Valor Econômico – Dilemas da produção de soja / Artigo / Rafael Baptista Palazzi e Waldemar de Souza
Silvia Zamboni/Valor
Um dos maiores dilemas do desenvolvimento econômico é equacionar a expansão da produção agrícola para atender à crescente demanda mundial por alimentos sem prejudicar o meio ambiente. No caso, a demanda por alimentos na China, o desenvolvimento tecnológico de sementes, bem como os avanços na logística favoreceram o boom de commodities agrícolas no Brasil.
É justamente o setor agropecuário que sublinha aproximadamente 50% das exportações brasileiras. O país é o celeiro e também o pulmão do mundo. Portanto, a proteção do meio ambiente deve ser levada em consideração ao aumentar a expansão agrícola no campo. Entre as culturas de maior expansão no Brasil destaca–se a produção de soja, que hoje representa quase a metade das commodities exportadas.
Recentemente, tem havido um questionamento dos ambientalistas sobre o uso da terra para produção de soja no país e a especulação imobiliária no Cerrado. Por sua rica biodiversidade o Cerrado é fundamental para o ecossistema brasileiro. Porém é justamente na região que se concentra a maior produção de soja, dado o baixo custo da terra e as características propícias de plantio. Portanto, a preocupação é com as práticas de desmatamento excessivo e com a potencial especulação imobiliária resultante da demanda de terras para produção agrícola, que por sua vez, poderia gerar incentivo para o desmatamento do Cerrado.
Brasil avançou no alcance do equilíbrio entre a produção e a preservação ambiental em áreas frágeis
Entretanto, os últimos dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, organizações de monitoramento de práticas de agricultura, apontam notícias promissoras. Assim, nos últimos cinco anos houve uma desaceleração na expansão das terras agrícolas. Em particular, para a produção de soja, ao comparar o uso da terra em relação à produção, registrou–se incremento no rendimento médio de 3,4% nos últimos doze meses. Ou seja, o país produz mais grão com menor uso intensivo da terra.
Também, ao avaliar o desmatamento na região, ilustra–se uma desaceleração de 11% entre 2017 e 2018, o menor valor registrado na série histórica. Além disso, na última década, houve um aumento nas áreas de reflorestamento. Portanto, casos de desmatamento poderiam ser melhor explicados por fatores como extração clandestina de áreas de preservação ou aumento de áreas de pastagens. Especificamente, em Tocantins, 12% do desmatamento ocorreu em áreas de conservação, sublinhando o Estado com o maior índice de desmatamento no Cerrado.
Historicamente a produção de soja ocorre nas áreas do Cerrado do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Mais recentemente, houve uma expansão para regiões do Piauí, Tocantins e Bahia. Sem dúvida, o baixo preço das terras facilitou a expansão. Entretanto, o aumento da procura por novas áreas de plantio pode ter contribuído para a desaceleração do uso da terra no Cerrado. Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que ocorre especulação imobiliária e aumento de preços, o custo de oportunidade de plantar a soja diminui e com isso limita o prolongamento das áreas de cultivo.
A maior explicação para o aumento da produtividade da soja é a evolução das técnicas agrícolas, desde a melhoria no tratamento do solo, desenvolvimento de sementes mais produtivas, mecanização da lavoura, acelerando a colheita com novas máquinas que detêm tecnologias para o preparo do solo, do que o aumento das áreas de plantio. A agricultura brasileira modernizou–se expressivamente ao longo dos anos e, apesar da crise financeira que o Brasil enfrenta, ainda é um setor em franca expansão, responsável por uma parcela estratégica do PIB.
Também, é importante notar que o país tem um grande potencial para melhorar a produtividade e exportação agrícolas, sem causar impactos ambientais. Por exemplo, melhorando a infraestrutura logística para o escoamento da soja. O custo logístico brasileiro é um dos mais caros do mundo. Escoar a produção nas novas áreas de plantio no Cerrado é custoso. Há limitação de vias de acesso aos portos fluviais e marítimos, perdas do produto durante o trajeto decorrente da distância e má qualidade das rodovias.
Não menos importante, grandes importadores de commodities agrícolas no Brasil, particularmente as grandes tradings, têm incentivo a não se associar a fornecedores irregulares ou que adotem práticas prejudiciais ao meio ambiente, dado os elevados custos legais e de imagem. No entanto, a cadeia produtiva da soja brasileira é complexa e com inúmeros fornecedores, o que exigirá melhor monitoramento dos riscos por parte das tradings representantes da maior parte das exportações de soja do país.
Em suma, a agricultura tem espaço para crescimento sustentável com papel fundamental para o desenvolvimento econômico do país. Sem dúvida, o avanço agrícola, em particular da produção da soja no Cerrado deve avaliar os desafios do meio ambiente. Porém, os dados ilustrados sugerem que o Brasil avançou no alcance do equilíbrio entre a produção da soja em novas áreas agrícolas e a preservação ambiental em áreas frágeis, particularmente no Cerrado.(SERÁ???Sic...)
Rafael Baptista Palazzi é pesquisador visitante no Department of Agricultural and Resource Economics, da University of California Berkeley e doutorando na PUC–Rio. (rafael_palazzi@phd.iag.puc–rio.br)
Waldemar Antonio da Rocha de Souza é professor livre–docente da Universidade Federal de Alagoas e pesquisador do Agricultural Economics and Agribusiness Department, da University of Arkansas–Fayetteville (wadaroch@uark.edu)
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