- quarta-feira, 06 setembro 2017 18:50
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São múltiplos os fatores que tem motivado as prefeituras na iniciativa de reservar espaços protegidos em seus territórios. O estudo identificou seis fatores predominantes: a proteção de remanescentes da vegetação nativa e da paisagem natural em geral; uso público, com a promoção de lazer, recreação, turismo e ecoturismo; educação ambiental, proporcionando contato com a natureza e interpretação ambiental; atividades de pesquisa sobre a biodiversidade e/ou aspectos socioeconômicos; proteção de espécies raras, endêmicas e ameaçadas da fauna e flora nativa; e proteção de recursos hídricos como bacias, mananciais, rios e outros cursos d’água, principalmente para o abastecimento das cidades.
A criação de UCs municipais vem ocorrendo desde a década de 1960, mas a partir dos anos 1990 foi possível perceber um grande salto nesse processo, a partir da constituição do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços com critérios ambientais, o ICMS Ecológico, nos estados do Paraná e Minas Gerais. A conservação da biodiversidade através das UCs passou a ser um critério de repasse dos recursos financeiros desse tributo aos municípios. Com isto, nos primeiros quatro anos de implementação do ICMS Ecológico do Paraná, por exemplo, mais que duplicou o número e aumentou 18 vezes a área de UCs municipais em relação aos anos anteriores.
As UCs municipais também representam uma ferramenta relevante para influenciar o uso e ocupação dos territórios nos municípios ao constituírem um elemento importante para a dinâmica socioeconômica da paisagem local. Cerca de 40% dos municípios da Mata Atlântica avaliados possuem 17% ou mais do seu território coberto por UCs municipais.
Esses números não consideram a possível sobreposição entre as diversas UCs, mas mostram uma tendência importante e a necessidade de avaliar a cobertura e inserção dos espaços protegidos no âmbito local. Os espaços protegidos contribuem para o ordenamento territorial, oferecem oportunidades para a instalação de empreendimentos sustentáveis, promovem o acesso a recursos naturais e o contato com a natureza, proporcionando bem-estar social e o acesso a serviços ambientais para diferentes propósitos.
“O estudo registrou a formação de corredores
ecológicos, criação conjunta de UCs municipais, participação em mosaicos
de UCs, e formação de consórcios intermunicipais para a união de
esforços e busca de soluções conjuntas capazes de fortalecer a rede de
proteção local”.
O estudo registrou a formação de corredores ecológicos, criação conjunta de UCs municipais, participação em mosaicos de UCs, e formação de consórcios intermunicipais para a união de esforços e busca de soluções conjuntas capazes de fortalecer a rede de proteção local. A participação do setor privado nos esforços de conservação por meio da criação das Reservas Particulares do Patrimônio Natural, as RPPNs, agora também já reconhecidas na esfera municipal, é também uma das formas de articulação que temos visto fortalecida.
Um exemplo interessante é a criação de uma área protegida na Região Metropolitana de Curitiba (PR). As prefeituras de Curitiba, Araucária e Fazenda Rio Grande se uniram para criar, em 2015, a Reserva do Bugio ou Refúgio do Bugio, maior UC intermunicipal do país localizada em área urbana. São 1.765,02 hectares (ha) protegidos ao longo dos rios Barigui e Iguaçu na confluência entre os três municípios e divididos em três Refúgios de Vida Silvestre Municipais: REVIS do Bugio (827,80 ha), em Curitiba; REVIS Rio Iguaçu-Foz do Barigui (334,22 ha), em Araucária; e REVIS Foz do Rio Maurício-Rio Iguaçu (603 ha), em Fazenda Rio Grande. A expectativa das prefeituras é a de que a unidade contribua para a melhoraria da qualidade das águas e na diminuição do impacto das enchentes, além da proteção da biodiversidade local.
Alguns municípios, como João Pessoa (PB), Recife (PE), Salvador (BA), Linhares (ES), Extrema (MG), Sorocaba (SP), Curitiba (PR) e Cristal (RS), possuem Sistemas Municipais de Unidades de Conservação (SMUC), que, em geral, seguem diretrizes do sistema nacional, com adequações que atendem especificidades locais.
Esses sistemas podem ser utilizados como modelo para os municípios que estão organizando e estruturando seus SMUCs, que é o caso de Belo Horizonte e Rio de Janeiro. O SMUC é um importante instrumento para integração do Fundo Municipal de Meio Ambiente, do Conselho Municipal de Meio Ambiente e dos demais mecanismos da estrutura ambiental dos municípios.
Muitos desses sistemas trazem ainda em seu arcabouço uma legislação especifica para reconhecimento das RRPPNs e, assim, passam a atuar ativamente na criação, gestão e manejo dessas reservas. Hoje, no Brasil, já identificamos pelo menos 17 municípios que tem legislação específica para reconhecimento dessa categoria.
“Os PMMAs, ao serem elaborados, apontam nos
municípios as florestas naturais, áreas prioritárias para a conservação e
que, portanto, devem ser manejadas e protegidas ou recuperadas”.
Esse mecanismo, se vinculado ao Plano Diretor do município, pode colaborar com as estratégias de zoneamento e ordenamento do solo, tendo as UCs municipais como uma das principais medidas para a proteção do patrimônio ambiental nas cidades e como âncoras da infraestrutura verde do município, que englobam todas áreas naturais e áreas verdes urbanas de um determinado território.
Em uma amostragem de 720 UCs municipais registradas no estudo, que apresentam informações sobre sua localização, foi possível verificar que a maioria das UCs municipais está situada na malha urbana (278; 38,6%) ou em áreas periurbanas (129; 17,9%), na circunvizinhança das cidades ou de núcleos urbanos. Isso significa que 56,5% das UCs municipais da Mata Atlântica estão sob a influência dos centros urbanos e mais próximas das pessoas. Isso reforça ainda mais a importância dessas áreas para a qualidade de vida nas cidades.
O crescente processo de urbanização na Mata Atlântica tem afetado a biodiversidade e a oferta de serviços ambientais vitais para as populações que vivem nas cidades. Desse modo, todo e qualquer esforço na proteção das florestas urbanas remanescentes e de toda infraestrutura verde nos municípios deve ser valorizado, além de ser complementar aos esforços de conservação dos governos estaduais e federal.
A infraestrutura verde é sem dúvida um elemento essencial para enfrentar os enormes desafios da vida urbana, como os desastres naturais (ex.: enchentes, deslizamentos de morros etc.), ondas de calor, proliferação de doenças contagiosas, abastecimento de água, espaços para o lazer e recreação, além de contribuírem para o enfrentamento às mudanças do clima.
Soma-se a isso o fato de que cerca de 80% dos remanescentes florestais da Mata Atlântica estão em propriedades privadas. Nesse contexto, o papel de empresas e cidadãos proprietários de terras e imóveis é extremamente relevante e deve ser incentivado e valorizado, trazendo destaque ainda maior para as unidades de conservação privadas.
Todos esses elementos devem ser trabalhados no planejamento e o desenho apropriado para a integração entre a malha urbana e os ambientes naturais e seus serviços ambientais serão essenciais para garantir o bem-estar da população e a sustentabilidade dos municípios. Nesse contexto, a contribuição dos municípios na proteção desses remanescentes no ordenamento territorial local ganha mais importância, o que coloca em evidência ainda maior a necessidade de entendimento desse complexo sistema socioambiental envolvendo centros urbanos, UCs e áreas verdes em geral.
*Este conteúdo é baseado no estudo “Unidades de Conservação Municipais da Mata Atlântica”, publicado pela Fundação em julho deste ano – conheça o relatório completo.
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