rural, o solo, ar e água contaminados por enxofre e outras dezenas de substâncias completam um quadro devastador, como descrito na reportagem “O Rastro da Miséria da Mineração no RS, de Gilson Camargo, do jornal Extra Classe, em julho deste ano. Nesta região, atua a empresa Copelmi que anunciou que deverá encerrar as atividades da mina em janeiro de 2020. Entretanto, é importante frisar que o passivo socioambiental deverá ser acompanhado e monitorado por décadas.
Efeitos socioambientais
Historicamente no Brasil, por onde a mineração de diferentes matérias-primas passa, deixa cavas enormes e desestruturação do solo, devido à compactação de rejeitos e liquefação, e agride de tal forma a vegetação e recursos hídricos, que é difícil ter noção de como era aquela paisagem anteriormente.
Os biomas sofrem impactos sucessivos e a regeneração, por muitas vezes, é difícil. Isto, sem falar em desastres, como os que ocorreram com as usinas de rejeito de mineração da Samarco (controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton), em Bento Rodrigues, Mariana (2015) e Brumadinho (2019), da Vale, em MG, resultando em cerca de 300 pessoas mortas, além de animais, e centenas de famílias desalojadas e que aguardam indenizações. Estes fatos trouxeram, com mais rigor, este tema para a pauta da imprensa, com um agravante: os impactos psicológicos e emocionais que afetam a maioria dos atingidos é algo imensurável.
Consulta prévia a povos indígenas e tradicionais
Um outro aspecto importante se refere às comunidades do entorno, em especial indígenas e tradicionais, que também podem ser afetadas e precisam ser consultadas previamente, neste processo de prospecção de grandes empreendimentos. Por muitas vezes, isto não ocorre. Este é o caso atual do projeto da Mina Guaíba, também da empresa Copelmi, entre os municípios de Eldorado e Charqueadas, que se encontra em fase de análise do licenciamento prévio ambiental, na Fundação Estadual de Proteção Ambiental Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (FEPAM), no RS.
No mês de outubro, foi dada entrada a duas Ações Civis Públicas pelo Instituto Internacional Arayara, pela Associação Indígena Poty Guarani e pela Colônia de Pescadores Z5 nas Justiças Federal e Federal, na Comarca de Porto Alegre, que pedem a suspensão imediata deste processo de licenciamento. A iniciativa tem o apoio da 350.org e do Observatório do Carvão Mineral.
Recentemente Pedro Nicolau Moura Sacco, procurador do Ministério Público Federal, deu um parecer favorável à suspensão imediata. Como principal argumento expõe o desrespeito à obrigatoriedade da consulta livre, prévia e informada a comunidades indígenas e tradicionais, de acordo com a Convenção Internacional do Trabalho (OIT) 169 ratificada no Brasil. Desde o início deste ano, este projeto da mina é objeto de um inquérito civil aberto, no Núcleo das Comunidades Indígenas, Minorias Étnicas e Educação da Procuradoria da República no estado do RS.
“O parecer do MPF reforça o que temos denunciado sobre a Mina Guaíba: A legislação não foi respeitada. Isso por si só já seria uma condicionante para anulação total do processo de licenciamento ambiental. Mas para além disso, o próprio EIA/RIMA que a empresa apresentou, contém inúmeras falhas e omissões graves, com isso, esperamos que a FEPAM que tem em seu quadro de analistas profissionais gabaritados, não conceda nenhuma licença à empresa. Até porque estas falhas e omissões estão sendo questionadas em outras Ações Civis Públicas, que em breve traremos a público”, afirma Renan Andrade Pereira, organizador do Programa Fé, Paz e Clima da 350.org, no Brasil.
Ele ainda destaca que já se deparou com inúmeros casos similares ao do RS, em sua carreira. “Nasci em Minas Gerais e tive a oportunidade de percorrer o Brasil acompanhando crimes ambientais e conhecendo comunidades atingidas por este setor. Infelizmente estou acostumado a ver como funcionam as mineradoras. A história é sempre a mesma, eles prometem emprego, qualidade de vida, mas eles trabalham é com um tripé nada sustentável: violação dos direitos humanos; dos direitos ambientais e dos direitos trabalhistas. É desse jeito em Minas Gerais, em Santa Catarina, no Maranhão, no Espírito Santo ou no Piauí. No Rio Grande do Sul não poderia ser diferente, haja vista como a empresa quer licenciar o empreendimento, violando direitos antes mesmo de começar a operar”, diz Pereira.
Rejeição à mineração em plano diretor
Mas apesar da forte pressão da mineração de carvão no RS, alguns municípios têm rejeitado este setor econômico, por meio da legislação, como é o caso de São José do Norte, que em maio deste ano, em lei complementar municipal em seu plano diretor, definiu:
(…Ficam, também, proibidas atividades de mineração de porte médio, porte grande e porte excepcional para todos os tipos de mineração, em todas as zonas do Município. Ficam proibidos todos os portes para lavra de minério metálico (cobertura/ouro/chumbo/etc.) a céu aberto e com recuperação de área degradada (CODRAM 530,03). Conforme os portes estabelecidos pela Resolução 372/2018, do Conselho Estadual do Meio Ambiente -CONSEMA do Rio Grande do Sul…)
A pressão da sociedade foi importante neste caso, por meio do movimento popular “Não queremos mineração em São José do Norte”.
Desafios impostos pela pressão do setor mineral
Mas o problema desta agenda se torna cada vez mais complexo, já que no RS, há cerca de 170 projetos de novas plantas de mineração. A esperança do aquecimento com novos empregos novamente reacende no Sindicato de trabalhadores da categoria, mas o histórico demonstra que os processos têm desfechos inversos. O atual Plano Estadual de Mineração (PEM) do RS gera um alerta à sociedade: qual é o custo-benefício de se investir neste tipo de combustível fóssil? Como aponta Rualdo Menegat, professor do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Por onde passam estes empreendimentos minerários, promessas de mais geração de empregos e desenvolvimento econômico local são expostos, gerando expectativas. Mas o que se observa é que ao longo dos anos, o desemprego, problemas de saúde, desarranjos sociais começam a desenhar um quadro reverso. Estima-se que até os anos 90, havia na casa de 8 mil trabalhadores na mineração de Butiá e Arroio dos Ratos, entre outras localidades da região. Hoje seriam cerca de 400 na ativa, sendo que 280 da planta de Butiá deverão ser dispensados no ano que vem.
Pesquisas pelo Brasil
A preocupação com este tema tem atraído pesquisas pelo Brasil. No artigo “A Questão Mineral e os Índices do IDH-M e desigualdade (GINI) nos estados do Pará e Minas Gerais: uma abordagem comparativa, a engenheira civil Loyslene de Freitas Mota e Tiago Soares Barcelos, Doutor em Geografia Humana, reforçam a constatação da desigualdade.
Segundo os pesquisadores, ao analisar dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Datasus, evidenciaram que mesmo o Estado do Pará arrecadando mais recursos da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), possui em termos absolutos piores índices que os municípios de Minas Gerais.
E relatam – ‘Percebe-se ao longo do trabalho que aos municípios que os IDHM mais elevados nem sempre são acompanhados por melhoras nos índices de desigualdade (GINI). Por fim, observou-se que a atividade minerária não vem apresentando melhoras significativas para as populações do seu entorno, apresentando alta externalidade negativa e criando uma economia de enclave que este setor apresenta nos municípios estudados. Torna-se assim, de fundamental importância um debate amplo sobre qual modelo mineral atende os anseios da sociedade brasileira´. A publicação foi veiculada na Gestão e Desenvolvimento em Revista, de julho-dezembro de 2018.
Heloísa Pinna Bernardo, doutora em Contabilidade e mestra em Controladoria e Contabilidade, também destaca em artigo, no ano de 2018, a contraposição quanto ao argumento que atesta que mineração facilita desenvolvimento local, em cidades de Minas Gerais.
Como base de dados, a pesquisadora utilizou além dos dados do IBGE, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, porte do município e o Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal (IFDM), que analisa municípios brasileiros, e do Departamento Nacional de Produção Mineral (CNPM) para a CFEM. Entre as principais constatações, avaliou que a geração de subempregos, a má distribuição de renda e taxas de crescimento das regiões de base mineral são inferiores às das regiões nas quais a mineração é inexpressiva.
Sobre a 350.org e o carvão
A 350.org é um movimento global de pessoas que trabalham para acabar com a era dos combustíveis fósseis e construir um mundo de energias renováveis e livres, lideradas pela comunidade e acessíveis a todos. Nossas ações vêm ao encontro de medidas que visem inibir a aceleração das mudanças climáticas pela ação humana, que incluem a manutenção das florestas.Uma das campanhas que desenvolve com os parceiros Arayara e COESUS atualmente é contra a exploração minerária e utilização do carvão para geração de energia, no Rio Grande do Sul. Essa iniciativa é ampliada como ONG integrante do Observatório do Carvão Mineral , junto com Arayara, COESUS, ICS e Rede Guarani, além de representantes da sociedade civil.
As ações são multidisciplinares, já que ao mesmo tempo, a 350.org age em defesa de comunidades indígenas e de outras comunidades tradicionais, que são afetadas por estes empreendimentos carboníferos, por meio do Programa 350 Indígenas e vem reforçando seu posicionamento em defesa destas famílias por meio da campanha Defensores do Clima. E do Programa Fé, Paz e Clima.
Sucena Shkrada Resk – jornalista ambiental, especialista em política internacional, e meio ambiente e sociedade, é digital organizer da 350.org, no Brasil