quarta-feira, 6 de março de 2019

Ministério Público entra com ação contra mineração em terras indígenas

Por Redação CicloVivo

 
MPF aponta inconstitucionalidade em milhares de pedidos de títulos minerários.
 
 
O Ministério Público Federal do Amazonas ingressou com ação civil pública (ACP) pedindo o indeferimento de todos os requerimentos de pesquisa ou lavra minerais incidentes sobre terras indígenas (TIs) no estado do Amazonas. Os pedidos encontram-se suspensos (sobrestados, no linguajar técnico) na Agência Nacional de Mineração (ANM), o que confere às mineradoras solicitantes preferência em uma eventual regulamentação de artigos constitucionais relacionados à exploração minerária em TIs.

A ação requer, ainda, que a ANM seja impedida de sobrestar futuros pedidos voltados para a mineração em terras indígenas, tendo o órgão, obrigatoriamente, que indeferir solicitações dessa natureza. Segundo o texto protocolado pelos procuradores do MPF, a “suspensão dos procedimentos, levada a cabo pela ANM, não é albergada pela legislação brasileira constitucional e infraconstitucional, tratando-se de prática violadora das normas protetivas ao meio ambiente e às comunidades tradicionais indígenas”.

Para fundamentar parte da ação, MPF utilizou o estudo Mineração na Amazônia Legal e Áreas Protegidas, lançado pelo WWF-Brasil em outubro de 2018. Segundo a publicação, que utilizou dados do Ministério do Meio Ambiente, da Agência Nacional de Mineração e da Fundação Nacional do Índio (Funai), existem mais de 4 mil requerimentos de títulos minerários sobrepostos a terras indígenas na região amazônica, colocando em risco comunidades, biodiversidade e recursos naturais nesses territórios.

Segundo Maurício Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil, a ação ajuizada pelo Ministério Público é oportuna e deve ser vista como um importante alerta público. “No atual contexto, em que ganham força as ameaças a unidades de conservação, aos direitos e territórios dos povos tradicionais, é fundamental que toda a sociedade brasileira esteja vigilante em relação a ameaças como a mineração em terras indígenas”, analisou.

O texto da ACP reitera que qualquer ação voltada para pesquisa ou lavra minerária no interior de terras indígenas só pode ocorrer mediante autorização expressa do Congresso Nacional. Isso ocorre, ainda conforme os procuradores do MPF, pelas “peculiaridades inerentes aos impactos da atividade sobre o meio ambiente e as comunidades tradicionais”. Porém, uma vez que a regulamentação da atividade de mineração nas TIs não existe, tais solicitações não poderiam sequer ser acolhidas pela Agência Nacional de Mineração.

Adicionalmente, o artigo 231 da Constituição, bem como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário, determinam que qualquer projeto que proponha empreendimento com potencial impacto a povos tradicionais deva ser objeto de consulta prévia, livre, de boa-fé e informada, cabendo às comunidades deliberar sobre a possibilidade de se levar adiante ou não o processo. No caso em discussão, conforme o texto da ação civil pública, ao não rejeitar prontamente as solicitações das mineradoras, a ANM concretiza “medida administrativa capaz de afetar o povo titular do território sobre o qual incide o requerimento”, sem qualquer consulta, caracterizando flagrante inconstitucionalidade.

Os procuradores do MPF apresentaram, ainda, algumas decisões já tomadas em cortes em Roraima e Amapá (ainda em fase de apelação) em ações similares ingressadas pelo MPF. As duas ACPs mencionadas condenam a ANM, à época DNPM, a cancelar requerimentos pendentes de pesquisa e lavra mineral em terras indígenas nos dois estados amazônicos.

O coordenador de políticas públicas do WWF-Brasil, Michel Santos, lembrou que o garimpo ilegal é, reconhecidamente, um importante vetor de desmatamento na Amazônia. “É necessário o rápido indeferimento dos requerimentos de títulos em toda área protegida, com vistas a minimizar a corrida pela mineração e as atividades ilegais nesses territórios”, afirmou.

A ação é subscrita pelos procuradores Ana Carolina Haliuc Bragança, Fernando Merloto Soave e José Gladston Viana Correia.
(#Envolverde)

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