José
Dirceu se enrolou um pouquinho mais com a delação premiada de Milton
Pasco- witch. Milton é lobista, e foi o res- ponsável pela apro- ximação
da em- preiteira Engevix com o PT.
Acontece que, entre 2011 e 2012, a
empresa de Milton pagou R$ 1,4 milhão para a empresa de consultoria de
José Dirceu, exatamente quando o ex-ministro era réu do mensalão. A
Engevix pagou diretamente a Dirceu outro R$ 1,1 milhão, entre 2008 e
2011. Dirceu saiu do governo e teve seu mandato de deputado cassado em
2005.
A Jamp, apesar de movimentar esses valores, não tem funcionários. Ela também repassou R$ 1,2 milhão, em 2013, à assessoria D3TM, de Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobrás, cargo para o qual foi indicado por José Dirceu. A Engevix também fez pagamentos diretos à D3TM, em 2014. Ou seja, desde a denúncia de Roberto Jefferson em 2005, a abertura de processo em 2006 e a condenação em 2012, a sanha de José Dirceu por propina só fez aumentar.
A JD foi aberta em 1998, mas só depois do escândalo José Dirceu começou a trabalhar como consultor – a JD auferiu R$ 39 milhões entre 2006 e 2013. Diante disso, é um detalhe quase humorístico a campanha que José Dirceu fez junto à militância petista para pagar sua multa no processo do mensalão, no valor de R$ 971 mil. Em 10 dias, Dirceu recebeu mais de R$ 1 milhão, em fevereiro de 2014 – ou seja, enquanto as torneiras das empreiteiras ainda estavam bem abertas para ele.
Mas o que tem Dilma a ver com isso? Fora o fato de que um outro delator, Ricardo Pessoa, do grupo UTC, finalmente trouxe as campanhas de Dilma em 2010 e 2014 , além de implicar os ministros Mercadante e Edinho Silva, houve a declaração de Dilma ontem, 2ª. feira, em visita aos EUA, de que “não respeita delatores”.
A fala de Dilma, para não variar, foi bastante estranha. Depois da “mulher sapiens” e da comunhão da mandioca na semana passada, Dilma comparou a denúncia de Ricardo Pessoa à de Joaquim Silvério dos Reis na Inconfidência Mineira, no século 18. E a si mesma que, mesmo torturada, não denunciou seus companheiros de guerrilha, no início da década de 1970.
São situações muito diferentes, obviamente. A Inconfidência Mineira passou à história como um momento de grande heroísmo patriótico, contra a Coroa portuguesa. E Dilma evidentemente se reconhece na guerrilha brasileira dos anos 60-70 – sua foto de campanha em 2014, a do “coração valente”, remete à sua participação na luta armada.
Ora, nesse caso, o delator Ricardo Pessoa estaria “traindo” que tipo de luta heróica? Em benefício de Dilma, digamos que ela pode sim ser honesta, e ter se empenhado em desmontar (na medida do possível) os dispositivos de corrupção que herdou da época de José Dirceu e dos governos Lula.
Dirceu é um dos artífices do PT (que conduziu com mão de ferro) e da primeira eleição de Lula; seria o nome natural para pleitear a presidência em 2010. Homem de enorme determinação e sangue frio, passou por uma operação plástica em Cuba, em 1975, e voltou clandestino ao Brasil, onde foi casado por anos com uma mulher que não sabia quem ele era. Depois da anistia, em 1979, reverteu a operação e retomou as atividades políticas, culminando na fundação do PT.
Para sua formação leninista, o respeito às regras do “estado burguês” é uma bobagem. Não duvido que Dirceu seria capaz de dar ótimas explicações para todo o dinheiro “expropriado” do estado e das empreiteiras. Mas Dilma, que herdou quase acidentalmente boa parte do poder de Dirceu no governo Lula, inclusive a indicação para a sucessão, não reza pela mesma cartilha.
Por isso mesmo é estranho que ela compare a corrupção petista à Inconfidência Mineira, e mesmo à guerrilha. Essa última, se teve erros políticos catastróficos, nunca perdeu uma certa dignidade idealista, não se misturando aos ladrões de galinha. A denúncia premiada, ao contrário da tortura no tempo da ditadura, é uma prática juridicamente reconhecida – em lei que foi sancionada pela própria Dilma, em 2013. A “presidenta” está abusando de seu direito à confusão conceitual.
Dilma, mesmo se
for honesta, vai acabar pagando pela “flexibilidade” de Lula e de Dirceu
no trato com a coisa pública – não haverá estratégia eficiente para descolá-la dessas práticas,
e não ajuda nada ela passar esse recibo de que é feita da mesma
matéria.
Um dos inconfidentes, Tomás Antonio Gonzaga usava o nome poético de Dirceu – mas o Dirceu deles não é o nosso.
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Um dos inconfidentes, Tomás Antonio Gonzaga usava o nome poético de Dirceu – mas o Dirceu deles não é o nosso.
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