Desenvolvimento desordenado é uma das causas de enchentes em SP
Para especialista, é preciso pensar formas da cidade absorver chuvas
Publicado em 13/02/2020 - 23:31 Por Camila Boehm – Repórter da Agência Brasil - São Paulo
A chuva que atingiu a
capital paulista neste mês de fevereiro tem causados transtornos para a
população, que sofre com enchentes, deslizamentos e congestionamentos.
Nos primeiros 11 dias do mês, as chuvas na cidade ultrapassaram
em 37,2% a média histórica para fevereiro. Segundo o Instituto Nacional
de Meteorologia (Inmet), choveu neste mês 342,6 milímetros. A média
para fevereiro registrada entre 1981 e 2010 ficou em 249,7 milímetros.
O Inmet registrou, na segunda-feira (10),
114 milímetros de precipitação na Estação do Mirante de Santana, zona
norte da cidade. Este foi o segundo maior volume de chuva em São Paulo
para um mês de fevereiro, em 24 horas, em 77 anos. Para o gerente de
Economia da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário, o engenheiro
florestal, André Ferreti, o fenômeno é resultado da chamada mudança
climática junto ao desenvolvimento desordenado que ocorre nas grandes
metrópoles.
“Juntamos a mudança climática com esse
efeito da ilha de calor, que é causado por essa grande região
metropolitana cheia de concreto e cimento. Vemos também todo o problema
da canalização dos rios, a ocupação de leitos de rios, de áreas de
banhados - que seriam áreas inapropriadas para construção das casas, das
infraestruturas públicas e privadas. Acabamos invadindo áreas em que
naturalmente o excedente de água se concentrava, aí temos essa situação
caótica”, disse Ferreti. Essas eram áreas que recebiam o excedente de
água e que tinham a capacidade de funcionar quase como uma esponja, no
entanto, foram impermeabilizadas com concreto e asfalto.
Solução
Para reduzir as consequências das chuvas
intensas, como as que atingiram a capital paulista na última semana,
Ferreti apontou soluções que permitam o armazenamento da água e outras
que possibilitem maior permeabilidade do solo.
“Precisamos pensar no nosso município, nosso
bairro, de forma a ampliar o poder de absorção desse excedente de água.
Precisamos [pensar] nas estruturas cinzas, que são as estruturas de
concreto - como os piscinões, as galerias pluviais, todo esse sistema de
drenagem - que precisa ser ampliado, porque está vindo mais água do que
vinha historicamente e eles não foram dimensionados para esse volume
tão grande de água em um período de tempo muito curto, então não dão
mais conta de escoar tanta água”.
Ferreti diz que para tornar o solo da região
mais permeável é preciso ter mais praças, arborização urbana, áreas
verdes, ter telhados verdes, que são alternativas que poderiam ser
utilizadas em toda a cidade. “Podemos ter cisternas, que coletam essa
água da chuva e evitam que ela escoe rápido para esses pontos mais
baixos e, ao mesmo tempo, permite que os moradores, as pessoas possam
utilizar essa água para diversos fins”.
Outro exemplo citado pelo engenheiro são
pavimentos mais permeáveis, feitos de pequenos blocos de concreto, em
vez de uma grande área cimentada, além de novas tecnologias que produzem
um asfalto permeável. “Hoje existem até asfaltos que permitem que a
água penetre. São asfaltos permeáveis, assim como tipos de pavimentos
que podemos colocar nas calçadas ou no entorno das casas que permitam
infiltração de água. Por exemplo, uma rua de blocos de concreto ou de
paralelepípedo permite a entrada de água entre as pedras ou entre os
blocos de concreto”.
Para o engenheiro, essas técnicas, sejam
elas de infraestrutura natural - como praças, áreas verdes, parques e
arborização urbana - ou tecnologias que podem ser utilizadas na
infraestrutura cinza - que são as casas, o asfalto, a calçada, as lajes -
têm que ser combinadas e pensadas de uma nova forma para que se possa
aproveitar essas tecnologias para diminuir o impacto desses eventos
climáticos extremos.
Poder público
Ferreti avalia que o poder público pode
agir, incentivando o uso dessas tecnologias e proibindo construções que
tenham impacto negativo para a cidade como um todo. “A gente poderia
ter, por exemplo, leis que exigissem isso em determinadas zonas das
cidades. Dentro do plano diretor da cidade, a gente poderia ter regras
bem claras tanto para cisternas que coletam água da chuva quanto para
telhados verdes [similares a canteiros em cima das construções] para
construções acima de uma determinada metragem”, sugeriu.
O engenheiro ressalta que, a todo momento,
há construção de novos bairros e que as cidades estão se expandindo.
“Isso precisa estar na consciência dos empreendedores, mas também
precisa estar nas políticas públicas que incentivem a adoção disso e, em
alguns casos, que obriguem esse tipo de estratégia. Você tem que inibir
algumas práticas e incentivar o uso de outras que são mais adequadas,
então tem que falar 'é proibido impermeabilizar todo o terreno', uma
porcentagem dele tem que ter grama, telhado verde e você vai conduzindo
isso com leis, impostos, benefícios”, disse. “Se o governo não quiser
dar benefícios, ele vai gastar muito com essas calamidades que a gente
está vendo, que geram prejuízos muito maiores para a cidade, desastre,
perda de vidas”.
Edição: Fábio Massalli
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