28/9/2017
Cristiano de Sousa e Romina Caparelli
A ocupação desordenada e não autorizada
de áreas públicas na região dos CLS e CLN é uma das questões que mais
ameaçam a área tombada de Brasília. Esse problema urbano que remonta à
década de 1970 até ganhou um nome: puxadinhos. Os
beneficiados pressionam as instituições, a população os rejeitam pelos
incômodos gerados e as diversas leis existentes não solucionaram o
problema até hoje.
Por um lado, o empresariado quer ocupar
as amplas áreas públicas disponíveis ao lado de seus estabelecimentos
comerciais. Afinal, qual seria o problema de se colocar algumas mesas e
cadeiras, uns toldos e lonas, ou mesmo vasos e plantas para delimitar e
ampliar sua área de atendimento? Qual o problema de ocupar aquela “área
vazia lá atrás” para fazer um depósito (e que depois vai virar vitrine
ou ser incorporado pela loja)? Qual o problema do tamanho original da
loja ser duplicado ou triplicado em uma área pública “que ninguém está
usando”? Porque tanto rigor?
Por
outro lado, grande parte da população não apoia a ocupação dessas áreas
públicas por parte de lojas, bares e restaurantes. Além dos problemas
estéticos, a expansão das ocupações nos comércios locais amplia em
muitas vezes o impacto originalmente previsto para essas áreas. A
demanda por vagas de estacionamento, a circulação de usuários, o consumo
de água e energia, entre outros, leva os comércios locais a terem um
caráter regional – o que foi projetado para acontecer somente na avenida
W3 – e isso diminui a qualidade de vida da população e prejudica o
funcionamento da cidade.
Quanto à fiscalização dos puxadinhos, ela
sempre foi, via de regra, omissa. Quando atua, a fiscalização não
consegue ser efetiva por diversas razões, incluindo interferências
políticas e medidas judiciais (a tal indústria das liminares).
Esse cenário nos leva a uma reflexão. Nas
outras grandes cidades e capitais, quando um edifício – ou mesmo uma
região – já não comporta o tamanho que um estabelecimento comercial
exige, seja de que natureza for, o que acontece? Ele busca uma nova área
condizente com sua atividade ou permanece, insiste e impacta o seu
entorno até alguém dizer basta? O poder público tolera a situação,
inclusive investindo na criação de leis para perpetuar a desordem urbana
criada?
Não
importa quantas leis foram criadas para tentar organizar o caos urbano
gerado pelos puxadinhos, inevitavelmente aos beneficiados interessa
somente os direitos, ignorando-se os deveres. Afinal, para que buscar um
novo endereço e pagar o aluguel de uma área maior se é possível ampliar
a sua área útil pagando taxas irrisórias?
Infelizmente constata-se que, apesar das
sucessivas leis propostas para os puxadinhos, não houve uma que
solucionasse o problema ou sequer desestimulasse o surgimento de novas
ocupações. Assim, a cada tentativa de se satisfazer o interesse do
empresariado brasiliense, a população fica cada vez mais anestesiada à
presença dos puxadinhos e prevalece a tolerância em detrimento de “ações
drásticas” como a desocupação das áreas públicas com a preservação das
características originais dos comércios locais.
Pois
bem, a pá de cal parece estar chegando na forma de um Projeto de Lei
Complementar (PLC) que pretende regularizar a ocupação de áreas
públicas, os puxadinhos, fora da área tombada, em todo o Distrito
Federal, unicamente mediante a cobrança de taxas. Trata-se de uma norma
perigosa que pode estimular a invasão de áreas públicas em todas as
cidades do DF, diminuindo consideravelmente a já precária qualidade de
vida de grande parcela da população. Afinal, o que está errado precisa
ser coibido ou regularizado?
Ouça no link a seguir a arquiteta
e urbanista Romina Capparelli tratando desse assunto no quadro “Assim é
Brasília”, que vai ao ar na CBN Brasília sempre às quartas-feiras, às
9h50:
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