Coordenador do Grupo de Economia do Meio Ambiente da UFRJ destaca o potencial das unidades de conservação para aumentar a receita dos municípios e limitar o efeito de desastres naturais
Renato Grandelle
“Para nós, que estamos no Sudeste, a Mata Atlântica parece mais importante, como se o desmatamento de 100 hectares do bioma fosse tão ou mais grave do que a perda de 10 mil hectares da Amazônia”
Alguns ambientalistas falam da dificuldade para entender aquilo que mais chama a atenção da sociedade: a preservação do meio ambiente ou o desenvolvimento econômico. Como responder?
Não existe esse antagonismo. Estamos acostumados com uma visão míope sobre o que é a atividade econômica. Temos a tendência de pensar que desenvolvimento e evolução da cidade são ligados somente à relação de trabalho ou à sua estrutura física. Um exemplo é a mobilidade. Muitas vezes acreditamos que, quanto mais pessoas usam um meio de transporte, maior o progresso, mas não pensamos nos efeitos colaterais, como os congestionamentos que consomem horas que poderiam ser dedicadas a outras atividades. Também enfrentamos cada vez mais baixas na mão de obra devido aos danos à saúde provocados pela poluição atmosférica. Por isso, nunca podemos falar da economia sem considerar as questões ambientais.
E estamos ignorando esta ligação?
Sim. Começou na exploração da Mata Atlântica, depois do Cerrado e agora da Amazônia. Como vivemos em um país de dimensões continentais, existe uma sensação de abundância, parece que nossos recursos são infinitos. É o caso do setor agropecuário, que pega cada vez mais terras e cujo crescimento do PIB foi significativamente superior à média nacional. Sua expansão, no entanto, não resultou em mais empregos. Em 2000, a atividade gerava 16,7 milhões de ocupações. Em 2014, eram 14,2 milhões, uma queda de 13%. Vale lembrar que esta exclusão tem raízes históricas. Na época do Brasil Colonial, quem tinha mais mão de obra barata recebia uma fatia maior do território para explorar. Não somos desiguais por coincidência.
De que forma estamos nos adaptando às mudanças climáticas?
As alterações do clima impactam até 2% do PIB, mas não fazemos esforços de mitigação ou adaptação. Gastamos horrores quando ocorre uma catástrofe, e elas são cada vez mais comuns. Grandes hidrelétricas, pecuaristas e mineradores continuam aprontando problemas e, como não há fiscalização, são estimulados a continuar sua atividade agressiva ao meio ambiente. Desta forma, só existe um destino: se você ficou andando na chuva sem casaco ou guarda-chuva, não diga que pegou gripe por azar.
Na década de 2000, houve um crescimento exponencial na quantidade de unidades de conservação. Este movimento foi reduzido nos últimos anos. Qual é a relação entre este fenômeno e a política e economia do país?
O crescimento foi nos governos de Fernando Henrique Cardoso e Lula, que eram lideranças incontestáveis em seus partidos e, por isso, conseguiram impor uma agenda de crescimento das unidades de conservação. Dilma Rousseff e Temer, por sua vez, nunca revelaram interesse pela área ambiental. A petista acredita que é preciso desmatar para desenvolver e vê a floresta como um empecilho. Por isso, em seu governo houve uma grande expansão do setor hidrelétrico. Temer edita medidas provisórias que facilitam o desmatamento na Amazônia e alimenta a noção de que recebemos mensagens contraditórias sobre o meio ambiente: somos favoráveis aos parques, mas também ao emprego e ao alimento barato. Por que ambos são vistos como opções excludentes?
E como somos afetados por esta mensagem?
Observamos um aumento gradual da importância dos governos estaduais e das prefeituras na política ambiental, enquanto a administração federal perde influência. Por isso, o cenário é cada vez mais heterogêneo. Para nós, que estamos no Sudeste, a Mata Atlântica parece mais importante, como se o desmatamento de 100 hectares do bioma fosse tão ou mais grave do que a perda de 10 mil hectares da Amazônia.
Entre políticas e projetos tão diversos, existe algum exemplo positivo?
O município do Rio de Janeiro tem uma boa gestão, porque os parques estão mais integrados à natureza e à economia da cidade. É o caso do Jardim Botânico, do Monumento das Cagarras, do Pão de Açúcar, do Parque Lage e o do Cantagalo. Obviamente, a crise financeira fluminense afeta assuntos ligados à conservação ambiental e, por isso, vemos problemas como a ocupação do Parque Estadual da Pedra Branca. Haverá uma expansão do desmatamento, sobretudo em regiões que dependem de mais investimentos do Palácio Guanabara, como o Norte do estado. Mas outras cidades já se atentaram sobre a necessidade de desenvolver novos projetos. A crise hídrica ocorrida nos últimos anos afetou profundamente o paulistano, que passou a se preocupar mais com o assunto.
E o que pode ser feito?
As cidades devem discutir o meio ambiente e de que forma ele pode gerar energia. Manter a mata será fundamental para nos defendermos das mudanças climáticas e dos eventos extremos. Os prognósticos alertam que, nas próximas décadas, teremos chuvas menos frequentes, só que mais intensas. E as árvores contribuem para reduzir enxurradas e absorver a água.
A política ambiental pode ser um bom negócio?
Fizemos um estudo sobre o potencial impacto econômico do investimento governamental no Parque da Tijuca. Estimamos que a unidade possa receber 2,9 milhões de visitantes por ano, cujo gasto local seria de R$ 283 por dia — isso se refere ao custo do ingresso e também ao aumento da estadia e alimentação para que as pessoas prolonguem a permanência na cidade, tendo o tempo necessário para explorar a região. Então, o parque pode render de R$ 820 milhões a R$ 1,23 bilhão por ano.
O repórter viajou a convite da ONG Andi - Comunicação e Direitos
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