As esperadas mudanças na política econômica são consideradas
positivas para uma retomada da confiança de empresários e consumidores e
da credibilidade do governo, mas não diminuíram as incertezas em
relação a 2015, que ainda deve ser marcado por baixo crescimento e
inflação alta.
Além da lista de "maldades" que deve fazer parte do esperado ajuste
macroeconômico, com provável alta de impostos e corte de benefícios
sociais, uma outra série de fatores, que vão desde a crise hídrica até a
maior fragmentação do Congresso, pode fazer com que o crescimento do
Produto Interno Bruto (PIB) no próximo ano seja menor que a alta de 0,5%
prevista pela média de 20 instituições financeiras e consultorias
ouvidas pelo Valor Data.
Para analistas, a combinação entre políticas fiscal e monetária mais
restritivas deve manter o crescimento da economia em ritmo bastante
vagaroso, com alguma possibilidade de recuperação a partir da segunda
metade do ano. Ainda assim, a inflação deve ficar ainda mais pressionada
em 2015, devido ao realinhamento das tarifas públicas. Segundo a
estimativa média dos analistas consultados, o Índice Nacional de Preços
ao Consumidor Amplo (IPCA) terá alta de 6,6% no período, 0,1 ponto
acima, portanto, do teto da meta perseguida pelo Banco Central, de 6,5%.
Esse cenário já embute os efeitos do ciclo de aperto monetário
iniciado pelo BC em outubro, que, na expectativa mediana dos
economistas, deve levar a taxa Selic dos atuais 11,75% ao ano para 12,5%
ao ano no fim de 2015.
Entre os ajustes previstos, porém, o mais desafiador é o fiscal, dado
que a novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, se comprometeu a entregar
um superávit primário de 1,2% do PIB depois de um ano que pode terminar
com déficit nas contas públicas. Para os analistas consultados, a
economia para pagar o serviço da dívida chegará a 0,9% do PIB no ano que
vem, nível que não vai estabilizar a trajetória de aumento da dívida
bruta, mas que é visto como suficiente para evitar a perda do grau de
investimento.
Se, do lado doméstico, a necessidade de reequilibrar as contas
públicas e reduzir a inflação colocará um freio sobre a atividade
econômica, tampouco o governo pode contar com ajuda do ambiente externo
em 2015. Em um contexto de deterioração da economia argentina,
desaceleração da China, uma nova crise russa, queda dos preços das
commodities e normalização da política monetária pelo Fed (Federal
Reserve, o banco central americano), a recuperação dos Estados Unidos e o
real mais desvalorizado não são vistos como grandes impulsos ao
comércio exterior.
Mesmo que as medidas econômicas do novo governo ainda não tenham sido
formalmente divulgadas, Cristiano Souza, do Santander, avalia que não
haverá muitas surpresas vindas dessa esfera. As ações para elevar o
superávit primário devem consistir, basicamente, em alta de impostos e
alguma contenção de despesas, com corte de investimentos federais, por
exemplo. A grande dúvida, segundo Souza, é quando os ajustes vão
começar, já que algumas decisões fiscais precisam passar pelo Congresso e
a base aliada do PT a partir de 2015 será menor, o que pode atrapalhar o
andamento do ajuste fiscal.
Assumindo que os aumentos de impostos e redução de gastos venham em
tempo hábil, Souza estima que o resultado primário do setor público será
de 0,8% do PIB no próximo ano, número que, de acordo com ele, será uma
indicação positiva às agências de classificação de risco de que o
governo está se movendo para melhorar o quadro fiscal. "O fato de Levy
ter prometido um superávit de 2% para 2016 e caminhar para cumpri-lo já é
uma indicação para as agências esperarem um ou dois anos", disse.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, é menos otimista.
Em sua avaliação, as denúncias de corrupção na Petrobras podem afetar
negativamente a percepção dos investidores internacionais sobre o país, o
que tem potencial de aumentar o risco-Brasil. Ao lado do escândalo, o
crescimento pífio, que deve se manter ao menos pelos próximos dois anos,
não afasta totalmente do horizonte o rebaixamento da nota de crédito,
diz Vale, mesmo com resultados fiscais um pouco maiores.
A situação delicada na estatal do petróleo e o envolvimento das
principais empreiteiras do país na Operação Lava-Jato podem ter impacto
negativo também nos investimentos domésticos. Alessandra Ribeiro, da
Tendências, espera uma alta de 1,1% da Formação Bruta de Capital Fixo
(FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e na
construção civil) em 2015, após o tombo de cerca de 7% esperado para
este ano. "Anteriormente, diante da expectativa de retomada da confiança
com a indicação de Joaquim Levy para a Fazenda, tínhamos uma alta até
maior, de 2,4%", comentou.
Com as denúncias envolvendo a estatal e a forte queda do petróleo nos
mercados internacionais, porém, Alessandra reduziu suas estimativas. "O
plano de investimento da Petrobras, de cerca de R$ 100 bilhões ao ano,
representa quase 10% do investimento do país, então qualquer corte abala
a formação de capital físico", diz.
Apesar dessa influência negativa, ela acredita que as chances de o
país atravessar uma recessão em 2015 por causa dos ajustes
macroeconômicos são ainda limitadas. Por enquanto, a consultoria estima
alta de 0,6% do PIB, influenciada sobretudo por aumento de 0,8% do
consumo das famílias, dado que os ganhos de renda ainda sustentam certa
expansão do comércio e dos serviços, mesmo em desaceleração.
Por outro lado, a expectativa de que parte das pessoas que deixaram
de procurar uma ocupação neste ano voltem ao mercado, depois de um ano
de redução nos ganhos salariais, deve elevar o desemprego. Segundo
Souza, do Santander, dois vetores devem fazer com que a taxa de
desemprego nas seis principais regiões metropolitanas do país aumente de
4,9% neste ano para cerca de 5,5% no próximo ano: a indústria, que já
vem dispensando mão de obra, e uma pressão maior da População
Economicamente Ativa (PEA). (Valor Econômico)
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