Fortalecimento comunitário em prol da conservação
Por Frederico Brandão*Não existe outro lugar no planeta que o líder comunitário Aldeci Cerqueira Maia, de 56 anos, mais deseje estar do que o seu lar, na Reserva Extrativista (Resex) Cazumbá-Iracema (AC). Apaixonado pela Amazônia e pela biodiversidade que o cerca, Nenzinho, como é conhecido, faz questão de defender a fauna, a flora, a água, o rio, o peixe e também as pessoas. “Ao viver em harmonia, ficamos todos bem”, enaltece.
Mas como estimular os jovens a se engajar na luta e garantir a sobrevivência do território para as futuras gerações? Preocupados com essa questão, Nenzinho e outras lideranças tradicionais, com mais de 20 anos de atuação na região, decidiram fortalecer sua comunidade implementando processos de mobilização, organização comunitária e gestão participativa para a formação de novas lideranças de forma a darem continuidade ao trabalho de desenvolvimento sustentável da Resex.
Uma das propostas foi a criação do Projeto “FormAÇÃO”, que desde seu início em 2014 capacitou mais de 40 novas lideranças comunitárias, entre jovens e mulheres, em processos de gestão participativa dentro da unidade de conservação (UC). Como resultado da formação, alguns deles tem assumido postos, por exemplo, na diretoria da Associação dos Seringueiros e Seringueiras do Seringal Cazumbá da Reserva.
O trabalho desenvolvido na Resex Cazumbá-Iracema aconteceu graças ao apoio do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA) e é apenas um dos resultados de sucesso ilustrados no livro Fortalecimento Comunitário em Unidades de Conservação - Desafios, avanços e lições aprendidas no programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA), lançado recentemente no Encontro Chico Mendes, em Xapuri (AC). A publicação mostra o impacto positivo da implementação de 23 planos de ação comunitários em UCs apoiadas pelo Programa até 2016.
O ARPA, na condição de maior programa de conservação de florestas tropicais do mundo, “promove a articulação e o fortalecimento de organizações comunitárias e comunidades humanas beneficiárias de unidades de conservação apoiadas pelo Programa, visando a utilização sustentável de recursos naturais”.
Para comunitários, como Nenzinho, o ARPA tem um papel primordial para o desenvolvimento de uma Resex. No caso da Cazumbá-Iracema, além do curso de formação, o ARPA também tem dado suporte logístico para atividades em geral, como transporte, combustível, alimentação, entre outros.
“Cerca de 80% dos nossos recursos destinados à gestão da Resex é proveniente do Programa e isso é imprescindível para o fortalecimento da nossa comunidade. Não consigo imaginar como uma Resex consegue se desenvolver sem esse apoio. Nós temos carros, quadriciclos, barcos, motos e bicicletas, que dão apoio aos técnicos, pesquisadores, gestores e à comunidade. Tudo isso traz melhorias na organização e gestão participativa do nosso Conselho e da própria gestão do ICMBio”, avalia.
Outro benefício proporcionado pelo ARPA na Resex acriana é a capacitação de mulheres para artesanato e corte e costura, que atualmente beneficia mais de 25 famílias diretamente. Além da Resex Cazumbá-Iracema, a publicação destaca também os seguintes projetos: fortalecimento comunitário na Resex Médio Juruá (AM) e na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Juma (AM); conservação de quelônios na Resex do Rio Ituxi (AM); pesquisa de recursos pesqueiros no norte do Amapá (AP); gestão territorial do Mosaico da Rebio Gurupi e Terras Indígenas no Maranhão; troca de saberes e fazeres entre indígenas e extrativistas do Médio Xingu, entre outros. Faça download da publicação ao lado e confira a lista completa.
Planos comunitários
Os planos comunitários descritos na publicação foram contemplados por editais de chamadas de projetos no valor de R$ 190 mil cada para Planos de Ação Sustentável (PAS), direcionados a populações tradicionais, e Planos de Ação dos Povos Indígenas (PPI), direcionados a unidades de conservação vizinhas a Terras Indígenas. Um terceiro edital ainda contemplou mais seis novos planos de ação.
Os editais apoiaram projetos de estímulo ao uso de tecnologias alternativas; ao uso sustentável dos recursos naturais; à subsistência alternativa à tradicional produção agroextrativistista; à capacitação em práticas de conservação ambiental e ao uso sustentável de recursos naturais; e ao estímulo à participação na gestão das unidades de conservação, via Conselhos Gestores.
Para o analista ambiental do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Marco Bueno, a publicação é fruto de um processo de construção e execução de projetos comunitários que durou mais de 3 anos. Feito em conjunto com as comunidades durante uma oficina de lições aprendidas em 2016, o livro traz histórias, percepções e análises dos povos tradicionais, indígenas e gestores de Unidades de Conservação que participaram da implementação dos projetos. “Para o ARPA é uma vitória poder divulgar resultados como esses e constatar a importância que o Programa tem para a conservação da biodiversidade por meio da gestão participativa. Além disso, reforça nosso discurso de que a conservação se faz com as pessoas”, avalia.
De acordo com Marco Lentini, líder da Iniciativa de Florestas do WWF-Brasil, o Programa ARPA tem ajudado as comunidades em suas vocações e anseios ao permitir que as unidades de conservação tenham seus instrumentos de gestão e suas instâncias de participação e de decisão devidamente implementados. “Ao reconhecer estes direitos e contribuir com a implementação da UC, o ARPA também se destaca pelo apoio ao desenvolvimento social e econômico direto das comunidades, o que é crucial para a estratégia de conservação de longo prazo da Amazônia”, esclarece.
Além de ser um dos parceiros do ARPA, o WWF-Brasil tem ampla atuação na Resex Cazumbá-Iracema. É membro de seu Conselho Gestor e deu suporte técnico para o seu processo de criação em 2006 e apoio financeiro para seu funcionamento e operacionalização entre os anos de 2006 e 2014. A organização apoiou ainda a conclusão do plano de manejo da Resex; a elaboração do Plano de Manejo da Copaíba; e a implementação dessa cadeia produtiva na região, que gerou em média uma renda adicional de R$ 900,00 em cinco meses de trabalho.
ARPA
O Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa) é uma iniciativa de longo prazo do governo brasileiro (2002–2039), sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente, para a conservação de 117 unidades de conservação ou 60 milhões de hectares no bioma Amazônia por meio da criação, consolidação e sustentabilidade financeira permanente dessas UCs.
O Arpa recebe recursos financeiros de doadores internacionais e nacionais (GEF/Banco Mundial, Governo da Alemanha/KfW, Fundo Amazônia/BNDES, Rede WWF/WWF Brasil, BID/Banco Interamericano de Desenvolvimento, Fundação Margaret A. Cargill, Fundação Gordon and Betty Moore e Anglo American), além de contrapartidas do governo federal e governos estaduais.
*Com informações da assessoria de imprensa do MMA
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