segunda-feira, 7 de agosto de 2017
O mundo está passando por uma transição da matriz energética, com
declínio relativo dos combustíveis fósseis e aumento das energias
renováveis. O futuro será das energias renováveis ou não haverá futuro,
pois o carvão, o gás e o petróleo são recursos finitos. A energia solar
fotovoltaica tem sido o destaque da nova matriz energética e deve ser a
fonte com maior crescimento nas próximas décadas.
Porém, nem tudo são luzes e brilhos. A lei da entropia vale para todas
as atividades e para todos os tipos de energia. Há muitos insumos
materiais na produção fotovoltaica e a utilização de “terras raras”, que
são minerais não renováveis, caros e controlados por poucos países.
Mas o maior problema é o Pico do Lítio, como mostrei em artigo do ano
passado (Alves, 21/12/2016). As estimativas de reservas de lítio no
início de 2015, estava em algo como 39,5 milhões de toneladas métricas.
As maiores reservas estão na Bolívia, no Chile e no Afeganistão. Para
acompanhar o crescimento da produção atual, as reservas conhecidas
seriam suficientes para cerca de 365 anos de produção global, que está
em cerca de 37 mil toneladas por ano.
Mas se a produção de carros elétricos deslanchar, o fornecimento de
lítio de 365 anos seria reduzido para 17 anos. Ou seja, se houver uma
revolução na matriz energética e as baterias de Íons de Lítio se
generalizarem para os aparelhos eletrônicos, as casas e os carros, então
teremos o Pico do Lítio e haverá uma escassez deste metal raro. Isto
mostra que não é tão fácil avançar na revolução energética e na matriz
100% renovável. As baterias de sódio ainda não decolaram.
Outro problema é o lixo e a poluição gerados pelo descarte dos painéis
solares. Artigo de Mark Nelson (28/06/20017) mostra que este é problema
sério. Por exemplo: a quantidade de desperdício de painéis solares que o
Japão produz todos os anos aumentará de 10.000 para 800.000 toneladas
em 2040 e o país não tem nenhum plano para resolver este problema com
segurança. Somente a Europa exige que os fabricantes de painéis solares
coletem e eliminem o lixo solar no final de suas vidas úteis. Vejamos
alguns números, segundo o autor:
Os painéis solares criam 300 vezes mais resíduos tóxicos por unidade de energia do que as usinas de energia nuclear.
Se a energia solar e nuclear produzirem a mesma quantidade de
eletricidade nos próximos 25 anos que a produção nuclear de 2016, os
resíduos empilhados em campos de futebol, atingiriam a altura da Torre
de Pisa (52 metros), no caso nuclear, e o lixo solar atingiria a altura
de dois Montes do Everest (16 km).
Em países como China, Índia e Gana, as comunidades que vivem perto de
despejos de resíduos eletrônicos muitas vezes queimam os resíduos para
salvar os valiosos fios de cobre para revenda. Uma vez que este processo
requer queima do plástico, o fumo resultante contém fumos tóxicos que
são cancerígenos e teratogênicos (causadores de defeitos congênitos)
quando inalados.
Enquanto os resíduos nucleares estão contidos em tambores pesados e
monitorados regularmente, os resíduos solares fora da Europa hoje
terminam na maior transmissão global de resíduos eletrônicos.
Os painéis solares contêm metais tóxicos como chumbo, que podem
danificar o sistema nervoso, bem como o crómio e o cádmio, carcinógenos
conhecidos. Todos os três são conhecidos por lixiviar os depósitos de
resíduos eletrônicos existentes em fontes de água potável.
Evidentemente, estes problemas terão que ser resolvidos para que a
energia solar se torne uma fonte hegemônica de energia. É claro também
que existem lobbys de outras fontes de produção de energia que querem
desqualificar as energias renováveis. Mas o fato é que não existe
“almoço grátis”, ou seja, vivemos em um mundo sob o domínio do fluxo
metabólico entrópico e não existe panaceia para viabilizar o padrão de
produção e consumo ilimitado da humanidade.
Artigo, Jason Hickel (15/07/2016), da Rede de profissionais de
desenvolvimento global, no jornal The Guardian, mostra que a energia
limpa “não nos salvará – apenas um novo sistema econômico”. Se a
humanidade fizer exatamente o que faz na era dos combustíveis fósseis,
pouco vai resolver os 100% de energia limpa. Apenas as energias
renováveis não evitarão os efeitos dramáticos das mudanças climáticas.
Artigo recente de Gail Tverberg (22/07/2017) mostra que a EROEI da
energia solar e eólica é muito baixa, o que representa um obstáculo no
processo das energias renováveis substituírem os combustíveis fósseis
com a mesma eficiência econômica.
Assim como não é possível ignorar a lei da gravidade, também não é
possível ignorar a lei da entropia. A revolução energética só vai
funcionar se houver decrescimento demoeconômico no mundo e se a pegada
ecológica ficar menor do que a biocapacidade do Planeta.
Referências:
ALVES, JED. O Pico do Lítio e as dificuldades de armazenamento das energias renováveis, Ecodebate, RJ, 21/12/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/12/21/o-pico-do-litio-e-as-dificuldades-de-armazenamento-das-energias-renovaveis-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
Mark Nelson. Are We Headed for a Solar Waste Crisis?, The Energy Collective, 28/06/20017
http://www.theenergycollective.com/energybants/2407383/headed-solar-waste-crisis
Jason Hickel. Clean energy won’t save us – only a new economic system
can, The Guardian, 15/07/2016
https://www.theguardian.com/global-development-professionals-network/2016/jul/15/clean-energy-wont-save-us-economic-system-can
Gail Tverberg. Researchers have been underestimating the cost of wind and solar, 22/07/2017
https://ourfiniteworld.com/2017/07/22/researchers-have-been-underestimating-the-cost-of-wind-and-solar/
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em
demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População,
Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências
Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter
pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Fonte: EcoDebate
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