sábado, 7 de agosto de 2021

PF deflagra operação para investigar mortes de onças-pintadas (uma delas, monitorada) por envenenamento, no Pantanal, MS

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PF deflagra operação para investigar mortes de onças-pintadas (uma delas, monitorada) por envenenamento, no Pantanal, MS

PF deflagra operação para investigar mortes de onças-pintadas (uma delas, monitorada) por envenenamento, no Pantanal, MS

Em 10 de maio, os pesquisadores da organização Instituto Reprocon – Reproduction 4 Conservation. que atua no sul do Pantanal, estranharam o registro da localização de uma das onças-pintadas que monitoravam, desde setembro do ano passado: o macho batizado por eles como Sandro, de 4 anos e 120 kg.

O sinal emitido por seu colar de radiotelemetria indicava mortalidade. Quando isso acontece, significa que o GPS está parado no mesmo local por muito tempo e, neste caso, os pesquisadores trabalham com base em duas hipóteses: o animal está parado mesmo – e pode ter morrido – ou o colar se soltou de seu corpo.

A falta de recursos impediu que eles fossem ao local rapidamente, o que só ocorreu três dias depois e foi possível graças ao colar de GPS. Chegando na região do Passo do Lontra, em CorumbáMato Grosso do Sul, não só encontraram Sandro, como mais uma onça-pintada (um macho, de 140 kg, que foi batizado pelos pesquisadores como Taurus), um gavião carcará, um cachorro do mato, uma vaca e 14 urubus. No total, 19 animais, todos mortos.

Assim, as primeiras suspeitas – levantadas pelos pesquisadores, na ocasião – apontavam para envenenamento provocado por seres humanos. A desconfiança veio da situação em que os animais foram encontrados e do fato de que nenhum deles apresentava qualquer marca de violência, briga ou tiro. Mas também porque é sabido que, na região, há fazendeiros que matam as onças que atacam seu gado.

“Devido às circunstâncias dos animais, suspeitamos que tenham sido envenenados”, explica Antonio Carlos Csermak Jr., veterinário do Reprocon e um dos pesquisadores que os encontrou.

“Acreditamos que a vaca – que estava envenenada – tenha sido abatida por uma das onças. Em geral, a onça preda um animal e volta para comê-lo por um, dois ou três dias. Outras onças podem acessar a mesma carcaça. Neste caso, todos os animais que se alimentaram da vaca morreram. Os urubus estavam ao lado dela, o carcará também. O cachorro do mato a 10 metros, Sandro a 50 metros. A outra onça – que foi a primeira que encontramos – a 150 metros”. E ainda havia insetos na carcaça da vaca, também mortos.

Csermak ainda acrescenta: “Pessoas da região disseram que pode ter sido usado um agrotóxico cujo princípio ativo é o carbofurano, que está proibido no Brasil desde 2017“. Pode ser contrabandeado da Bolívia ou do Paraguai.

A morte por envenenamento é muito rápida, mas depende do tamanho do animal. Por isso, certamente, os urubus e o carcará – que são leves e têm metabolismo rápido -, estavam mais próximos da vaca.

O corpo de Sandro em decomposição. Perda irreparável para o Pantanal e os pesquisadores
Foto: Jocilany Giuleatte
/Reproducao do Facebook
Sandro, uma onça-pintada jovem, de 4 anos, que pesava mais de 120 quilo, era monitorada desde setembro pelos pesquisadores do Reprocon / Foto: Pedro Nacib Jorge Neto

A investigação avança

Depois de encontrar os animais mortos, os pesquisadores voltaram à sede da Reprocon e denunciaram o caso à Polícia Federal (PF) e ao Ibama.

Como os pesquisadores encontraram duas onças mortas próximas uma da outra e numa mesma região, a PF solicitou que eles os acompanhassem até o local com dois peritos e dois fiscais do Ibama. No dia da pericia os pesquisadores deram apoio técnico aos dois órgãos e seguiram os rastros de Sandro até a morte, 600 metros da margem do rio.

Devido às provas circunstanciais, o Ibama autuou e multou o arrendatário da fazenda onde ocorreram as mortes. De acordo com Csermak, a multa foi calculada em função das espécies mortas: R$ 5 mil reais por cada onça (por serem de espécie ameaçada) e R$ 500 por cada um dos demais. O total foi de R$ 18.500.

E a PF abriu inquérito com base em tudo que viu no local, nas declarações dos pesquisadores e no material colhido na perícia. “Os Policiais Federais realizaram diligências preliminares na propriedade rural, sendo realizados exames periciais de local e coleta de material com a finalidade de determinar as causas das mortes dos animais”, declarou o órgão, em nota.

“Se o resultados dos exames laboratoriais provarem que houve envenenamento, aí o responsável terá que responder criminalmente”, salientou Csermak.

Ontem, 4 de agosto, finalmente, a Polícia Federal deu notícias, e as investigações estão em curso.

Quase três meses depois a PF cumpriu quatro mandados de busca e apreensão – três em fazendas do Pantanal, na região de Corumbá, e um em Campo Grande, todas no Mato Grosso do Sul -, que integram a Operação Yaguareté, deflagrada para o caso,

Yaguareté ou Jaguareté, em Guarani, quer dizer onça-pintada.

Menos um crime invisível

As cabeças de Taurus (nome dado pelos pesquisadores ao encontra-lo) e de Sandro e o radio-colar que este usava e garantiu que eles fossem encontrados e o crime investigado pela Polícia Federal / Foto: Pedro Nacib Jorge Neto/Instituto Reprocon

Como Csermak contou, acima, o abate de onças por fazendeiros não é incomum devido aos ataques ao gado, que causam prejuízos. Mas, ele contou também que, até acontecer este crime, havia apenas rumores de que os animais eram envenenados. Tratava-se, portanto, de um crime invisível.

Se Sandro não estivesse usando um colar de GPS e sendo monitorado diariamente pelo Reprocon, este seria mais um crime contra animais silvestres e ameaçados de extinção, que ficaria no ar, sem investigação.

Graças ao trabalho de pesquisa cientifica, o caso da morte das onças-pintadas virou noticia e se espalhou como um alerta para fazendeiros que adotam tal recurso como solução para acabar com os ataques das onças.

Mas Csermak esclarece que essa conduta não é adotada pela maioria dos pecuaristas da região, que conhece e apoia projetos de conservação no Pantanal.

“Eles são nossos parceiros. O colar de monitoramento do Sandro, por exemplo, foi doado por um deles. E foi graças a esse colar que chegamos até o Sandro, que soubemos de seu paradeiro e a investigação está sendo possível”.

E acrescentou: “Muito importante que o assunto esteja sendo divulgado pela mídia para que aqueles que matam onças-pintadas saibam que podem ser rastreados”.

Campanha: mais colares para as onças!

Reprocon é um instituto idealizado e mantido por pesquisadores, que monitora e estuda o comportamento e a reprodução da onça-pintada (Panthera onca) em área livre através de colares de radiotelemetria e GPS

Trabalha com recursos próprios e doações esporádicas e depende de novos apoios porque os custos são altos e é imprescindível aumentar a proteção desses e de outros animais silvestres que vivem no sul do Pantanal.

Por isso, em alguns momentos, a organização lança campanhas de arrecadação de recursos, como a que está ativa na plataforma Kickante. A meta é arrecadar R$ 28 mil reais para a compra de material de monitoramento. Até agora, foram doados R$ 16.785, portanto falta 60% dos recursos almejados e apenas 44 dias para o término da campanha.

Os valores indicados variam de R$ 20 (o doador recebe e-mail de agradecimento com selo) a R$ 15 mil (o preço de um colar; dá direito a uma saída a campo com um acompanhante e a equipe do Reprocon) ou R$ 25 mil (saída a campo com dois acompanhantes e hospedagem incluída).

Quando Sandro morreu, havia três onças-pintadas monitoradas com colares de GPS pela Reprocon. Agora, só tem uma. É imprescindível ampliar esse trabalho para a preservação.

Em seu Facebook, o Reprocon publicou um infográfico animado que mostra os trajetos percorridos por Sandro no último mês, antes de morrer. Ele percorria uma área de cerca de 100 km2. Clique aqui para assistir.

Siga o Reprocon nas redes sociais – Facebook e Instagram – para acompanhar suas ações e o monitoramento dos animais. E também sobre o crime contra Sandro e outros 18 animais do Pantanal.

Foto: Gustavo Fonseca/Instituto Reprocon

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