terça-feira, 23 de agosto de 2016

Despoluição da Guanabara não despoluiu nada – e ainda estamos pagando juros




O primeiro programa de despoluição começou em 1994. Ele não despoluiu a baía e resultou no pagamento de R$ 700 milhões em juros. O segundo, atualmente em andamento, não baterá a meta

BRUNO CALIXTO
29/07/2016 - 08h00 - Atualizado 29/07/2016 22h20
Trabalhadores retiram o lixo retido na "eco-barreira" na entrada da Baía de Guanabara, em Duque de Caxias, no Rio (Foto: YASUYOSHI CHIBA / AFP)


Em 2009, o então governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, prometeu o que seria talvez um dos maiores legados da Olimpíada para o Rio: tratar 80% do esgoto despejado na Baía de Guanabara. Hoje, às vésperas do início dos Jogos, estamos longe desse número. O Rio criou infraestrutura para tratar 48% do esgoto. Porém, por falta de tubulações, menos de 40% é realmente tratado. A maior parte do esgoto segue sendo despejada na Baía de Guanabara. De todas as decepções com a Olimpíada do Rio, a falta de um legado para a Guanabara é o mais triste.


>> Promessas ambientais da Olimpíada ficaram no papel


A história da despoluição da Guanabara, entretanto, não começa com os Jogos. Políticos cariocas prometem limpar as águas da baía há 20 anos. Não só esses programas falharam, como ainda estamos pagando juros pelo fracasso. Um estudo publicado nesta sexta-feira (29) pela ONG Artigo 19 expõe esses valores. A Artigo 19, uma organização que atua na área de transparência e liberdade de expressão, entrou com pedidos pela Lei de Acesso à Informação para conseguir os dados dos financiamentos da despoluição da Guanabara.


O primeiro projeto começou em 1994, com o nome de Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG). Ele recebeu três financiamentos. Dois foram do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), somando R$ 1,4 bilhão, e um da Japan International Cooperation Agency (Jica), de R$ 1,1 bilhão. Ou seja, o governo do Rio tinha R$ 2,5 bilhões para tratar os esgotos e despoluir a baía. Segundo o relatório, a maior parte do valor foi gasta em Estações de Tratamento de Esgoto. O problema é que elas não estão funcionando em capacidade máxima, faltam ligações domiciliares na região da baía e os municípios vizinhos ficaram de fora do projeto. Isso sem falar em acusações de irregularidades que vão de atrasos a superfaturamento de obras.


Quando o programa terminou, em 2006, a baía não estava despoluída e não foram feitos grandes ganhos em termos de tratamento de esgoto no Rio. Mas houve um legado: o juro dos financiamentos. Os dados do relatório mostram que o Rio já pagou R$ 1,2 bilhão do valor contratado e mais R$ 740 milhões em juros e correção monetária.


Após a falência do primeiro projeto, o Rio iniciou um novo programa, agora chamado de Programa de Saneamento Ambiental dos Municípios do Entorno da Baía de Guanabara (Psam). Esse programa recebeu novo empréstimo do BID, mesmo após o fracasso do projeto anterior. Segundo o relatório, o BID considerou os resultados anteriores como "insatisfatórios", mas deu um voto de confiança para o Rio.


O Psam recebeu mais R$ 1,1 bilhão em 2011, com o objetivo de cumprir a meta de 80% de tratamento de esgoto até a Olimpíada. Essa meta já foi abandonada pela governo. Segundo recente reportagem da Folha de S.Paulo, o governo estima em R$ 12 bilhões o montante necessário para universalizar o saneamento básico na região.


O Psam ainda está em andamento, mas o temor de que ele também fracasse, deixando apenas uma grande dívida, é grande. "Para que o Psam seja efetivo, é imprescindível um rigor maior na fiscalização e monitoramento nos gastos do dinheiro público e, para isso, a transparência do uso dos recursos se faz necessária", diz o relatório.



O texto também fez uma avaliação dos mecanismos de transparência nos programas de poluição. O estudo pode ser encontrado, na íntegra, no site da organização a partir desta sexta-feira.

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