Nigéria: colapso ambiental e fábrica de pobreza? artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] A Nigéria é a nação mais populosa da África e, atualmente, a sétima com maior número de habitantes do mundo. A população da Nigéria em 2018 está estimada em 195,9 milhões de pessoas, devendo atingir 419 milhões em 2050 (ultrapassando os Estados Unidos e tornando-se a terceira nação mais populosa do mundo) e podendo chegar a 794 milhões de habitantes em 2100, segundo as projeções médias da Divisão de População da ONU. A Nigéria deve ultrapassar o tamanho demográfico do Brasil e do Paquistão no primeiro quinquênio da próxima década, se tornado a quinta maior população do mundo.
O território da Nigéria tem 924 mil km2 (equivalente à área do estado do Mato Grosso), sendo que um terço do país é formado por florestas e bosques, outro terço formado por savanas e o restante é semiárido e compõe o limite sul do deserto do Saara. A densidade demográfica era de 42 hab/ km2, em 1950, passou para 215 hab/ km2, em 2018, e pode chegar a 872 hab/ km2, em 2100.
Ou seja, a Nigéria pode chegar ao final do atual século com um volume populacional superior ao de toda a Europa, que tem uma densidade demográfica de 34 hab/ km2 (A Alemanha tem uma densidade demográfica de 235 hab/ km2).
Portanto, a Nigéria é um país muito populoso, com alta densidade demográfica e com limitados recursos naturais. O gráfico acima, com dados da Footprint Network, mostra que a pegada ecológica per capita da Nigéria era de 0,9 hectare global (gha), em 1961, subiu para 1,37 gha em 2006 e diminuiu para 1,12 gha, em 2014. Ou seja, a pegada ecológica (proxy para o padrão de consumo) subiu ligeiramente entre 1961 e 2014, mostrando uma certa estagnação no nível de consumo.
A pegada ecológica da Nigéria é 2,5 vezes menor do que a pegada ecológica per capita mundial (de 2,84 gha). Todavia, mesmo com este padrão de consumo baixo, a biocapacidade per capita é ainda menor e caiu de 1,12 gha em 1961, para somente 0,7 gha em 2014. Esta queda ocorreu, fundamentalmente devido ao crescimento populacional, pois a biocapacidade per capita foi diminuindo na medida que crescia o denominador do coeficiente. Desta forma, a Nigéria apresentou, em 2014, um déficit ambiental de 60%.
O gráfico abaixo, com dados do FMI (WEO, abri de 2018), mostra que a população da Nigéria cresce em torno de 2,8% ao ano. Na primeira década dos anos 2000, a economia apresentou um crescimento elevado devido ao superciclo das commodities, particularmente, à elevação do preço do petróleo. Mas, na atual década (2011-20), o ritmo de crescimento ficou pouco acima do ritmo de crescimento da população entre 2011 e 2015 e deve ficar abaixo do crescimento populacional entre 2016 e 2023. Ou seja, a renda per capita da Nigéria está diminuindo após a recessão de 2016 e não há perspectiva de melhora pela frente.
A situação de estresse econômico e ambiental agrava a situação de pobreza do país. Artigo de Kazeem (25/06/2018) mostra que a Nigéria está em uma armadilha do baixo crescimento econômico (em um quadro de alto crescimento demográfico) e está se transformado em uma fábrica de geração de pessoas pobres. A taxa de nigerianos vivendo em situação de extrema pobreza está em torno de 50% e também não tem perspectiva de melhora nos próximos anos.
Isto quer dizer que há cerca de 100 milhões de pessoas vivendo na extrema pobreza na Nigéria atualmente e este número pode ultrapassar 200 milhões até 2050. A cidade de Lagos, com cerca de 20 milhões de pessoas na região metropolitana, é uma das megacidades mais vulneráveis à elevação do nível do mar. Milhões de pessoas ficarão desalojadas pela invasão das águas salgadas.
As mudanças climáticas devem dificultar a luta para vencer a miséria. Não só a Nigéria, mas o mundo, terá dificuldade para cumprir o objetivo 1 (“Erradicação da Pobreza”) dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que pretende “Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares” até 2030.
A Combinação de crise econômica, crise ambiental e alto crescimento demográfico tende a fazer explodir a extrema pobreza, condenando milhões de pessoas ao sofrimento e fazendo do mundo um lugar mais perigoso e inóspito para se viver.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Referências:
ALVES, JED. Os desafios da África Subsaariana em sete figuras. Ecodebate, 16/06/2017
https://www.ecodebate.com.br/2017/06/16/os-desafios-da-africa-subsaariana-em-sete-figuras-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. Cidades mais ameaçadas pelo aumento do nível do mar, Ecodebate, 26/09/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/09/26/cidades-mais-ameacadas-pelo-aumento-do-nivel-do-mar-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
Yomi Kazeem. Nigeria has become the poverty capital of the world, Quartz Africa, 25/06/2018
https://qz.com/1313380/nigerias-has-the-highest-rate-of-extreme-poverty-globally/
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 16/11/2018
"Nigéria: colapso ambiental e fábrica de pobreza? artigo de José Eustáquio Diniz Alves," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 16/11/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/11/16/nigeria-colapso-ambiental-e-fabrica-de-pobreza-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/.
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