sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Puxadinhos para todo o DF?




28/9/2017
Cristiano de Sousa e Romina Caparelli
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A ocupação desordenada e não autorizada de áreas públicas na região dos CLS e CLN é uma das questões que mais ameaçam a área tombada de Brasília. Esse problema urbano que remonta à década de 1970 até ganhou um nome: puxadinhos. Os beneficiados pressionam as instituições, a população os rejeitam pelos incômodos gerados e as diversas leis existentes não solucionaram o problema até hoje.

Por um lado, o empresariado quer ocupar as amplas áreas públicas disponíveis ao lado de seus estabelecimentos comerciais. Afinal, qual seria o problema de se colocar  algumas mesas e cadeiras, uns toldos e lonas, ou mesmo vasos e plantas para delimitar e ampliar sua área de atendimento? Qual o problema de ocupar aquela “área vazia lá atrás” para fazer um depósito (e que depois vai virar vitrine ou ser incorporado pela loja)? Qual o problema do tamanho original da loja ser duplicado ou triplicado em uma área pública “que ninguém está usando”? Porque tanto rigor?

20150614225124399356o.jpgPor outro lado, grande parte da população não apoia a ocupação dessas áreas públicas  por parte de lojas, bares e restaurantes. Além dos problemas estéticos, a expansão das ocupações nos comércios locais amplia em muitas vezes o impacto originalmente previsto para essas áreas. A demanda por vagas de estacionamento, a circulação de usuários, o consumo de água e energia, entre outros, leva os comércios locais a terem um caráter regional – o que foi projetado para acontecer somente na avenida W3 – e  isso diminui a qualidade de vida da população e prejudica o funcionamento da cidade.

Quanto à fiscalização dos puxadinhos, ela sempre foi, via de regra, omissa. Quando atua,  a fiscalização não consegue ser efetiva por diversas razões, incluindo interferências políticas e medidas judiciais (a tal indústria das liminares).

Esse cenário nos leva a uma reflexão. Nas outras grandes cidades e capitais, quando um edifício – ou mesmo uma região – já não comporta o tamanho que um estabelecimento comercial exige, seja de que natureza for, o que acontece? Ele busca uma nova área condizente com sua atividade ou permanece, insiste e impacta o seu entorno até alguém dizer basta? O poder público tolera a situação, inclusive investindo na criação de leis para perpetuar a desordem urbana criada?
brasilia-sofre-com-descaracterizacao-de-seu-projeto-urbanistico-original-1366299015559_956x500Não importa quantas leis foram criadas para tentar organizar o caos urbano gerado pelos puxadinhos, inevitavelmente aos beneficiados interessa somente os direitos, ignorando-se os deveres. Afinal, para que buscar um novo endereço e pagar o aluguel de uma área maior se é possível ampliar a sua área útil pagando taxas irrisórias?

Infelizmente constata-se que, apesar das sucessivas leis propostas para os puxadinhos, não houve uma que solucionasse o problema ou sequer desestimulasse o surgimento de novas ocupações. Assim, a cada tentativa de se satisfazer o interesse do empresariado brasiliense, a população fica cada vez mais anestesiada à presença dos puxadinhos e prevalece a tolerância em detrimento de “ações drásticas” como a desocupação das áreas públicas com a preservação das características originais dos comércios locais.
20150122074725483729ePois bem, a pá de cal parece estar chegando na forma de um Projeto de Lei Complementar (PLC) que pretende regularizar a ocupação de áreas públicas, os puxadinhos, fora da área tombada, em todo o Distrito Federal, unicamente mediante a cobrança de taxas. Trata-se de uma norma perigosa que pode estimular a invasão de áreas públicas em todas as cidades do DF, diminuindo consideravelmente a já precária qualidade de vida de grande parcela da população. Afinal, o que está errado precisa ser coibido ou regularizado?

Ouça no link a seguir a arquiteta e urbanista Romina Capparelli tratando desse assunto no quadro “Assim é Brasília”, que vai ao ar na CBN Brasília sempre às quartas-feiras, às 9h50:

Em época de crise,
vale tudo por dinheiro mesmo?


Romina Faur Capparelli é graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Brasília e em Direito pelo Centro Universitário de Brasília. Consultora legislativa do Senado Federal, integra o movimento Urbanistas por Brasília e é membro do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB/DF) e do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios Históricos no DF (ICOMOS/DF).

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