Sentença afirma que mulher 'não escolheu o vício, nem a doença'
Publicado: 12 de fevereiro de 2016 às 12:11
Sentença
de primeiro grau afirma que Dolores Consuelo Zigler, que alegou ter
fumado dois maços de cigarro por dia durante quase 50 anos, 'não
escolheu o vício, nem a doença' (Foto: USP Imagens)
A Justiça de São Paulo condenou a Souza Cruz a indenizar por danos
morais a funcionária pública aposentada Dolores Consuelo Zigler, de 83
anos, que alegou ter fumado dois maços de cigarro por dia durante quase
50 anos, desde quando ainda estava na adolescência.
Na ação, Dolores informou que o vício lhe causou complicações
pulmonares. Em decorrência do tabagismo, conforme atestado médico que
juntou aos autos, sofre de “obstrução do fluxo ventilatório”. A juíza
Celina Dietrich Trigueiros Teixeira Pinto, da 15.ª Vara Cível da
Capital, fixou a indenização em R$ 20 mil ao reconhecer “nexo causal”
entre o cigarro e a doença de Dolores.
A Souza Cruz é líder no mercado de cigarros no Brasil e integra o grupo British American Tobacco, com marcas comercializadas em 180 países.
A Souza Cruz informou que já recorreu da sentença, dada em 5 de dezembro. Segundo a empresa, “em todo o Brasil, já foram proferidas mais de 500 decisões que rejeitaram ações como esta e todos os casos encerrados tiveram decisões definitivas que afastaram os pedidos indenizatórios”.
“A autora (Dolores Consuelo Zigler) não escolheu o vício, nem a doença”, assinalou a juíza da 15.ª Vara Cível de São Paulo, na sentença. “Não podia escolhê-los, porque não tinha informação suficiente sobre o fato quando lhe foi oferecida a compra de cigarros pela ré (Souza Cruz).
E não se argumente que não há dificuldade em parar de fumar, ou que esta ou aquela porcentagem de norte americanos é formada por ex-fumantes que não utilizaram remédios.”
Celina Dietrich faz uma reflexão. “É claro que a intensidade da dependência varia de pessoa para pessoa, assim como a dificuldade de livrar-se dela.
Entretanto, em nenhuma hipótese é possível dizer-se que um fumante viciado, e fumando dois maços de cigarros por dia, não tenha dificuldades para parar de fumar. Se fosse assim tão fácil, ninguém se disporia a pagar para ingerir remédios caros e a enfrentar os seus efeitos colaterais visando deixar de fumar, e a indústria farmacêutica não se importaria em fabricá-los.”
“Quem já foi viciado que me contradiga”, afirma a magistrada.
A ação foi ajuizada quando Dolores tinha 63 anos. “Fumou por quase 50 anos, antes que se iniciassem as primeiras proibições ou limitações à propaganda de cigarros, e a veiculação de advertência nas caixinhas, visando coibir o fumo e fornecer informação suficiente aos consumidores, a fim de que pudessem efetivamente exercer alguma escolha”, assinalou a juíza.
“E, da mesma forma, somente depois de mais de 40 anos é que a autora teve acesso a remédios que pudessem ajudá-la a parar de fumar.”
Para a juíza da 15.ª Vara Cível de São Paulo, “é evidente” que a Souza Cruz descumpriu o dever de informação disposto no artigo 6.º. inciso III do Código do Consumidor, vigente desde 1990.
“Somente a partir do ano de 2001 (Souza Cruz) começou a inserir a informação sobre as doenças causadas pelo fumo em suas embalagens. Antes disso, não forneceu informação adequada sobre as características nocivas e os riscos apresentados pelo produto, nem comprovou que deles não soubesse. Ao contrário, admitiu-se ciente desses males, tanto que pretendeu se exigisse da autora o mesmo conhecimento.”
A juíza é taxativa. “Desta forma, considerada a prova do nexo causal entre o cigarro e a doença pulmonar adquirida pela autora e o acesso tardio às informações sobre os males do cigarro e aos remédios para parar de fumar, não há como se afastar a responsabilidade da ré. Diante do vício físico e psicológico causado pelo cigarro, aliado à falta de informação suficiente e à ausência de medicamentos adequados para curar a dependência, não se tem como concluir que a autora tivesse mesmo capacidade de escolha consciente que a impedisse de começar a fumar, ou que a fizesse largar o vício.”
Ao julgar procedente a ação, e admitir existência do dano moral, a juíza recorreu novamente ao Código do Consumidor e também ao Código Civil, e ponderou.
“Não se discute, também, que seja lícita a atividade de vender cigarros exercida pela ré, e que o produto não contenha defeito, pois essas são questões irrelevantes diante da responsabilidade objetiva determinada pelo artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor e pelo artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, e que portanto independe da licitude do comportamento ou ainda da verificação da sua culpa do causador do dano, bastando o nexo causal entre o produto vendido e o dano, aliado à ausência de culpa de terceiro ou da vítima, para a caracterização de sua responsabilidade.”
“E não se olvide que a requerida (fabricante do cigarro) não forneceu ao consumidor todas as informações necessárias sobre o produto, mormente em se tratando da possibilidade de dano à saúde, portanto descumpriu a Legislação Consumeirista. O dano moral, por sua vez, é inafastável diante da doença enfrentada pela autora, mal físico infligido pelo consumo do produto fornecido pela ré. Para indenizá-lo, considerando grave o dano, e tendo em conta a função punitiva e pedagógica da verba, mas também o principio da moderação, fixo a quantia de R$ 20.000,00. Daí a procedência da ação.”
O valor da indenização terá correção monetária a partir da sentença e juros de mora desde a citação, mais as custas processuais e honorários advocatícios de 15% do valor da condenação. (AE)
A Souza Cruz é líder no mercado de cigarros no Brasil e integra o grupo British American Tobacco, com marcas comercializadas em 180 países.
A Souza Cruz informou que já recorreu da sentença, dada em 5 de dezembro. Segundo a empresa, “em todo o Brasil, já foram proferidas mais de 500 decisões que rejeitaram ações como esta e todos os casos encerrados tiveram decisões definitivas que afastaram os pedidos indenizatórios”.
“A autora (Dolores Consuelo Zigler) não escolheu o vício, nem a doença”, assinalou a juíza da 15.ª Vara Cível de São Paulo, na sentença. “Não podia escolhê-los, porque não tinha informação suficiente sobre o fato quando lhe foi oferecida a compra de cigarros pela ré (Souza Cruz).
E não se argumente que não há dificuldade em parar de fumar, ou que esta ou aquela porcentagem de norte americanos é formada por ex-fumantes que não utilizaram remédios.”
Celina Dietrich faz uma reflexão. “É claro que a intensidade da dependência varia de pessoa para pessoa, assim como a dificuldade de livrar-se dela.
Entretanto, em nenhuma hipótese é possível dizer-se que um fumante viciado, e fumando dois maços de cigarros por dia, não tenha dificuldades para parar de fumar. Se fosse assim tão fácil, ninguém se disporia a pagar para ingerir remédios caros e a enfrentar os seus efeitos colaterais visando deixar de fumar, e a indústria farmacêutica não se importaria em fabricá-los.”
“Quem já foi viciado que me contradiga”, afirma a magistrada.
A ação foi ajuizada quando Dolores tinha 63 anos. “Fumou por quase 50 anos, antes que se iniciassem as primeiras proibições ou limitações à propaganda de cigarros, e a veiculação de advertência nas caixinhas, visando coibir o fumo e fornecer informação suficiente aos consumidores, a fim de que pudessem efetivamente exercer alguma escolha”, assinalou a juíza.
“E, da mesma forma, somente depois de mais de 40 anos é que a autora teve acesso a remédios que pudessem ajudá-la a parar de fumar.”
Para a juíza da 15.ª Vara Cível de São Paulo, “é evidente” que a Souza Cruz descumpriu o dever de informação disposto no artigo 6.º. inciso III do Código do Consumidor, vigente desde 1990.
“Somente a partir do ano de 2001 (Souza Cruz) começou a inserir a informação sobre as doenças causadas pelo fumo em suas embalagens. Antes disso, não forneceu informação adequada sobre as características nocivas e os riscos apresentados pelo produto, nem comprovou que deles não soubesse. Ao contrário, admitiu-se ciente desses males, tanto que pretendeu se exigisse da autora o mesmo conhecimento.”
A juíza é taxativa. “Desta forma, considerada a prova do nexo causal entre o cigarro e a doença pulmonar adquirida pela autora e o acesso tardio às informações sobre os males do cigarro e aos remédios para parar de fumar, não há como se afastar a responsabilidade da ré. Diante do vício físico e psicológico causado pelo cigarro, aliado à falta de informação suficiente e à ausência de medicamentos adequados para curar a dependência, não se tem como concluir que a autora tivesse mesmo capacidade de escolha consciente que a impedisse de começar a fumar, ou que a fizesse largar o vício.”
Ao julgar procedente a ação, e admitir existência do dano moral, a juíza recorreu novamente ao Código do Consumidor e também ao Código Civil, e ponderou.
“Não se discute, também, que seja lícita a atividade de vender cigarros exercida pela ré, e que o produto não contenha defeito, pois essas são questões irrelevantes diante da responsabilidade objetiva determinada pelo artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor e pelo artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, e que portanto independe da licitude do comportamento ou ainda da verificação da sua culpa do causador do dano, bastando o nexo causal entre o produto vendido e o dano, aliado à ausência de culpa de terceiro ou da vítima, para a caracterização de sua responsabilidade.”
“E não se olvide que a requerida (fabricante do cigarro) não forneceu ao consumidor todas as informações necessárias sobre o produto, mormente em se tratando da possibilidade de dano à saúde, portanto descumpriu a Legislação Consumeirista. O dano moral, por sua vez, é inafastável diante da doença enfrentada pela autora, mal físico infligido pelo consumo do produto fornecido pela ré. Para indenizá-lo, considerando grave o dano, e tendo em conta a função punitiva e pedagógica da verba, mas também o principio da moderação, fixo a quantia de R$ 20.000,00. Daí a procedência da ação.”
O valor da indenização terá correção monetária a partir da sentença e juros de mora desde a citação, mais as custas processuais e honorários advocatícios de 15% do valor da condenação. (AE)
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