Dez anos após ter entrado em vigor, o Protocolo de Kyoto tem um diagnóstico claro: o acordo fracassou em reduzir as emissões mundiais de gases-estufa, que cresceram 16,2% de 2005 a 2012.
O pacto internacional, porém, não foi de todo inócuo e teve certo sucesso em conscientizar a sociedade e implantar projetos ambientais, tecnológicos e de desenvolvimento econômico para prevenir o agravamento do aquecimento global.
Concluído em 1997 em Kyoto, no Japão, o protocolo estabelecia metas de redução das emissões de gases-estufa. Só em 2005 ele adquiriu força para entrar em vigor, com a ratificação pela Rússia.
O protocolo teve 189 ratificações, entre elas a do Brasil, em 2002. Mas suas novas metas de redução de emissões de 2013 a 2020, estabelecidas em 2012 no Qatar só tiveram até agora 23 adesões.
Em um balanço, a secretaria da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC) destacou que 37 países, a maioria da União Europeia, superaram sua meta de reduzir em 5% suas emissões até 2012.
A agência, contudo, deixou de lado os números do aumento global das emissões e o alerta enfático feito em 2014 por seu braço científico, o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática): não há mais tempo para reduzir a concentração de gases-estufa para que o aumento médio da temperatura da superfície terrestre até 2100 seja inferior a 2ºC.
Essa elevação traria como consequência mais secas, derretimento de geleiras e inundações de zonas costeiras pela elevação dos oceanos.
Para evitar esse cenário, seria preciso estabilizar as emissões até 2020 e reduzir as emissões em 80% até 2050.
PERDAS E GANHOS
"Estou convencida de que sem o protocolo de Kyoto não estaríamos avançados como hoje na crescente penetração das energias renováveis", disse Christiana Figueres, secretária-executiva da UNFCCC.
Figueres também destacou como resultados positivos do protocolo cerca de 7.800 projetos de apoio a países em desenvolvimento, envolvendo benefícios de até US$ 13,5 bilhões para reduzir emissões por desmate e para "sequestro de carbono" da atmosfera por meio de recuperação e ampliação de florestas e e outras ações, inclusive com transferência de tecnologia e geração de empregos.
"Se olharmos quantitativamente para as emissões, o protocolo falhou. Mas sem ele a União Europeia não teria atingido grandes avanços nas reduções", diz o meteorologista Carlos Nobre, que na semana passada deixou o cargo de secretário de Políticas e Programas de Pesquisas e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, e assumiu o de diretor do Cemaden (Centro de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais), em também do governo federal.
Nobre ressalta que a Alemanha mostrou que é possível reduzir os gases-estufa sem diminuir seu PIB. "Vejo com otimismo esse efeito pedagógico", disse Nobre.
Já para o físico da USP e membro do IPCC Paulo Artaxo, ainda que o tratado tenha aumentado a adesão de novas tecnologias e a conscientização para o que ele chama de "problema mais sério já enfrentado pela humanidade", houve, além do aumento da concentração de carbono na atmosfera, acúmulo de CO2 nos oceanos, o que pode causar desequilíbrios para a vida marinha.
Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress | |||
Segundo Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, a próxima conferência do clima, em dezembro, em Paris, poderá ter avanços graças ao recente acordo entre EUA (que assinaram mas não ratificaram o Protocolo de Kyoto) e China. Juntos, os dois países são responsáveis por cerca de 45% das emissões globais de carbono.
Para ele, um dos grandes desafios para os governos, inclusive o do Brasil, é o planejamento econômico e energético. Ele afirma que isso ainda é feito sem assimilar as mudanças climáticas, e a atual crise energética e hídrica do país é prova disso.
Fabio Feldmann, secretário-executivo do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas e de Biodiversidade e ex-secretário estadual do Meio Ambiente de São Paulo, afirma ainda que a redução de desmatamentos no Brasil criou uma "falsa impressão" de que o país pode continuar com os mesmos níveis de emissões em outros setores.
De fato, enquanto as emissões por desmates no país diminuíram 64% de 2005 a 2013, as das atividades agropecuárias e do consumo de energia cresceram, respectivamente, 6% e 42%, segundo o Observatório do Clima. A queda nas taxas anuais de devastação florestal foi determinante para a redução de 33% das emissões totais brasileiras de CO2 no mesmo período.
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