O implacável Antropoceno x a resiliência ecossistêmica, por Sucena Shkrada Resk
Hoje 75% da superfície terrestre estão impactadas pelas atividades humanas
e a projeção é de que essa destruição atinja 85% até 2050 e já afeta
pelo menos 3,2 bilhões de pessoas no planeta. Alguém acha pouco? Mais de
100 pesquisadores de 45 países da Plataforma Intergovernamental de
Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos
(IPBES), que reúne a representação de 129 estados-membros, produziram o
relatório sobre o Agravamento da degradação do solo causado pelas atividades humanas e restauração,
o qual alerta sobre os efeitos implacáveis no Antropoceno e propõe
alternativas de remediação. O documento, resultado de um trabalho de
três anos, foi divulgado nesta segunda-feira (26/3), na Colômbia,
ampliando a mensagem da Organização das Nações Unidas (ONU), que
destacou também neste mês que a saída para a gestão das águas está nos
“Serviços Baseados na Natureza” (SbN) (veja #Recursoshídricos: o pedido de socorro ao Ecossistema).
Biodiversidade, serviços ecossistêmicos, mudanças climáticas, segurança alimentar, energia… um leque de eixos fundamentais para o bem-viver estão sendo atacados. Se nada for feito, a humanidade caminha para a sexta extinção das espécies em massa, segundo os cientistas. Os pesquisadores reiteram a necessidade iminente de restaurar e reabilitar os ecossistemas atingidos, sendo que alguns já revelam perdas irreversíveis. As ações devem ser multidisciplinares, envolvendo agendas agrícola, florestal, energética, hídrica e de infraestrutura e serviços. E afirmam – Em média, os benefícios da restauração são 10 vezes superiores aos custos (estimados em nove biomas diferentes) e, para regiões como a Ásia e África, o custo da inação em face da degradação da terra é, pelo menos, três vezes maior do que o custo de ação.
Rolo compressor
O
relatório destaca que mais de 1,5 bilhão de hectares de ecossistemas
foram destruídos pela agricultura e pastagem praticadas de forma
não-sustentável até o ano de 2014 (sendo no Brasil, mais de 200 milhões
de ha), área superior a um terço da Terra. Paralelamente o modelo de
consumo excessivo é um fator que contribui para que haja cada vez mais a
extração de bens naturais e minerais, de forma descontrolada. Ao mesmo
tempo, desperdiçamos no Planeta até 40% do que consumimos. Com isso, não
há conta que feche. Esta relação de algoz e vítima ao mesmo tempo
revela a esquizofrenia de uma contemporaneidade desenvolvimentista. É o
implacável Antropoceno
revelado em suas facetas mais cruéis. Esses impactos equivalem a 10% do
Produto Interno Bruto (PIB) mundial anual (ano de 2010).
A
vulnerabilidade maior está nas condições das zonas úmidas, cuja
destruição chega à 87%. Entre 1970 e 2012, os pesquisadores destacam que
o índice do tamanho médio da população de espécies terrestres selvagens
de vertebrados caiu em 38% e em espécies de água doce em 81%.
Os
pesquisadores afirmam que mais de dois quintos da população planetária
(3,2 bilhões) já sentem de alguma forma os efeitos desta destruição. Os
deslocamentos migratórios com estas catástrofes ambientais têm crescido
de forma assustadora. Um êxodo de pessoas que fogem literalmente da
pobreza extrema, da humilhação e da morte. Cada perda de 5% do produto
interno bruto, em parte causada pela degradação, está associada a um
aumento de 12% na probabilidade de conflito violento. O caminho para a
maior extensão territorial de seca sinaliza que a combinação da
destruição da terra mais as mudanças climáticas possa aumentar em até
45% estes confrontos.
Os
pesquisadores alertam para a expansão descontrolada do uso de
fertilizantes e pesticidas, que deve dobrar até 2050. Os efeitos
deletérios que já são observados na atualidade revelam que estes
produtos químicos estão contaminando o solo e os sistemas aquáticos.
Como exemplo, citam que algumas regiões nas zonas costeiras, como o
Golfo do México, estão mortas.
Até
2050, é previsto que a combinação de degradação da terra e mudança
climática reduza a produtividade global das culturas em uma média de
10%, e em até 50% em algumas regiões. As principais regiões afetadas
deverão ser as Américas Central e do Sul, a África subsaariana e a Ásia.
Nós,
seres humanos, mesmo que empiricamente, sabemos exatamente o que fazer
para que não agonizemos em um planeta em destruição, já que uma boa
parcela da sociedade (pela ignorância, inação, omissão ou por ação
concreta) é responsável pela aceleração deste processo degenerativo.
Esta frase pode soar taxativa, mas a equação demonstrada pela realidade
não deixa sombra de dúvidas.
Escapar
deste rolo compressor é como estar numa arena onde lutam titãs. Talvez
alguns locais mais ermos do planeta possam estar nesta lista, como
trechos distantes dos polos, desertos e pontos inacessíveis de florestas
tropicais, de acordo com Robert Scholes, um dos cientistas
coordenadores do trabalho. Mudarmos o modelo de consumo e da relação com
a polis, com o meio ambiente se torna determinante para a sociedade,
neste palco em que as opções se tornam cada vez mais escassas.
* Sucena Shkrada Resk é jornalista, formada há 26 anos, pela PUC-SP, com especializações lato sensu em Meio Ambiente e Sociedade e em Política Internacional, pela FESPSP, e autora do Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk (http://www.cidadaosdomundo.webnode.com), desde 2007, voltado às áreas de cidadania, socioambientalismo e sustentabilidade.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 03/04/2018
"O implacável Antropoceno x a resiliência ecossistêmica, por Sucena Shkrada Resk," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 3/04/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/04/03/o-implacavel-antropoceno-x-a-resiliencia-ecossistemica-por-sucena-shkrada-resk/.
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