Publicado em março 23, 2016 por Redação
O Cerrado, “berço das águas” do Brasil, não só está ameaçado, como tem sido assassinado dia após dia. E se ele for extinto levará consigo a água que chega às torneiras, usada para beber, banhar, cozinhar, molhar as plantações, dar de beber aos animais… Já imaginou a vida sem água? Impossível, não é? Então, se toda essa devastação continuar no Cerrado, terá fim o bioma e as principais fontes de água do Brasil e da América do Sul.
São originárias do Cerrado as nascentes que abastecem seis das oito bacias hidrográficas brasileiras, destaque para as bacias do Araguaia/Tocantins, São Francisco e Paraná/Paraguai. Devido às características do solo e vegetação do Cerrado, este bioma possui relevante importância na manutenção dos aquíferos, responsáveis por abastecer nossos rios.
A água que escorre pelos rios, córregos e veredas, alimenta culturas regionais e modos de vida baseados no extrativismo, na agricultura familiar e no artesanato, atividades que valorizam a exploração sustentável dos bens naturais. Os povos e comunidades tradicionais que vivem no Cerrado são os valorosos Guardiões de toda esta riqueza, pois sabem que é dela que dependem suas famílias. Mas este rico e estratégico bioma está sendo devastado, principalmente, pelo agronegócio e seu discurso de “desenvolvimento”, que, na verdade, está na contramão das iniciativas de conservação do bioma e da vida.
Nas últimas quatro décadas, esta incessante devastação do Cerrado se acentuou. Dados revelam que apenas 48% da vegetação original do bioma encontra-se total ou parcialmente conservada. E para piorar, o desmatamento só tem aumentado nos últimos dez anos, sendo maior até mesmo que o da Amazônia.
Essa destruição desenfreada tem gerado impactos graves à biodiversidade, extinguido grandes e pequenos rios ano a ano – contribuindo também para o aumento do aquecimento global. E os impactos são sentidos no cotidiano: falta de água, chuvas fortes e contínuas que provocam enchentes e, em outro extremo, secas mais frequentes e severas.
Além disso, as áreas de recarga degradadas perdem, por exemplo, a capacidade de infiltração das águas das chuvas, reduzindo o volume de água dos aquíferos, responsáveis pelo armazenamento e distribuição das águas às bacias.
Outro grave problema é o uso intensivo de agrotóxicos, responsável por poluir nossas águas, matar as árvores frutíferas e as plantas medicinais, além de ocasionar problemas gravíssimos de saúde aos humanos.
Com a degradação desse bioma, as áreas de recarga perdem a capacidade de infiltração das águas das chuvas, com isso reduz o volume dos aquíferos. Tudo isso afetará, por sua vez, as nascentes. Contudo, além do problema enfrentado quanto à diminuição das águas, há também outra preocupação: a qualidade de nossas águas. O uso intensivo dos agrotóxicos utilizados nas plantações polui as águas, mata as árvores frutíferas e as plantas medicinais, além de ocasionar graves problemas para a saúde humana.
Nesta lógica, para grupos econômicos e o Estado, o Cerrado é apenas um espaço a ser continuamente explorado por meio do agronegócio, de empresas multinacionais e da construção de grandes projetos de infraestrutura, como barragens, ferrovias, hidrovias, perímetros irrigados e outros. Prova disso é o recém-criado Plano de Desenvolvimento do MATOPIBA, que abrange áreas territoriais do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, espaço considerado como a última fronteira agrícola do país.
A principal intenção do MATOPIBA é ampliar as áreas de monocultura nesses estados, desconsiderando a realidade de quem ali vive, aumentando os conflitos e trazendo sofrimento e angústias aos povos e comunidades que dependem desse território que, em muitos casos, não foram ainda regularizados. Pesquisadores consideram o Cerrado em processo de extinção, por isso o MATOPIBA trará consequências irreversíveis à vida do bioma e dos seres humanos, impactando o Brasil e outros países da América do Sul.
“A proteção das águas tinha de ser questão de segurança nacional, porque se o Cerrado for extinto, leva ao fim dos rios e dos reservatórios de água” (Altair Sales).
Preservar o Cerrado é conservar as águas e a vida! Por isso os Povos do Cerrado exigem e se posicionam pelo/a:
- Reconhecimento do Cerrado como Patrimônio Nacional com aprovação da Lei 504/2010;
- A proteção do Cerrado está intrinsecamente ligada aos Territórios dos Povos e Comunidades Tradicionais e a necessidade da Reforma Agrária – por isso é importante que o governo federal garanta a demarcação dos Territórios Indígenas, regularização e titulação das terras dos Quilombolas, Geraizeiros, Retireiros, Ribeirinhos, Pescadores, Vazanteiros e o assentamentos dos Sem Terra;
- Somos contra a PEC 215 – que transfere ao Legislativo ao responsabilidade a responsabilidade pelas demarcações de Terras Indígenas, a titulação dos Territórios Quilombolas e a criação de Unidades de Conservação.
- Cumprimento e a fiscalização da Legislação Ambiental – e Projeto de Lei que proteja e conserve as áreas de recarga;
- Somos contrários ao licenciamento de novos projetos de irrigação – em especial novos perímetros irrigados e grandes propriedades, que quase sempre utiliza pivôs centrais e lineares, que hoje estão atrelados à construção de grandes lagos artificiais, os “Piscinões”;
- Queremos nossas águas livres de agrotóxicos – pelo fim da pulverização aérea, da isenção de impostos aos agrotóxicos, não à criação de zonas livres de agrotóxicos e transgênicos;
- Exigimos políticas públicas que evitem novos desmatamentos e que defendam o que ainda resta do Cerrado;
- É de responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente o monitoramento das áreas de vegetação nativa e o desenvolvimento de programas de recuperação das áreas degradadas e das nascentes;
- Posicionamos contra o Plano de Desenvolvimento do MATOPIBA – é uma grande ameaça ao Cerrado, pois promoverá o aumento da grilagem de terras, expulsão dos camponeses/as de suas terras e territórios, aumentando a degradação ambiental.
- Exigimos que o Direito dos Povos e Comunidades Tradicionais de serem consultados no caso de empreendimentos que afetem seus modos de vida, garantido pela Convenção 169 da OIT ratificada pelo Brasil seja cumprido.
Assinam:
Articulação das CPT’s do Cerrado / Comissão Pastoral da Terra – CPT
Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins – APA-TO
Articulação Nacional de Quilombos – ANQ
Actionaid
Articulação Popular São Francisco Vivo
Associação Comunitária da Escola Família Agrícola Rural de Correntina e Arredores – ACEFARCA/BA
Associação dos Advogados de Trabalhadores Rurais do Estado da Bahia – AATR/BA
Agência 10envolvimento
Cáritas Brasileira
Centro de Desenvolvimento Agroecológico do Cerrado – CEDAC
Central do Cerrado
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG
Coletivo de Fundos e Fechos de Pasto do Oeste da Bahia
Coletivo de Apoio e Assessoria Jurídica Popular do Oeste da Bahia
EFAPA/BA
Fase, MPA,
Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar – FETRAF
IBRACE
Instituto de Estudos Socioeconômicos – Inesc
Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
Movimento de Mulheres Camponesas – MMC
Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA
Rede Cerrado
Rede de Mulheres Negras para Soberania Alimentar e Nutricional
RODA Bahia
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santa de Maria da Vitória – Bahia
Serviço Pastoral do Migrante – SPM
Fonte: Comissão Pastoral da Terra
in EcoDebate, 232/03/2016
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