O que está por trás da Lei do Silêncio
Há muito a Câmara Legislativa do DF pretende afrontar os interesses da população com essa proposta. Ainda em 2015, doze Entidades da sociedade civil do DF divulgaram um Manifesto enumerando 10 (dez) razões pelas quais colocavam-se e ainda se colocam contrárias a esse Projeto de Lei que, em nome da “cultura”, contribui para deteriorar a ordem urbana, o meio ambiente e colocar em a saúde pública dos cidadãos.
Divulgamos abaixo esse Manifesto e registramos aqui questionamento àquela Casa Legislativa: a quem interessa essa proposição, se contraria por todos os motivos expressos no Manifesto, o interesse público?
Que todos os parlamentares candidatos a reeleição e a outros cargos eletivos fiquem atentos pois se não representam a vontade da população, certamente, não terão outra oportunidade para demonstrá-la. Os moradores das Asas Norte e Sul de Brasília, os componentes de Organizações em Defesa do Meio Ambiente e da preservação da ordem urbana, da qualidade de vida de seus habitantes e do meio ambiente urbano de Brasília estão representados nesse Manifesto e estão “de olho em vocês”!!!
MANIFESTO DA SOCIEDADE CIVIL DO DF CONTRA O PL 445/2015 – QUE “ALTERA A LEI DO SILÊNCIO”
1 – Não apresenta fundamentação técnica que justifique o aumento dos atuais limites máximos de pressão sonora no DF para 70dB noturnos e 75dB diurnos, tanto em áreas urbanas como rurais. Aos atuais 50dB noturnos e 55dB diurnos permitidos em áreas urbanas (área mista, predominantemente residencial) se somariam mais 20 decibéis. Em áreas rurais, os limites atuais de 35dB noturnos e 40dB diurnos quase que dobrariam. Na prática, por se tratar de uma escala logarítmica, isto corresponde a multiplicar os atuais níveis por 100.
2 – Desconsidera as Normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT NBR 10.151 e 10.152, base para qualquer lei disciplinadora de poluição sonora no país, as Resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) nº 01/1990 e nº 02/1990 e as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), agência subordinada à Organização das Nações Unidas (ONU). Assim, o PL descumpre normas nacionais e internacionais em nome de interesses comerciais, sob a alegação de proteção à cultura e ao emprego.
3 – Retrocede ao desconsiderar os efeitos dos novos níveis máximos de sons e ruídos propostos e não apresentar estudos que permitam averiguar os reflexos destes sobre a saúde e a integridade física humana. A vasta literatura disponível aponta na direção de evidenciar os efeitos nocivos dos excessos de ruído à saúde, tanto psicológica, quanto fisiológica. Zanin (1990) relata que o ruído age sobre o 2 organismo humano de várias maneiras, prejudicando não só o funcionamento do aparelho auditivo como comprometendo a atividade física, fisiológica e mental do indivíduo a ele exposto. Fiorini e Cols (1991), afirmam que o ruído pode perturbar o trabalho, o descanso, o sono, e a comunicação dos seres humanos; pode prejudicar a audição e causar ou provocar reações psicológicas e fisiológicas. O direito à saúde deve sobrepor-se ao direito à cultura e diversão, pois um é pré-requisito para o outro. Nenhuma legislação pode atuar no sentido de limitar o direito das pessoas à saúde.
4 – Não faz distinção entre as zonas receptoras (áreas residenciais, comerciais, hospitalares e educacionais). Ao definir os novos limites máximos de pressão sonora no DF para 70dB noturnos e 75dB diurnos, não considera, por exemplo, a legislação trabalhista brasileira (Norma Regulamentadora nº 17), que regulamenta os níveis considerados de conforto acústico para o exercício de atividades de atenção (como em sala de aula) até 65dB. “Por se tratar de um risco para a qualidade de vida dos professores e da população em geral, sugerem-se, aos responsáveis pela saúde pública e educação, medidas de reconhecimento e controle na prevenção dos aspectos extra-auditivos do ruído, amenizando seus efeitos nocivos.” (Cláudia G. de O. Gonçalves – doutora em saúde coletiva pela Unicamp)
5 – É inconstitucional, pois a Constituição Federal determina que a saúde é um direito social de todos e um dever do estado (Art. 6º e Art. 196). O direito à saúde é consequência indissociável do direito à vida, tornando-se assim um direito inviolável. O PL proporciona a criação de direitos distintos para pessoas submetidas às mesmas situações, o que fere também o princípio constitucional da isonomia, previsto no art. 5º da Constituição Federal.
6 – Retrocede em relação ao meio-ambiente. Segundo a OMS, a poluição sonora é qualificada como crime ambiental, com base no artigo 54 da Lei 9.605/98 – Lei dos Crimes Ambientais, sendo uma das três prioridades para a década.
7 – Apresenta total subjetividade e falta de embasamento para a formulação dos parâmetros de aferição do som, definidos na NBR 10.151 e adotados pela lei em vigor, acarretando entraves à fiscalização. Como condição para a validação do processo de fiscalização, cria a figura do reclamante, único legitimado para provocar o poder de polícia dos órgãos da administração. Além disso, elimina o direito de sigilo do denunciante, obrigando-o a se sujeitar que a aferição dos níveis de ruído se dê dentro de sua residência, com portas e janelas fechadas. É incompatível subordinar a fiscalização dos órgãos públicos ao eventual consentimento de particulares no processo de aferição das ilegalidades.
8 – Elimina limites à poluição sonora no período do carnaval. Nem mesmo cidades consagradas como polos turísticos carnavalescos, como Rio de Janeiro, Salvador e Recife, que têm sua economia impulsionada em razão desse período, ousaram excepcionar suas leis além desses limites.
9 – Torna Brasília, nossa capital federal, a cidade do país mais permissiva em termos de sons e ruídos. Os limites propostos de 70dB e 75dB para os períodos noturno e diurno são considerados elevados, equiparando-se aos limites de ruído observados em vias de grande circulação, como o Eixo Monumental, em horário de pico (www.ibram.df.gov.br/content/article/310.html).
10 – Desrespeita a legislação de proteção do Conjunto Urbanístico de Brasília, Patrimônio Cultural nas instâncias Distrital, Federal e da Humanidade. Brasília é uma cidade planejada, diferente e única, protegida pelo tombamento e por sua condição de Patrimônio Mundial. O plano de Brasília não é apenas um desenho, é uma concepção de cidade. De acordo com o Decreto Distrital nº 10.829/87, a Portaria nº 314/92 do IPHAN e documentos anexos, os comércios locais fazem parte da Escala Residencial, que deve proporcionar uma nova maneira de viver, própria de Brasília. Assim, quem “dita regras” nos setores dessa escala é o uso residencial, sendo que os demais usos devem atender ao uso residencial predominante.
Os conceitos de Superquadra e de Unidade de Vizinhança incluem, dentre outros fatores, a serenidade urbana decorrente do novo modo de morar. Desse modo, estabelecimentos comerciais de grande porte ou com níveis altos de ruído ali instalados acarretam inúmeros transtornos para os moradores e conflitam com a legislação de proteção.
A título de contribuição, sugerimos que o GDF promova ações para resgatar a função da Escala Gregária, conforme prevista no plano urbanístico de Lucio Costa, estimulando o uso comercial e de prestação de serviços nos setores de Diversões, Comerciais, Bancários e Hoteleiros. Por todos os motivos expostos, as entidades da sociedade civil, abaixo elencadas, registram que o PROJETO DE LEI Nº 445/2015 NÃO ATENDE AO INTERESSE PÚBLICO, pressuposto indispensável para aprovação de qualquer proposição desse porte, de tamanhas repercussões e danos à saúde da população e ao meio ambiente, e reiteram o POSICIONAMENTO CONTRÁRIO À SUA APROVAÇÃO.
Brasília, 18 de junho de 2015
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