sexta-feira, 28 de abril de 2017
Produto é barato, não compete com mercado de alimentos e contém antioxidantes, permitindo acondicionar hortifrútis
Pesquisas da USP em Ribeirão Preto avançam na busca de plástico 100%
biodegradável e competitivo com o plástico comum. Testes que reúnem na
fórmula resíduos agroindustriais resultaram num produto com qualidades
técnicas e econômicas promissoras.
A boa nova saiu dos laboratórios do Departamento de Química da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP. A
química Bianca Chieregato Maniglia desenvolveu filmes plásticos
biodegradáveis a partir de matrizes de amido presentes em resíduos
agroindustriais de cúrcuma, babaçu e urucum.
O fato do novo material ser totalmente desenvolvido a partir de
descartes da agroindústria faz toda diferença. Ao mesmo tempo, recicla
resíduos; é biodegradável; é produzido com fontes renováveis que não se
esgotam como o petróleo (de onde sai o plástico comum) e cultivadas em
qualquer lugar do mundo. Bianca lembra de mais predicados de seu
produto: matéria-prima barata, que não compete com o mercado alimentício
e ainda “contém composição interessante com a presença de ativos
antioxidantes”.
Essa fórmula com compostos antioxidantes, lembra a pesquisadora, pode
ser ainda mais interessante no desenvolvimento de “embalagens ativas”.
Uma embalagem ativa interage com o produto que envolve, sendo capaz de
melhorar a qualidade e segurança para acondicionamento de frutas e
legumes frescos.
Os estudos parecem indicar o caminho certo para a obtenção de um
plástico, ou pelo menos um filme plástico, totalmente biodegradável. Os
pesquisadores da FFCLRP conseguiram produzir filmes plásticos com boa
aparência, boas propriedades mecânicas, funcionais e ativas, o que os
torna mais eficientes na conservação de hortifrútis. O grupo de pesquisa
também tem trabalhado com a aplicação de aditivos como a palha de soja
tratada, outro resíduo agroindustrial, para melhorar as propriedades
destes filmes. A meta é o ganho de maior resistência mecânica e menor
capacidade de absorver e reter água.
Bianca, porém, acredita que ainda demande mais pesquisa e teste para os
100% biodegradáveis chegarem ao mercado. Em perspectiva mais recente,
comenta, “esse tipo de plástico deve atuar como alternativa ao comum”.
Apesar de não substituir o tipo comum, pode ser aplicado a diversos
tipos do produto, como já ocorre nas misturas de matérias-primas
renováveis com polímeros não renováveis, formando as chamadas “blendas”.
“Temos as boas propriedades dos plásticos comuns com parcial
biodegradabilidade”, comenta.
Plásticos (não tão) “verdes”
O plástico comum, que é produzido com derivado do petróleo
(matéria-prima não renovável, cuja composição não é metabolizada por
microrganismos), leva até 500 anos para desaparecer.
Já o plástico biodegradável desenvolvido na USP é feito de material
biológico, e por isso é atacado, na natureza, por outros agentes
biológicos – bactérias, fungos e algas – e se transformam em água, CO2 e
matéria orgânica. Ele se degrada em no máximo 120 dias.
Atualmente, existem no mercado outros tipos de plástico biodegradável.
São feitos a partir de fontes renováveis – milho, mandioca, beterraba e
cana-de-açúcar. Porém, estas fontes servem como matérias-primas para
produzir um composto (ácido láctico) do qual se pode sintetizar o
polímero (PLA – ácido polilático). “Devido ao fato destes plásticos não
serem produzidos com polímeros naturais, como proteína e carboidratos,
por exemplo, o material apresenta estrutura mais complexa e só se
biodegrada corretamente em usinas de compostagem, onde há condições
adequadas de luz, umidade e temperatura, além da quantidade correta de
microrganismos”, lembra Bianca.
Além de caros, os plásticos produzidos por fontes renováveis hoje
comercializados ainda deixam a desejar em relação a algumas propriedades
mecânicas e funcionais se comparados aos plásticos produzidos com
fontes não renováveis, e também demandam outros custos para não poluírem
o meio ambiente.
Outro plástico muito divulgado na busca por maior sustentabilidade é o
“plástico verde”. No entanto, a pesquisadora faz um alerta sobre este
tipo de plástico. É feito de cana-de-açúcar, mas não é biodegradável. A
partir da cana, é produzido o polietileno igual ao obtido do petróleo,
assim o tempo de decomposição do plástico verde é o mesmo do plástico
comum. “Vai continuar a causar problemas nas cidades e na natureza.”
Bianca defende que a aceitação e demanda por plásticos biodegradáveis
dependam mais de consciência ambiental, legislação e vontade política
que de fatores econômicos. Avalia que, em perspectiva global, quando se
incluem custos indiretos, como geração de lixo, poluição e outros
impactos à saúde e meio ambiente, “os biodegradáveis assumem posições
economicamente mais favoráveis”.
Falando em economia, os custos de produção desses materiais podem ficar
bem menores que os atuais. E isso se deve à utilização dos resíduos
agroindustriais, como o produto agora desenvolvido na USP, cujos
componentes não competem no mercado com a indústria de alimentos.
Os resultados desse estudo foram apresentados em março deste ano à
FFCLRP na tese de doutorado de Bianca, que trabalhou sob orientação da
professora Delia Rita Tapia Blácido.
Por Rita Stella e Paulo Henrique Moreno, de Ribeirão Preto
Fonte: EcoDebate
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