Estudo do WWF-Brasil identifica pressões para reduzir áreas protegidas na Amazônia
Por Jaime Gesisky
(Florianópolis) – Dados
preliminares de um estudo do WWF-Brasil divulgados nesta quinta-feira
(2) durante o IX Congresso de Unidades de Conservação (CBUC) em
Florianópolis apontam que das 316 unidades de conservação federais e
estaduais Amazônia, 110 estão potencialmente ameaçadas por projetos de
infraestrutura, somando aproximadamente 30 mil km², ou 2% do território
protegido. Pará e Amazonas são os estados que concentram o maior número
das áreas sob risco por esses projetos.
O desmatamento aparece como fator de
pressão em 204 UCs no bioma amazônico e atinge áreas de proteção
integral e de uso sustentável. São 18 UCs com mais de 50% de suas áreas
desmatadas. As UCs estaduais de uso sustentável são as que mais sofrem
com o desmatamento, a exemplo da Floresta Estadual de Rendimento
Sustentado Araras, em Rondônia, com 84% da área desmatada.
Em 181 unidades de conservação, os
pesquisadores notaram a existência de pastagens ilegais. Em 247 UCs há
também sobreposição dos limites das unidades com cadastros ambientais
rurais. Em 29 unidades, essa sobreposição atinge a totalidade da área,
abrindo brechas, em alguns casos, para a grilagem de terras.
Os indicadores de pressão sobre as UCs
identificados no estudo, entre os quais projetos de infraestrutura,
desmatamento e sobreposição ao CAR são apenas alguns dos fatores por
trás das tentativas de extinção, redução ou recategorização de áreas
protegidas na Amazônia. Somam-se a eles, a pressão de políticos com
interesses diversos que vão desde a extração de recursos naturais à
ocupação irregular das terras. As investidas se dão principalmente por
iniciativas de parlamentares.
Trata-se de um fenômeno a que os
pesquisadores denominam pela sigla de PADDD (Protected Areas
downgrading, downsizing and degazettement), ou seja recategorização,
redução e extinção de áreas protegidas. O PADDD ocorre em todos os
continentes, sendo um fator de risco para as áreas designadas para a
conservação da biodiversidade e os modos de vida de povos indígenas e
populações tradicionais.
No Brasil, o ano de 2017 foi rico em
processos de PADDD. Este tema foi pauta do Congresso Nacional e de
Assembleias Legislativas estaduais. Casos como o da Floresta Nacional do
Jamanxim (PA) e do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco (MT) são
alguns exemplos.
Um dos mais recentes casos de PADDD na
Amazônia encontra-se neste momento em julgamento no Judiciário em
Rondônia e envolve a criação de 11 unidades de conservação estaduais. As
áreas criadas por lei no ano passado pelo governo local somam cerca de
600 mil hectares. Elas representam um ganho em termos de vegetação
nativa, biodiversidade, água e segurança climática para um estado
campeão em desmatamento. Mesmo assim, a Assembleia Legislativa insiste
em acabar com as UCs. O governo ganhou recentemente uma liminar
favorável, mas as UCs seguem sob a mira dos deputados.
Prevenção
É justamente para antecipar e alertar o
país sobre casos como este que o estudo do WWF-Brasil está mapeando os
indicadores e identificando as fontes de pressão. A ideia é oferecer
elementos de análise prévia de territórios e movimentações legislativas
que apontem as possibilidades de PADDD no futuro próximo e a longo
prazo.
“A premissa do estudo é a de que usando
uma lente para enxergar o futuro com um bom grau de previsibilidade,
apoiado em indicadores objetivos, será possível agir de maneira
preventiva e efetiva na defesa das Unidades de Conservação”, explica
Mariana Napolitano, coordenadora do Programa de Ciências do WWF-Brasil.
A partir da análise das condições e
contextos dos eventos de PADDD até o primeiro trimestre de 2018, o
estudo gera pela primeira vez indicadores mensuráveis, específicos,
relevantes e, algumas vezes, passíveis de georeferenciamento.
“Fizemos duas leituras simultâneas. Uma
delas olhou os processos de PADDD ocorridos nas duas últimas décadas, a
outra nos atuais projetos de lei e programas de governo que implicam em
alterações das unidades de conservação”, conta Maria Cecília Wey de
Brito, co-autora do estudo.
Ela ressalta que o trabalho também
avaliou a qualidade da gestão das unidades de conservação mais
vulneráveis ao PADDD. O que se viu é que apenas 13% das UCs vulneráveis
apresentam um bom status de efetividade de gestão, evidenciando uma
baixa capacidade da maioria das UCs em enfrentarem essas ameaças.
“Focamos no bioma Amazônia por ser a
região do país que concentra o maior número de casos de PADDD, por sua
relevância estratégica na conservação das florestas, da biodiversidade e
no papel chave que tem para a discussão climática global”, diz Marco
Lentini, da Iniciativa de Florestas do WWF-Brasil.
“Para resistir à ofensiva contra as UCs, é
preciso monitorar o movimento de parlamentares que tentam aprovar
projetos de lei e o lobby dos setores econômicos”, afirma Michel dos
Santos, coordenador de Políticas Públicas do WWF-Brasil. Para isso,
ressalta, é estratégico compreender a dinâmica dos fatores que levam aos
processos de PADDD e mapear as tendências futuras desse fenômeno.
Também é essencial a criação de
mecanismos ou ferramentas que possam registrar dados, antecipar
situações conflituosas, bem como propor soluções preventivas e
abordagens inovadoras para as UCs. O estudo é o primeiro passo para uma
ferramenta pública de controle de PADDD no Brasil.
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