Um poço até aqui de mágoas com o PT e com a presidente Dilma, mas também com o senador Aécio Neves (PSDB-MG), a quem acusou de tentar desconstruir sua imagem, Marina Silva tende a ficar neutra num eventual segundo turno, caso as urnas confirmem o que mostram as pesquisas; embora seu programa econômico, assim como sua equipe, estejam à direita do ideario do PSDB, seu partido, o PSB, tem ligações mais sólidas com o PT; a partir de segunda, Marina será assediada tanto por Lula quanto por FHC; seus próximos movimentos podem decidir a eleição presidencial
Cercada de economistas liberais e de uma banqueira, Neca Setúbal, com um ideario à direita do PSDB, partido que rejeita, por exemplo, a independência do Banco Central, Marina teria motivos, portanto, para se aliar a Aécio. No entanto, o partido onde Marina se alojou, o PSB, possui vínculos mais sólidos com o PT. E se dependesse da vontade do presidente do partido, Roberto Amaral, a aliança natural seria com a presidente Dilma – jamais com os tucanos.
Caso se confirme a derrota de Marina, ela será assediada, nos próximos dias, por dois personagens de peso: os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso. O primeiro pedirá, ao menos, sua neutralidade. O segundo tentará o apoio explícito.
Leia, abaixo, o perfil de Marina, escrito pela repórter Maria Carolina Marcelo, da agência Reuters:
Aparência engana quem vê fragilidade em Marina
Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - Ambientalista renomada, com uma
história de vida cheia de superações, Marina Silva se viu lançada em
meados de agosto ao centro da disputa eleitoral deste ano, em uma
campanha que planejava ter apenas um papel de coadjuvante.
Marina entrou na disputa como vice de Eduardo Campos, que encabeçava a chapa do PSB, mas a morte do candidato em um acidente aéreo provocou uma reviravolta no cenário político.
"Ocorreu uma tragédia, e essa tragédia praticamente a obrigou a ser candidata", disse à Reuters o deputado federal Alfredo Sirkis (PSB-RJ), um dos interlocutores que a acompanharam e filiaram-se ao PSB.
Ambos já haviam protagonizado uma mudança no cenário eleitoral, quando anunciaram a surpreendente aliança para chegar ao Palácio do Planalto. Após ter frustrada sua tentativa de criar o partido Rede Sustentabilidade, Marina decidiu filiar-se ao PSB no último minuto.
Com a morte de Campos, entrou na disputa com a força de um furacão, subindo rapidamente nas pesquisas eleitorais e atraindo contra ela uma saraivada de ataques das campanhas da presidente Dilma Rousseff (PT) e de Aécio Neves (PSDB).
Em meio ao bombardeio, reclamou de ataques injustos e do que chamou de mentiras, assumindo um ar de vítima na disputa, que acabou passando para muitos a imagem de uma pessoa frágil, que não estaria a altura do cargo que disputa. Nada mais falso, dizem os que a conhecem bem.
"Realmente, chamar de frágil uma pessoa que enfrentou a morte não sei quantas vezes; que conseguiu, nascida no coração da Floresta Amazônica, seringueira, se alfabetizar aos 16 anos; teve malária não sei quantas vezes, leishmaniose não sei quantas vezes, envenenamento com mercúrio, quase morreu não sei quantas vezes, uma sobrevivente nata", disse Sirkis. "Realmente, se isso é fragilidade eu não sei o que é força."
Nascida em um seringal no Acre, Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima, 56 anos, acumula longa lista de problemas de saúde. Hepatite, malária, leishmaniose e contaminação por mercúrio, o que restringe bastante sua dieta, são algumas das doenças que a acometeram. Marina já comentou sobre seu passado de fome, pobreza e perdas --a mãe faleceu quando ela tinha 14 anos de idade.
Alfabetizada somente aos 16 anos, quando se mudou do seringal para Rio Branco, também evita o uso de maquiagem, por ser alérgica.
RANCOR E PRECONCEITO
A sua luta ligada ao meio ambiente fez com que fosse um dos primeiros nomes anunciados para o ministério do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, época em que foi colega de Campos. Marina na chefia do Meio Ambiente e ele, na Ciência e Tecnologia.
Em maio de 2008, no entanto, anunciou a saída do governo Lula em meio a atritos, especialmente com o Ministério da Agricultura e com a então ministra-chefe da Casa Civil, a hoje presidente Dilma Rousseff. Pouco mais de um ano após deixar o Ministério, Marina decidiu deixar o PT, partido em que permanecera por 24 anos.
Onze dias depois estava filiada ao PV, sigla pela qual disputou a eleição presidencial de 2010. A aposta rendeu à então candidata verde perto de 20 milhões de votos, o que lhe garantiu a terceira posição e forçou um segundo turno entre Dilma e o tucano José Serra.
Após a eleição de 2010, Marina desfiliou-se do PV em meio a uma disputa por espaço político dentro da legenda, passando a buscar o projeto da nova sigla, a Rede Sustentabilidade, iniciado com a criação do Movimento por uma Nova Política.
A ex-senadora creditou o naufrágio de sua sigla a uma articulação nacional de seus adversários, procedimento que teria prejudicado a checagem de assinaturas de apoiadores do novo partido nos cartórios eleitorais de todo o país.
O episódio nutriu um rancor pelo PT, que a motivou, segundo interlocutores de Campos, a fazer uma cruzada contra Dilma. O ex-governador de Pernambuco chegou a dizer que Marina poderia "engolir um caminhão de sapos por dia" para derrotar a presidente.
Mas após o falecimento do companheiro de chapa em agosto, e poucos dias depois do anúncio de que assumiria a candidatura à Presidência, Marina encostava na até então líder nas pesquisas eleitorais, Dilma, que tenta a reeleição pelo PT. A ex-senadora também deixava o tucano Aécio Neves mais distante da possibilidade de disputar o segundo turno.
Dada sua disparada nas pesquisas, adversários passaram a buscar brechas e contradições no discurso de Marina. Dentre os pontos explorados, estão sua histórica defesa pelo meio ambiente, o fato de ser evangélica e um suposto conservadorismo, além do fato de já ter passado por diversas legendas, inclusive o PT, hoje combatido por ela.
"Existe um preconceito, sem dúvida nenhuma. E até mais do que um preconceito, existe evidentemente uma luta política e dentro da luta política uma propaganda negativa", afirmou Sirkis.
Para a senadora e candidata ao governo da Bahia pelo PSB, Lídice da Mata, o preconceito passou a existir a partir de uma campanha "sistemática" que tentou colar a imagem de "fundamentalista" em Marina.
"Chegaram à conclusão de que atemorizar a população dá certo e resolveram assumir sem nenhuma ética esta postura. Foi a mesma que a direita de ontem usou contra Lula e contra Dilma. E hoje o PT usa contra a Marina sem cerimônia", disse Lídice.
Preconceito ou não, o posicionamento religioso da candidata, que já alimentou o sonho de ser freira e tornou-se evangélica frequentadora da igreja Assembleia de Deus, foi colocado em xeque após revisão do capítulo sobre direitos para homossexuais do programa de governo um dia após o seu lançamento. O partido divulgou uma errata, que parte do movimento LGBT considerou um retrocesso.
Antes do episódio, Marina já havia se posicionado pessoalmente contra o aborto, e a favor da igualdade de direitos inclusive para casais homossexuais, embora tenha se posicionado contrária ao uso da palavra "casamento" para esse tipo de união.
A sua trajetória de ambientalista, a ex-senadora militou ao lado de Chico Mendes, assassinado em 1988, também não passou em branco pelo escrutínio dos adversários. A candidata foi acusada de mudar de lado ao se aproximar do agronegócio nesta campanha.
Esse histórico, segundo interlocutores de Marina, em nada se contradiz a setores como a agricultura e o setor energético, para os quais defende uma "adequação" às regras do desenvolvimento sustentável.
NOVA POLÍTICA
Marina tem defendido o diálogo e o fim da "velha política", da aliança em troca de cargos, entoando o mantra da necessidade de renovação.
Descrita como amistosa, carismática e até mesmo "sedutora" por interlocutores, entrou na disputa com o discurso contra a polarização PT x PSDB na política.
"Se eu achasse que esse país está condenado a eternamente ter esse padrão de política que nós temos, eu entraria em depressão", disse a candidata em entrevista à Reuters.
Mas críticos dizem que a ex-ministra é pouco flexível e está longe da capacidade de conciliação que o ex-cabeça de chapa do partido tinha. Dependendo do contexto, para quem é acusada de fragilidade, isso pode ser um elogio.
"O pessoal diz 'a Marina é magrinha, é fraquinha'. Sou magrinha, mas olhe, eu venho da Amazônia e tem uma árvore chamada biorana. Tem a biorana branca e a biorana preta. A biorana preta não fica tão grossa, mas experimenta bater com um machado", afirmou em discurso. "Sai faísca, ele não verga."
(Reportagem adicional de Eduardo Simões, em São Paulo, e Jeferson Ribeiro, em Brasília)
Marina entrou na disputa como vice de Eduardo Campos, que encabeçava a chapa do PSB, mas a morte do candidato em um acidente aéreo provocou uma reviravolta no cenário político.
"Ocorreu uma tragédia, e essa tragédia praticamente a obrigou a ser candidata", disse à Reuters o deputado federal Alfredo Sirkis (PSB-RJ), um dos interlocutores que a acompanharam e filiaram-se ao PSB.
Ambos já haviam protagonizado uma mudança no cenário eleitoral, quando anunciaram a surpreendente aliança para chegar ao Palácio do Planalto. Após ter frustrada sua tentativa de criar o partido Rede Sustentabilidade, Marina decidiu filiar-se ao PSB no último minuto.
Com a morte de Campos, entrou na disputa com a força de um furacão, subindo rapidamente nas pesquisas eleitorais e atraindo contra ela uma saraivada de ataques das campanhas da presidente Dilma Rousseff (PT) e de Aécio Neves (PSDB).
Em meio ao bombardeio, reclamou de ataques injustos e do que chamou de mentiras, assumindo um ar de vítima na disputa, que acabou passando para muitos a imagem de uma pessoa frágil, que não estaria a altura do cargo que disputa. Nada mais falso, dizem os que a conhecem bem.
"Realmente, chamar de frágil uma pessoa que enfrentou a morte não sei quantas vezes; que conseguiu, nascida no coração da Floresta Amazônica, seringueira, se alfabetizar aos 16 anos; teve malária não sei quantas vezes, leishmaniose não sei quantas vezes, envenenamento com mercúrio, quase morreu não sei quantas vezes, uma sobrevivente nata", disse Sirkis. "Realmente, se isso é fragilidade eu não sei o que é força."
Nascida em um seringal no Acre, Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima, 56 anos, acumula longa lista de problemas de saúde. Hepatite, malária, leishmaniose e contaminação por mercúrio, o que restringe bastante sua dieta, são algumas das doenças que a acometeram. Marina já comentou sobre seu passado de fome, pobreza e perdas --a mãe faleceu quando ela tinha 14 anos de idade.
Alfabetizada somente aos 16 anos, quando se mudou do seringal para Rio Branco, também evita o uso de maquiagem, por ser alérgica.
RANCOR E PRECONCEITO
A sua luta ligada ao meio ambiente fez com que fosse um dos primeiros nomes anunciados para o ministério do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, época em que foi colega de Campos. Marina na chefia do Meio Ambiente e ele, na Ciência e Tecnologia.
Em maio de 2008, no entanto, anunciou a saída do governo Lula em meio a atritos, especialmente com o Ministério da Agricultura e com a então ministra-chefe da Casa Civil, a hoje presidente Dilma Rousseff. Pouco mais de um ano após deixar o Ministério, Marina decidiu deixar o PT, partido em que permanecera por 24 anos.
Onze dias depois estava filiada ao PV, sigla pela qual disputou a eleição presidencial de 2010. A aposta rendeu à então candidata verde perto de 20 milhões de votos, o que lhe garantiu a terceira posição e forçou um segundo turno entre Dilma e o tucano José Serra.
Após a eleição de 2010, Marina desfiliou-se do PV em meio a uma disputa por espaço político dentro da legenda, passando a buscar o projeto da nova sigla, a Rede Sustentabilidade, iniciado com a criação do Movimento por uma Nova Política.
A ex-senadora creditou o naufrágio de sua sigla a uma articulação nacional de seus adversários, procedimento que teria prejudicado a checagem de assinaturas de apoiadores do novo partido nos cartórios eleitorais de todo o país.
O episódio nutriu um rancor pelo PT, que a motivou, segundo interlocutores de Campos, a fazer uma cruzada contra Dilma. O ex-governador de Pernambuco chegou a dizer que Marina poderia "engolir um caminhão de sapos por dia" para derrotar a presidente.
Mas após o falecimento do companheiro de chapa em agosto, e poucos dias depois do anúncio de que assumiria a candidatura à Presidência, Marina encostava na até então líder nas pesquisas eleitorais, Dilma, que tenta a reeleição pelo PT. A ex-senadora também deixava o tucano Aécio Neves mais distante da possibilidade de disputar o segundo turno.
Dada sua disparada nas pesquisas, adversários passaram a buscar brechas e contradições no discurso de Marina. Dentre os pontos explorados, estão sua histórica defesa pelo meio ambiente, o fato de ser evangélica e um suposto conservadorismo, além do fato de já ter passado por diversas legendas, inclusive o PT, hoje combatido por ela.
"Existe um preconceito, sem dúvida nenhuma. E até mais do que um preconceito, existe evidentemente uma luta política e dentro da luta política uma propaganda negativa", afirmou Sirkis.
Para a senadora e candidata ao governo da Bahia pelo PSB, Lídice da Mata, o preconceito passou a existir a partir de uma campanha "sistemática" que tentou colar a imagem de "fundamentalista" em Marina.
"Chegaram à conclusão de que atemorizar a população dá certo e resolveram assumir sem nenhuma ética esta postura. Foi a mesma que a direita de ontem usou contra Lula e contra Dilma. E hoje o PT usa contra a Marina sem cerimônia", disse Lídice.
Preconceito ou não, o posicionamento religioso da candidata, que já alimentou o sonho de ser freira e tornou-se evangélica frequentadora da igreja Assembleia de Deus, foi colocado em xeque após revisão do capítulo sobre direitos para homossexuais do programa de governo um dia após o seu lançamento. O partido divulgou uma errata, que parte do movimento LGBT considerou um retrocesso.
Antes do episódio, Marina já havia se posicionado pessoalmente contra o aborto, e a favor da igualdade de direitos inclusive para casais homossexuais, embora tenha se posicionado contrária ao uso da palavra "casamento" para esse tipo de união.
A sua trajetória de ambientalista, a ex-senadora militou ao lado de Chico Mendes, assassinado em 1988, também não passou em branco pelo escrutínio dos adversários. A candidata foi acusada de mudar de lado ao se aproximar do agronegócio nesta campanha.
Esse histórico, segundo interlocutores de Marina, em nada se contradiz a setores como a agricultura e o setor energético, para os quais defende uma "adequação" às regras do desenvolvimento sustentável.
NOVA POLÍTICA
Marina tem defendido o diálogo e o fim da "velha política", da aliança em troca de cargos, entoando o mantra da necessidade de renovação.
Descrita como amistosa, carismática e até mesmo "sedutora" por interlocutores, entrou na disputa com o discurso contra a polarização PT x PSDB na política.
"Se eu achasse que esse país está condenado a eternamente ter esse padrão de política que nós temos, eu entraria em depressão", disse a candidata em entrevista à Reuters.
Mas críticos dizem que a ex-ministra é pouco flexível e está longe da capacidade de conciliação que o ex-cabeça de chapa do partido tinha. Dependendo do contexto, para quem é acusada de fragilidade, isso pode ser um elogio.
"O pessoal diz 'a Marina é magrinha, é fraquinha'. Sou magrinha, mas olhe, eu venho da Amazônia e tem uma árvore chamada biorana. Tem a biorana branca e a biorana preta. A biorana preta não fica tão grossa, mas experimenta bater com um machado", afirmou em discurso. "Sai faísca, ele não verga."
(Reportagem adicional de Eduardo Simões, em São Paulo, e Jeferson Ribeiro, em Brasília)
Nenhum comentário:
Postar um comentário