Terra entra no cheque especial a partir de 29 de julho
Essa data nunca aconteceu tão cedo desde que o planeta entrou em déficit ecológico no início dos anos 1970. Desse dia em diante, a natureza não consegue mais regenerar ainda este ano tudo o que a humanidade consumir até o final do ano
A conta da humanidade com a Terra entra no
vermelho a partir de 29 de julho. Desse dia em diante, passaremos a
consumir mais recursos do que o planeta consegue regenerar. Neste ano, o
limite bateu um recorde: nunca havia acontecido tão cedo desde que o
planeta entrou em déficit ecológico no início dos anos 1970. Há 20
anos, essa data caiu em 29 de setembro; dez anos atrás, em 18 de agosto.
O motivo pelo qual isso acontece é nosso
atual padrão de consumo, que exige uma quantidade maior de recursos do
que a natureza consegue oferecer. Projeções moderadas das Nações Unidas
para o aumento da população e do consumo indicam que em 2030
precisaríamos da capacidade de duas Terras para acompanhar nosso nível
de demanda por recursos naturais. O cálculo também é feito para os
países: é quando o Dia da Sobrecarga da Terra cairia se toda a
humanidade consumisse como as pessoas daquela nação. No caso do Brasil, a
data cai dois dias depois, em 31 de julho.
Os dados são da Global Footprint Network,
organização internacional de pesquisa responsável pelo cálculo do Dia da
Sobrecarga da Terra e da Pegada Ecológica, da qual a rede WWF (Fundo
Mundial pela Natureza) é parceira. Para se chegar a essa data, a Global
Footprint Network calcula o número de dias exigidos da biocapacidade da
Terra (a quantidade de recursos ecológicos que o planeta é capaz de
gerar naquele ano) para atender à Pegada Ecológica da humanidade. O
restante do ano
corresponde à sobrecarga, que é causada por quatro
fatores principais: 1) o quanto nós consumimos; 2) com que eficiência os
produtos são feitos; 3) quantas pessoas existem no planeta; e 4) quanto
os ecossistemas da natureza são capazes de produzir.
Em vários países, o principal fator de
pressão para a exploração desenfreada dos recursos naturais é o
crescente nível de consumo, mas no caso do Brasil o problema é a
acentuada queda na biocapacidade, como mostra o gráfico abaixo. A
biocapacidade de uma cidade, estado ou nação representa o quanto seus
ativos ecológicos (incluindo terras agrícolas, pastagens, terras
florestais, áreas de pesca e terras construídas) conseguem produzir.
Quando entramos no cheque especial do
planeta, os juros são altos e vêm na forma de escassez de água potável,
erosão do solo, perda de biodiversidade e acúmulo de dióxido de carbono
na atmosfera, com as consequências que já conhecemos: secas
severas, inundações, aumento na quantidade e intensidade dos incêndios
florestais ou furacões. “Para a economia, isso significa grandes
prejuízos e maiores riscos aos investimentos. Para as pessoas, significa
preços mais altos dos alimentos, maiores chances de contrair doenças e
perda de bens e de vidas. Na prática, estamos deixando o mundo mais
poluído, mais inóspito e mais pobre em biodiversidade”, sintetiza Renata
Camargo, especialista em Conservação do WWF-Brasil.
“Há uma percepção equivocada, compartilhada
por alguns, de que o Brasil é país que mais preserva o ambiente no
Planeta e que não teríamos qualquer problema nesse aspecto. No entanto,
vamos entrar no cheque especial dos recursos naturais praticamente junto
com o restante do Planeta. Temos muito o que fazer, a começar por
implementar com mais rigor as regras de proteção ambiental que
construímos ao longo das últimas décadas, as quais ainda são muito
frequentemente deixadas de lado”, alerta Raul do Valle, do WWF-Brasil.
O que é a Pegada Ecológica
Do lado da demanda, a Pegada Ecológica mede
a quantidade de área terrestre e marinha necessária para produzir todos
os recursos consumidos por uma população e para absorver seus resíduos.
“O uso de combustíveis fósseis no sistema de transporte e o desperdício
de alimentos estão entre os principais vetores de pressão da demanda
por recursos naturais no Brasil”, explica Camargo.
Um componente importante da Pegada
Ecológica é a Pegada de Carbono, que representa a área de terra
necessária para sequestrar as emissões de dióxido de carbono geradas
pela queima de combustíveis fósseis, desmatamento e outras fontes, como
produção de cimento e fermentação entérica de bovinos, por exemplo.
Atualmente, a pegada de carbono representa 60% da Pegada Ecológica total
da humanidade e é também a parte de crescimento mais rápido. Porque
estamos emitindo dióxido de carbono no ar a uma taxa muito mais rápida
do que pode ser absorvido, ele está se acumulando na atmosfera e no
oceano. Ou seja, o aumento em nossa Pegada de Carbono é o principal
impulsionador da crise climática, que é o resultado mais conhecido –
junto com a perda de biodiversidade – de nosso gasto ecológico
excessivo. Portanto, reduzir significativamente a pegada de carbono é um
passo essencial tanto para reduzir nossa pegada ecológica como também
para mitigar a crise climática.
O conceito de Dia de Sobrecarga da Terra
foi concebido pela primeira vez por Andrew Simms, da New Economics
Foundation, entidade britânica de consultoria, que se associou à Global
Footprint Network em 2006 para lançar a primeira campanha global sobre o
tema. O WWF participa desde 2007.
A Pegada Ecológica Global e as métricas de
biocapacidade são calculadas anualmente nas Contas da Pegada Nacional e
Biocapacidade. Utilizando as estatísticas da ONU, essas contas
incorporam os dados mais recentes e a metodologia contábil mais
atualizada. Para manter a consistência com os dados e a ciência
relatados mais recentes, as métricas da Pegada Ecológica de todos os
anos desde 1961 são recalculadas a cada ano, de modo que as métricas de
cada ano compartilham um conjunto de dados comum e exatamente o mesmo
método contábil
Dicas para reduzir a pegada ecológica
Se conseguirmos postergar
o Dia de Sobrecarga da Terra em cinco dias a cada ano, em menos de três
décadas estaremos dentro dos limites do planeta antes. Todo mundo pode
ajudar:
Em Casa: Desligue
sempre as luzes e os eletrodomésticos que não estão em uso; limite o
tempo do banho; prefira iluminação e ventilação naturais; recicle seu
lixo; faça uma composteira doméstica, diminuindo o lixo orgânico; sempre
que possível, deixe o carro na garagem e saia a pé, de bicicleta ou
transporte público; aproveite a cidade e peça menos delivery (diminuindo
o uso de embalagens), opte por um filtro ou beba água da torneira,
diminua o uso do ar condicionado.
Ao fazer compras: Evite
fazer compras por impulso ou desnecessárias, opte por produtos
não-descartáveis e maior durabilidade; evite trocas periódicas de
equipamentos (celular, por exemplo), escolha produtos naturais, frescos e
com menos embalagens. Sempre que possível, compre do produtor local, o
que evita gastos de energia para transporte e armazenamento. Prefira
frutas da época e evite peixes na lista vermelha de extinção. Não compre
produtos que tenham microesferas de plástico, como algumas pastas de
dente ou esfoliantes.
No trabalho: Faça grupos
de carona; desligue luzes e monitores sempre que não estiverem sendo
usados; traga sua caneca de casa e diminua/ elimine o uso de copos
descartáveis; desligue o ar condicionado quando não for necessário; vá
de bicicleta, a pé ou transporte público; quando for viável opte por
reuniões pela internet (em vez de atravessar a cidade ou viajar);
imprima somente o necessário, optando por diminuir os processos que
necessitam de papel.
Sobre o WWF-Brasil
O WWF-Brasil é uma organização da sociedade
civil brasileira, apartidária e sem fins lucrativos, que trabalha em
defesa da vida com o propósito de mudar a atual trajetória de degradação
ambiental e promover um futuro no qual sociedade e natureza vivam em
harmonia.
Criado em 1996, o WWF-Brasil integra a Rede
WWF (Fundo Mundial para a Natureza), presente em mais de 100 países. O
objetivo da rede é alterar a trajetória das curvas de perda de
biodiversidade e do aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE)
– ou seja, conter a extinção de espécies e o desaparecimento de
ecossistemas, assim como mitigar os principais causadores das mudanças
climáticas. Soma-se a esses desafios a crescente demanda por alimentos e
por recursos naturais em todo o planeta, acarretando na necessidade de
promover o uso racional de tais recursos e uma produção sustentável de
alimentos.
Apoie nosso trabalho: https://wwf.org.br/doe
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