“Uma pessoa é rica na proporção do número de coisas de que ela é capaz de abrir mão”Duzentos anos do nascimento de Henry Thoreau (1817-1862)
[EcoDebate]
A cada ano, a humanidade esgota mais cedo a cota apropriada da riqueza
natural do planeta. Com base em estatísticas oficiais de 150 países, a
Global Footprint Network registra que entre o dia primeiro de janeiro e o
segundo dia de agosto de 2017, os humanos utilizaram toda a
biocapacidade anual do Planeta. Ou seja, o dia 02 de agosto de 2017 é o
Dia da Sobrecarga da Terra (Earth Overshoot Day), do corrente ano.
Este
dia marca o momento em que o sistema de produção e consumo absorveu
todos os insumos naturais oferecidos pelo planeta, previstos para os 12
meses do ano. Portanto, o dia 02 de agosto é o dia em que a civilização
global sai do verde do superávit ambiental para entrar no vermelho do
déficit ambiental.
No
restante do ano, a civilização estará no cheque especial e terá de
recorrer à herança deixada por milhões de anos de evolução da natureza.
Significa que as atuais gerações dilapidarão as condições de vidas das
demais espécies vivas da Terra e comprometendo o futuro das próximas
gerações de humanos.
O
cálculo da Sobrecarga é feito a partir de duas medidas realizadas para
se avaliar o impacto humano sobre o meio ambiente e a disponibilidade de
“capital natural” do mundo. A Pegada Ecológica é uma metodologia de
contabilidade ambiental que permite avaliar a demanda humana por
recursos naturais, com a capacidade regenerativa do planeta. A Pegada
Ecológica de uma pessoa, cidade, país ou região corresponde ao tamanho
das áreas produtivas de terra e mar necessárias para gerar produtos,
bens e serviços que utilizamos. Ela mede a quantidade de recursos
naturais biológicos renováveis (grãos, vegetais, carne, peixes, madeira e
fibra, energia renovável entre outros) que estamos utilizando para
manter o nosso estilo de vida.
O
cálculo é feito somando as áreas necessárias para fornecer os recursos
renováveis utilizados e para a absorção de resíduos. É utilizada uma
unidade de medida, o hectare global (gha), que é a média mundial para
terras e águas produtivas em um ano. A Pegada Ecológica serve para
avaliar o impacto que o ser humano exerce sobre a biosfera. A
Biocapacidade avalia o montante de terra e água, biologicamente
produtivo, para prover bens e serviços do ecossistema à demanda humana
por consumo, sendo equivalente à capacidade regenerativa da natureza.
A
cada ano o mundo atinge mais cedo o ponto de Sobrecarga e passa mais
tempo no déficit ambiental, como pode ser visto na tabela abaixo:
Ano
|
Dia da Sobrecarga
|
1987
|
19 de dezembro
|
1995
|
21 de novembro
|
2000
|
01 de novembro
|
2007
|
26 de outubro
|
2008
|
23 de setembro
|
2015
|
13 de agosto
|
2017
|
02 de agosto
|
Quando
o Dia da Sobrecarga acontecer em 01 de julho é porque a humanidade
utilizará dois planetas para atender seu padrão de consumo. Os 7,5
bilhões de habitantes já dominam e exploram o Planeta com o nível de
bem-estar atual. Mas como a população mundial está crescendo e o nível
do consumo cresce ainda mais, a sobrecarga aumenta, assim como o déficit
ambiental. O gráfico acima mostra que são os países com maiores níveis
de IDH (países mais ricos) que mais impactam a pegada ecológica.
Sabendo
que, coletivamente, o mundo está consumindo muito mais do que o planeta
pode sustentar, a Global Footprint Network (GFN) descreve quatro
prioridades para reduzir a pegada ecológica:
1. Descarbonização
O
uso de energia intensa em carbono é responsável por 60% da pegada
ecológica global. Segundo a estimativa da GFN, reduzir o componente de
carbono da Pegada Ecológica global em 50% levaria a reduzir os recursos
de 1,7 Terra para 1,2 Terra, ou mover a data do Dia da Sobrecarga para
frente em 89 dias, ou para 30 de outubro.
2. População
A
GFN considera que não podemos ignorar o crescimento da população se
estamos verdadeiramente empenhados em garantir vidas seguras em um mundo
de recursos finitos. Portanto, é preciso evitar a gravidez indesejada e
universalizar os serviços de saúde sexual e reprodutiva para viabilizar
a redução do tamanho médio global das famílias.
3. Produção e consumo de alimentos
Pelo
cálculo da GFN, o abastecimento de alimentos localmente, evitando
alimentos altamente processados, reduzindo o consumo de carne e cortando
o desperdício de alimentos pela metade reduziria a pegada ecológica e
moveria o Dia da Sobrecarga para frente em 11 dias.
4. Ambiente urbano construído
A
GFN estima que o aumento da eficiência energética do ambiente urbano
construído, adotando medidas para favorecer o transporte coletivo
eficiente poderia adiar o Dia da Sobrecarga em dois dias.
Atingindo
essas quatro prioridades, levaríamos o Dia da Sobrecarga para 13 de
dezembro e quase estaríamos em equilíbrio com a capacidade da Terra
sustentar a civilização. O fato é que o rumo atual do mundo civilizado é
insustentável, pois a economia não pode ser maior do que a ecologia. O
progresso humano não pode ocorrer às custas do regresso ambiental. Ou
abandonamos a mentalidade antropocêntrica e adotamos a ética
biocêntrica, ou a Terra ficará, progressivamente, cada vez mais inóspita
e inabitável.
José Eustáquio Diniz Alves,
Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor
titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas
Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE;
Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail:
jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 31/07/2017
"O Dia da Sobrecarga da Terra acontece cada vez mais cedo: 02/08/2017, artigo de José Eustáquio Diniz Alves," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 31/07/2017, https://www.ecodebate.com.br/2017/07/31/o-dia-da-sobrecarga-da-terra-acontece-cada-vez-mais-cedo-02082017-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/.
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