(O Globo) Depois de uma rebelião da base aliada e com risco de ser derrotado, o governo
precisou pedir que o Senado adiasse a votação da Medida Provisória 655, que
endurece as regras para o pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial.
Seria a primeira medida do ajuste fiscal analisada pelo Senado este ano. A
votação ficou para a próxima terça-feira e a expectativa é que até lá o governo
negocie com senadores para conseguir uma maioria segura para a votação. O
Palácio do Planalto foi informado de que havia risco de derrota, já que o
governo teria apenas de três votos a cinco votos de vantagem. O adiamento vai
dar ao governo e aos líderes tempo para achar uma saída que evite uma derrota da
presidente Dilma Rousseff em um dos pilares do ajuste fiscal.
O líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), articula junto ao
governo um recuo em relação ao abono salarial. Se for confirmada a existência de
inconstitucionalidades na proposta, a melhor saída seria o veto do trecho que
trata do benefício e a discussão de uma alternativa. Segundo a equipe econômica,
a mudança levaria a uma perda de R$ 7 bilhões dentro do ajuste fiscal.
Desde
cedo, o presidente do Senado, Renan Calheiros, hoje um dos maiores críticos do
governo, havia avisado que havia risco de derrota. — Esse processo de formação das maiorias é muito complicado no Brasil. A
gente nunca sabe direito o que é que vai acontecer. Tem que aguardar — disse o
presidente do Senado.
Renan voltou a criticar abertamente a presidente Dilma, ao afirmar que o
Brasil prometido na campanha não se tornou realidade. — Vamos fazer tudo que garanta o equilíbrio fiscal. O que lamentamos, e
lamentamos muito, é que aquele Brasil de 2014, que era projetado, anunciado, era
apenas um Brasil para a campanha eleitoral. Estamos vivendo a dura realidade de
ajustarmos o Pacto Federativo — disse Renan.
Para corroborar a tensão, um grupo de 11 senadores, formado por senadores da
base aliada e da oposição, anunciou que votaria contra a medida. Dois deles são
do PT, um do PMDB, um do PDT, um do PRB e um do PSD, partidos da base aliada. Os
outros são do PSB e do PSOL. Eles lançaram um manifesto contra o ajuste fiscal,
assinado inclusive por ex-ministros do governos Lula e por entidades como CUT e
MST. O senadores disseram que não se tratava de uma rebelião, mas avisaram que
votariam contra a MP 665.
A sessão começou em clima tenso. Sindicalistas da Força Sindical vaiaram
senadores do PT e jogaram notas falsas de dólar no plenário. Renan mandou
esvaziar as galerias. Durante todo o dia, Delcídio conversou com aliados e detectou as
resistências. Sondado sobre a hipótese de retirar o trecho sobre abono salarial
ontem mesmo, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, não aceitou um
acordo. O vice-presidente Michel Temer, articulador político do governo, também
foi informado da negociação.
A proposta defendida por Delcídio é voltar à regra antiga, que previa que
teria direito ao benefício o trabalhador que recebe até dois salários mínimos e
trabalha por pelo menos 30 dias no ano no emprego. O abono tem o valor de um
salário mínimo e é pago uma vez por ano. O texto da MP aprovado na Câmara
restringia o acesso ao benefício, determinando que o funcionário teria que
trabalhar por pelo menos três meses para ter direito ao benefício e este
passaria a ser pago de forma proporcional ao número de meses trabalhados. O
governo queria inicialmente um prazo de carência de seis meses.
Apesar de ter pedido o adiamento, o governo tem pressa. A MP 665 perde a
validade em 1º de junho. Em 2013, as despesas com abono salarial e seguro
desemprego somaram R$ 31,9 bilhões e R$ 14,7 bilhões, respectivamente. Delcídio
disse que recebeu de vários senadores a informação de que há pareceres jurídicos
apontando que é inconstitucional pagar um abono inferior ao um salário
mínimo.Vários senadores disseram que o texto é inconstitucional quanto ao valor do
abono ser inferior a um salário mínimo. Então, me comprometi a conversar com o
governo. Se o entendimento for de que há inconstitucionalidade, trabalharemos
pelo veto. E há argumentos legítimos (quanto à inconstitucionalidade) — disse
Delcídio.
O governo ainda sofreu outro revés ontem. O relator do projeto que reduz as
desonerações na folha de pagamento, o deputados Leonardo Piccianni (PMDB-RJ),
anunciou que a votação da proposta ficará para junho. A expectativa é que o
texto possa ser apreciado pelo plenário da Câmara no dia dez do próximo mês.
A votação estava prevista para esta quarta-feira, mas precisou ser adiada
porque Picciani ainda não concluiu seu relatório. O governo também já demonstrou
que não tem pressa e irá avaliar cada detalhe do texto. O plenário da Câmara ao
menos concluiu a votação dos destaques da Medida Provisória 668, que eleva as
alíquotas de PIS e Cofins para produtos importados, que igualmente faz parte do
ajuste fiscal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário