quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Administrações Regionais-Feudo de deputados distritais.


Serviço público

Feudo de deputados distritais

Levantamento feito pelo Correio mostra que 76% dos cargos das administrações regionais são ocupados por apadrinhados políticos, especialmente de parlamentares. Custo da máquina é desproporcional aos investimentos nas cidades

Área carente do Varjão: a cidade tem em sua administração apenas um concursado e 67 cargos de confiança
Criadas para aproximar o governo da comunidade e descentralizar as ações do poder público, as administrações regionais se transformaram em um cabide de empregos para funcionários comissionados indicados por políticos, principalmente por deputados distritais. Levantamento feito pelo Correio mostra que 76% dos cargos nas 31 administrações são ocupados por apadrinhados que não passaram por concurso público. Dos 3.526 contratados por esses órgãos, 2.692 foram indicados por critérios políticos, sem passar por seleção pública. Às vésperas de ano eleitoral, esse exército de comissionados é ainda mais valioso. O inchaço tem custos pesados: o gasto com pessoal supera os investimentos nas cidades realizados pelas administrações.

O orçamento das administrações regionais para este ano é de R$ 382,6 milhões. 
A previsão é de que a folha de pagamentos consuma 40% desse valor — um total de R$ 156 milhões. Para investimentos, como pequenas obras e melhorias para as regiões, o GDF previu R$ 146 milhões. 

 Em algumas administrações, como a de Brasília, os gastos com funcionários somam quase quatro vezes os recursos reservados para investimentos. No Plano Piloto, apenas 23 dos 168 servidores são concursados. O salário desses contratados custará aos cofres públicos R$ 6,1 milhões este ano. Para infraestrutura e benfeitorias, a verba é de R$ 1,6 milhão.

No Lago Norte, a manutenção da estrutura e do corpo de contratados também tem custo alto. A administração da cidade, localizada em uma das áreas mais nobres da capital federal, gasta quase 15% do orçamento só para pagar aluguel do prédio onde funciona a estrutura administrativa. Foram R$ 825 mil de locação e condomínio nos últimos 12 meses. Para investimento, está previsto pouco a mais do que isso: R$ 1,3 milhão.

O prefeito comunitário do Lago Norte, Dyonélio Francisco Morosini, reclama da falta de autonomia e de recursos da administração. “Uma parte dos impostos que os moradores do lago pagam deveria ir diretamente para a administração, para que fossem revertidos em benefícios para nossa região. Do jeito que as coisas funcionam, a administração é uma mera encaminhadora de pedidos ao governo. Não há recursos nem autonomia para realizar as obras que os moradores precisam”, reclama Morosini. “Além disso, a população deveria ter participação na escolha dos administradores. O governador escolhe sem ouvir a comunidade e, muitas vezes, indica pessoas que sequer moram na nossa região”, acrescenta o líder comunitário.

Média

A média de funcionários concursados é de 25% em todas as administrações, mas há casos extremos como a do Varjão, que emprega um único servidor concursado e 67 comissionados. O administrador da cidade, José Ricardo do Nascimento, diz que essa estatística não atrapalha os trabalhos. “Quem ocupa o cargo tem que ter a responsabilidade de fazer o que tem que ser feito e aqui as pessoas encaram isso com seriedade. O que não pode faltar é a prestação de serviço à comunidade e, enquanto não sai concurso do governo, trabalhamos dessa forma”, explica José Ricardo, que foi indicado diretamente pelo governador Agnelo Queiroz. Para ele, o orçamento anual de R$ 1,1 milhão em 2013 não é insuficiente. “O Varjão tem apenas 9,5 mil moradores. Temos recursos para obras emergenciais e para executar prioridades da população, como quadras, calçadas ou reforma de escolas”, finaliza.

A nomeação de administradores regionais, além de abrir um leque gigantesco de cargos para acomodar aliados, também costuma alavancar personalidades das cidades para a política. O vice-governador Tadeu Filippelli (PMDB) e os deputados distritais Rôney Nemer (PMDB) e Alírio Neto (PEN), por exemplo, já foram administradores regionais antes de ganharem destaque na política local. O administrador de Ceilândia, Ari de Almeida, nega que o cargo tenha finalidade estritamente política. “São poucas as pessoas que começaram como administradores regionais e que ganharam projeção política na cidade. Recebemos muita cobrança da população e trabalhamos muito”, comenta Ari. Ele afirma que consegue driblar a falta de autonomia. “Aqui em Ceilândia, temos conseguido executar todos os nossos projetos, acho que isso depende muito do administrador”, acrescenta.

Previsão legal

A Lei Orgânica determina que o número de servidores concursados deve representar pelo menos 50% do quadro total do governo. No último levantamento, houve melhorias significativas, mas o GDF ainda não havia conseguido alcançar esse patamar. O número de servidores efetivos ocupantes de cargo em comissão passou de 60,6%, em 2011, para 54,8%, no ano passado. Apesar da queda do percentual, ainda falta ampliar o número de concursados para chegar ao patamar de 50%.

A Lei Orgânica do DF, sancionada em 1993, prevê a participação popular na escolha dos administradores . Mas, até hoje, a indicação continua sendo estritamente política. Em julho, o Ministério Público do DF e Territórios recomendou ao GDF que envie à Câmara Legislativa um projeto normatizando a participação popular no processo de escolha dos administradores regionais.

O Tribunal de Contas do DF também questiona o modelo. Na decisão em que aprovou as contas do governo de 2012 com ressalva, em junho, a Corte cobrou mudanças nas cidades. Segundo relatório do TCDF, “as ações empreendidas pelas administrações regionais foram insuficientes para garantir o cumprimento do papel institucional de representação do GDF como agente de descentralização e promoção de serviços públicos de sua competência”. Ainda segundo esse levantamento, “as vias pavimentadas e logradouros públicos não estavam adequadamente mantidos”. Até mesmo as atividades de aprovação de projetos e alvarás de obras e comércio, que são hoje as principais atuações das administrações, foram criticadas.

O coordenador das Cidades do GDF, Francisco Machado, explica que os administradores são os representantes do governador nas regiões. “É verdade que há dificuldades e que os recursos são limitados, mas uma boa administração é suficiente para gerir a cidade, manter a região limpa e com equipamentos conservados.”

Sobre o debate a respeito da ampliação da participação popular na escolha dos administradores, o coordenador afirma que Agnelo privilegia moradores das cidades e que ouve sempre a comunidade. “A participação popular é possível. A Lei Orgânica esboçou isso, mas nunca foi experimentado. Se houver toda essa autonomia que alguns defendem, daqui a pouco, haverá até Câmara de Vereadores , com mais gastos e burocracia. (HM).
Por Helena Mader
Fonte: Correio Braziliense - 01/09/2013
 
OPINIÃO Capitanias hereditárias do DF

8 de dezembro, 2013

Por Ricardo Callado -  O sistema de partilha de poder no Distrito Federal remete as capitanias hereditárias. É arcaico. Pernicioso. E fere a representativa democrática. As capitanias hereditárias foi um sistema de administração territorial criado pelo rei de Portugal, D. João III, em 1534.
Este sistema consistia em dividir o território brasileiro em grandes faixas e entregar a administração para particulares. Principalmente nobres com relações com a Coroa Portuguesa. O objetivo era o de colonizar o Brasil, evitando assim invasões estrangeiras. Ganharam o nome de Capitanias Hereditárias, pois eram transmitidas de pai para filho.

Estas pessoas que recebiam a concessão de uma capitania eram conhecidas como donatários. Tinham como missão colonizar, proteger e administrar o território. Por outro lado, tinham o direito de explorar os recursos naturais (madeira, animais, minérios). No DF, são conhecidos como deputados distritais.  

Em pleno século 21 algo parecido ainda existe no País. O Maranhão, dos Sarneys; o Pará dos Barbalhos; as Alagoas, dos Calheiros; o Ceará, dos Gomes, são alguns exemplos. No Distrito Federal as capitanias hereditárias tem outro nome: administrações regionais. 

A eleição direta para administrador regional é um passo que precisa ser dado. Não se pretende dividir o DF. A Constituição de 1988 estabeleceu que o DF é indivisível. Não pode ter municípios.

Não se deve continuar com o sistema onde os governadores passaram a dar a deputados o “direito” de nomear administradores regionais. Os paus-mandados indicados trabalham mais em prol do parlamentar-padrinho do que propriamente na população. 

Algumas propostas estão em discussão. Na quarta-feira (04), a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que garante eleições diretas. De autoria do senador Rodrigo Rollemberg (PSB), a PEC 29/2011 segue para o Plenário do Senado.
Sendo aprovada, os administradores regionais deverão ter domicílio eleitoral na região há pelo menos um ano, como prevê a Lei Eleitoral. Grande parte dos administradores atuais sequer moram na cidade que administram. 

Outras duas propostas são de autoria da deputada distrital Eliana Pedrosa (PPS) e do deputado federal Luiz Pitiman (PSDB). Nelas, se propõe a criação de conselhos comunitários por onde passariam os nomes do atuais administradores.

A discussão é antiga. Veio a tona com o avanço das propostas apresentadas. E com os recentes escândalos em administrações regionais. Desde o ano passado ocorreram casos envolvendo as administrações de Santa Maria, de Sobradinho e de Águas Claras (caso dos gibis). E com as prisões dos administradores de Taguatinga e Aguas Claras (de novo).

A indicação é um terreno para fértil para a corrupção. O deputado se sente donatário de determinada área. Ali exploram os recursos públicos e ganham dividendos eleitorais. Não muito diferente do que acontecia no século 16.

Quem está no poder pode até torcer o nariz para a proposta. Perde um instrumento de barganha política para formar a base aliada de governo. O toma-la-da-cá. Vai ter que se reinventar para firmar apoios.

Com o tempo o novo modelo deve consolidar-se. E o sistema democrático sempre é o mais adequado. Ganha a cidade, a administração pública e a sociedade.

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