sábado, 1 de setembro de 2018

Entre belas palavras e poucas ações, o planeta ferve, a mata desaparece, seres vivos morrem



Entre belas palavras e poucas ações, o planeta ferve, a mata desaparece, seres vivos morrem

Por Amelia Gonzalez, G1

31/08/2018 11h37  Atualizado há 22 horas

Vou confessar a vocês, leitores, que hoje estou escrevendo com bastante desesperança e uma certa raiva, até. Já me explico.

Não bastou a foto de uma cena devastadora, a morte das tartarugas no México, todas capturadas pelas redes de pesca ilegais . Não bastou imaginar como deve ter sido torturante a morte dos bichinhos. Sim, por menos que você, caro leitor, possa compartilhar de meu sentimento de que animais sentem dor e emoção, vou me reservar o direito de acreditar no que a Ciência já descobriu a este respeito 


Experimentos científicos provaram que até mesmo o hábito de jogar lagostas e siris vivos na água fervente causam enormes sofrimentos aos crustáceos.

Para agigantar minha indignação, fico tentando imaginar a reação dos pescadores. Por que, assim que detectaram o desastre, simplesmente não cortaram a rede assassina? A resposta que imagino: talvez eles não tenham querido estragar seu "instrumento de trabalho". Ora, se tantas vezes priorizamos o lucro às pessoas, por que não agiriam assim em relação aos animais?

Seja o que for, é cruel demais. E, mais do que crueldade contra bichos, é uma total e absoluta e irresponsável postura diante de tudo aquilo que se sabe sobre a necessidade que se tem de preservar a biodiversidade do planeta. Mais ou menos como se todos nós, pessoas sensíveis às mudanças do clima e aos efeitos desastrosos que a humanidade está causando ao meio ambiente, estivéssemos o tempo todo a vomitar sandices para emperrar o desenvolvimento, esta espécie de credo que norteia as cabeças de muitos.

Felizmente, porém, não estamos sós. Somos muitos a nos indignar, e vários têm uma voz que alcança os quatro cantos do globo. No entanto.... é imensa a distância entre intenção e gesto.
Emmanuel Macron, presidente da França, é outro motivo para minha reação enérgica neste texto. Em abril deste ano, diante dos políticos no Congresso dos Estados Unidos, Macron fez um discurso envolvente e que reverberou de maneira muito positiva junto aos ambientalistas. Foi aplaudido de pé quando disse:

"Algumas pessoas acreditam que manter seus empregos e as indústrias atuais é mais urgente do que transformar nossas economias para fazer frente ao desafio global das mudanças do clima. Precisamos achar um meio de fazer uma transição suave para uma economia de baixo carbono. Poluindo os oceanos, não mitigando as emissões de dióxido de carbono, destruindo nossa biodiversidade, estamos matando nosso planeta. Vamos encarar a realidade: Não existe planeta B!"

Foi bonito, mas vazio, segundo denunciou o atual ex-ministro da Transição Ecológica da França Nicolas Hulot. Ao vivo, para os ouvintes de um programa de rádio de grande audiência, ele se demitiu. Anunciando seu gesto, Hulot acusou:

"Surpreendo-me diariamente a me resignar, a me acomodar com pequenos avanços quando a situação no mundo, neste momento em que o planeta virou uma estufa, merece uma mudança de escala e de paradigma".

Sim, diante dos fatos é possível imaginar que também ele, Hulot, está fazendo bazófia, quem sabe visando a uma possível candidatura... vai saber. Mas não dá para fechar os olhos ao fato de que o governo de Macron – o mesmo que demonstrou revolta pelo fato de não termos ainda compreendido o valor da biodiversidade para o planeta – reduziu pela metade o preço da licença de caça na França (de € 400 para € 200 por ano). A notícia confirmada na segunda-feira (27), segundo a jornalista Pauline Bock, foi a gota d’água que provocou a demissão de Hulot.

Isto ocorre, segundo Bock, porque o lobby dos caçadores, reforçado pela influente indústria armamentista, é um dos mais poderosos da França. A caça é o terceiro hobby dos franceses, praticada por 1,2 milhão de pessoas. E eu não paro de me indignar. Matar bichos selvagens é hobby dos franceses em pleno século XXI?

Neste sentido, caros leitores, não fico nem mesmo assustada quando leio outra reportagem do "The Guardian" dando espaço a um cético do clima influente, o parlamentar do partido independente do Parlamento Europeu, Stuart Agnew. Um relatório feito por ele e lançado na quarta-feira (29) diz que flutuações de raios cósmicos, manchas solares e atração gravitacional planetária é que são os culpados pelas mudanças climáticas, não a atividade humana.

"Estou fazendo isso para garantir que em algum lugar dos arquivos e anais do Parlamento Europeu tenha alguém que tenha dito: 'O rei não está vestindo um terno invisível! O rei está nu! O único risco potencial de um grande evento de CO2 na Europa é um vulcão em erupção'", diz o texto do relatório, em parte reproduzido pela reportagem do jornal britânico.

Mas o artigo de Agnew não tem peso legal e foi descartado pelo comitê de meio ambiente do Reino Unido em reunião ontem.

"Esse fiasco mostra os danos que podem ser causados pela eleição de populistas que realmente não têm conhecimento de seu mandato e não são competentes para empreender o trabalho altamente influente e detalhado que é exigido dos políticos eleitos", disse a eurodeputada Scott Gato, do Partido Verde do Reino Unido, à reportagem do "The Guardian".

Termino este texto contando uma história real, triste, de uma mãe que perdeu a filha, Ella Roberta, há cinco anos devido à poluição do ar. A londrina Rosamund Kissi-Debrah, inconformada com a perda da menina, que morreu aos 9 anos, está entrando com uma petição para saber a real causa da doença que levou sua filha. Os laudos médicos disseram que ela "morreu devido a um grave ataque de asma seguido por uma convulsão, possivelmente causada por uma reação alérgica a algo no ar".

Rosamund quer saber, exatamente, o que é este "algo no ar". E colheu mais de cem mil assinaturas que entregou hoje ao procurador-geral. Seu objetivo, com isso, é salvar outras vidas, já que dados das estações de monitoramento de poluição perto da casa onde morava com sua filha mostraram níveis altíssimos.

"Não posso voltar atrás, mas agora posso proteger melhor meus gêmeos de 11 anos, que sentem falta da irmã mais velha todos os dias. Se eu for bem sucedida em abrir uma nova investigação, pode ser a primeira vez que a poluição do ar seja citada em um atestado de óbito no Reino Unido", escreveu ela num artigo para o "The Guardian".

É disso que se trata. Da saúde de animais, da saúde de humanos, e de uma necessidade urgente de se rever hábitos de consumo, de produção, para que possamos nos proteger, e aos outros seres do planeta, do mal que já está instalado. A poluição do ar causa cerca de 40 mil mortes prematuras por ano no Reino Unido.


O que me move a continuar estudando, pesquisando e informando a vocês é que tenho certeza de que é possível. Bom fim de semana!


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