Pesquisa expõe como má conduta de pescadores mata e mutila albatrozes
Duda Menegassiquarta-feira, 2 dezembro 2020 13:03
Pescarias não afetam apenas peixes. É comum, por exemplo, escutar casos sobre tartarugas presas em redes acidentalmente. Outras vítimas colaterais, não apenas da atividade pesqueira, mas também da má conduta dos tripulantes das embarcações, são aves marinhas como albatrozes e petréis. Um estudo publicado recentemente reúne dados coletados por observadores de bordo que revelam a morte intencional das aves por tripulantes de barcos de pesca brasileiros no Atlântico Sul. Os registros, feitos ao longo de 20 anos tanto em águas brasileiras quanto uruguaias e argentinas, mostram também como as aves às vezes têm seus bicos decepados em decorrência do manuseio inadequado dos tripulantes.
A pesquisa foi publicada em novembro no periódico científico Biological Conservation e é assinada pelo coordenador científico do Projeto Albatroz, Dimas Gianuca, em colaboração com outros 12 pesquisadores de três países além do Brasil, Argentina, Uruguai e do Reino Unido.
O grupo coletou uma série de 46 registros de albatrozes e petréis mutilados devido a procedimentos inadequados feitos pelos pescadores ao recolherem os anzóis em pescarias de espinhel ou com linha e anzol. As aves, que acabam fisgadas ao tentar comer as iscas, são trazidas a bordo ainda vivas e sua sobrevivência depende do manuseio correto para retirada do anzol, tanto para garantir a integridade dos animais quanto para segurança dos pescadores contra picadas. Em quatro ocasiões foi observado que as aves foram agredidas na tentativa de evitar que elas comessem as iscas lançadas ao mar. Ao todo, foram registradas 16 aves mortas ou feridas em decorrência dessa prática, entre elas indivíduos de duas espécies ameaçadas de extinção.
Os pesquisadores ressaltam que há pouca coleta de dados sobre a prática, o que indica que o número de mortes decorrentes do manejo incorreto das aves seja ainda maior. De acordo com Dimas Gianuca, a ocorrência de aves mutiladas ao longo de 20 anos sobre uma vasta extensão geográfica evidencia que esta prática é recorrente e empregada por diversas embarcações.
“Há diversos tipos de pescarias de linha e anzol que resultam em captura incidental de aves marinhas vivas. Nestes casos, a sobrevivência dessas aves está, literalmente, nas mãos dos pescadores”, explica o pesquisador. “Além disso, com a gravidade de algumas lesões, é impossível determinar se os albatrozes e petréis são capazes de continuar vivendo e se alimentando normalmente após o manejo – o que requer pesquisas ainda mais detalhadas sobre o assunto”, aponta Gianuca.
A solução para este problema, que contribui para o declínio populacional de espécies de albatrozes e petréis que ocorrem no Atlântico Sul, requer ações realizadas conjuntamente por organismos internacionais e autoridades nacionais, aponta Gianuca. Além de aumentar a fiscalização é necessário investir na educação ambiental dos pescadores.
“É fundamental intensificarmos os esforços de educação ambiental e capacitação de pescadores para que eles sejam capazes de realizar um manejo adequado das aves caso elas venham a ser capturadas vivas”, reforça a coordenadora geral e fundadora do Projeto Albatroz, Tatiana Neves. Ela acrescenta ainda que, em vista desse objetivo, estão em elaboração materiais informativos dedicados a orientar a frota pesqueira e que o projeto também irá realizar encontros e rodas de conversas com os pescadores do litoral sul e sudeste do país.
Soluções alternativas
Além da conscientização, o projeto, com apoio do Albatross Task Force, também aposta em orientar os pescadores à práticas alternativas para proteção das aves. Uma delas é o toriline, uma fita colorida que espanta as aves em alto-mar e impede que elas se aproximem do barco de pesca. Outra alternativa é lançar os anzóis à noite, já que as aves — de hábitos diurnos — não buscam alimento ativamente nesse período. Está em fase de testes uma nova ferramenta alternativa, chamada de hookpod, um dispositivo que aprisiona a isca dentro de uma cápsula que só é liberada a uma profundidade segura de mais de dez metros de profundidade, quando as aves já não são capazes de alcançá-la.
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